A rotação e o erro de Jesus
O erro de Jorge Jesus não terá sido tanto mudar quatro homens no onze de Munique quanto não ter ainda encontrado a fórmula certa que lhe permita alterar três ou quatro todos os dias.
O Benfica perdeu por 5-2 com o Bayern Munique na Allianz Arena, a qualificação complicou-se, ainda que mais pela vitória do FC Barcelona em Kiev, e a maior parte das reações centra-se no facto de Jorge Jesus ter decidido poupar quatro dos seus dez titulares mais habituais – o 11º, o ala direito, tem rodado mais do que uma porta giratória à entrada de um edifício de escritórios. “Abdicar de ganhar um jogo, por mais forte que seja o adversário, é trair a história do Benfica”, queixam-se os adeptos. Eu, que até acho que o erro de Jesus não foi cometido ontem, mas que tem sido recorrente, tinha antevisto essa possibilidade de gestão dos cartões amarelos no Futebol de Verdade, mas fi-lo com noção de uma coisa: Otamendi, Weigl, Rafa e Darwin jogaram em Lisboa e, na Luz, se não apanhou cinco, o Benfica apanhou quatro. O que não quer dizer que o treinador tenha feito bem.
O futebol de hoje está muito diferente do que era há 25 anos, quando um Benfica mais fraco do que este foi ao antigo Olympiastadion apanhar quatro do Bayern e, em função do póquer de Klinsmann e de uma falta de imaginação gritante, todos os jornais – incluindo o “Público”, onde eu trabalhava – titularam no dia seguinte “Kataklinsmann”. Se tiver capacidade para ver além da pouca definição do que era a TV em 1995, pode conferir aqui um resumo do jogo e perceber que aquele Bayern não era tão forte como o de hoje. O Bayern de Nagelsmann é uma equipa de outro patamar, não apenas em relação ao Benfica, mas em relação à maioria dos adversários que pode apanhar. Leva 70 golos marcados em 17 jogos oficiais – média acima dos quatro por desafio – e, se já perdeu duas vezes, uma com o Eintracht Frankfurt, na Bundesliga, e outra com o Borussia M’Gladbach, na Taça da Alemanha, essas derrotas ficaram sempre a dever-se mais ao que os bávaros não fizeram nesses dias do que ao que os eventuais adversários possam ter feito. Este é um caso evidente em que se pode dizer que não foram os adversários que ganharam – foi o Bayern que perdeu.
O Benfica seria mais forte com Otamendi, Weigl, Rafa e Darwin? Provavelmente sim. Mas isso chegaria para ganhar ao Bayern? Provavelmente não. O que não quer dizer que tenha sido boa ideia deixá-los de fora ontem. As máximas às quais acho que todos os treinadores deviam obedecer são as clássicas “os melhores jogadores para os melhores jogos” e “só se joga um jogo de cada vez”. E não há jogos melhores do que os feitos contra o Bayern, uma das quatro ou cinco melhores equipas da Europa. No final do jogo, Jesus não foi muito claro acerca do que terá pesado mais na decisão, se o facto de três desses quatro jogadores estarem a um cartão amarelo da suspensão, que os afastaria da decisão de Camp Nou, ou se o facto de não se sentirem suficientemente soltos fisicamente para darem a melhor resposta, o que traz para a fotografia a exigência do jogo de domingo, em casa, contra o SC Braga, para a Liga – e esse também é fundamental, porque pode fazer a diferença na época dos minhotos e nas chances que ele têm de se aproximar dos grandes esta época.
Provavelmente, a decisão de Jesus terá até sido tomada tendo em conta as duas variáveis. O que permite lançar outra questão, em torno da forma como Jesus mudou a rotação. Há duas eras no Benfica 2021/22. Uma antes da entrada na fase de grupos da Liga dos Campeões e a outra depois. Enquanto andou a jogar pré-eliminatórias, com a Liga Portuguesa ao fim-de-semana e os jogos europeus a meio da semana, Jorge Jesus trocou sempre cinco, seis ou sete elementos no seu onze, de jogo para jogo. Talvez fosse demasiado, mas foi resultando. No dia em que foi jogar a Kiev, na primeira jornada da Champions, começou a segunda era – aí ainda mudou quatro pedras do onze que tinha vencido o Santa Clara nos Açores, mas daí para a frente começou a estabilizar. Trocou três homens paras enfrentar o Boavista, apenas um na visita a Guimarães (na Liga) e depois manteve o mesmo onze na vitória contra o FC Barcelona e na derrota caseira com o Portimonense. Nesta segunda era, Jesus definiu claramente um onze de gala – ou um dez, vamos lá, porque há a questão do lateral direito... – e uma equipa alternativa, que depois aparecia em jogos “secundários”, como a viagem à Trofa, para a Taça de Portugal, onde entraram dez elementos que não tinham sido titulares na partida anterior, ainda que o jogo se tenha seguido à pausa para as seleções.
O erro de Jesus em Munique não terá sido tanto mudar quatro homens naquele que se tem vindo a afirmar como o seu melhor onze. A rotação é necessária e talvez o perfil elevado do jogo de Munique justificasse o melhor Benfica, é verdade, independentemente de isso vir a ter reflexos na classificação. Mas estou convencido que o erro de Jesus foi ainda não ter sido capaz de encontrar um meio-termo na política de rotação que mantenha todo o grupo focado e ligado aos objetivos comuns. Nem as seis ou sete alterações de jogo para jogo que, devido às cargas da pré-época, andou a fazer até Setembro, nem a criação do onze inamovível que ele sabe não poder aguentar semana após semana durante o Inverno.
A meu ver,e tendo em conta o jogo importantissimo com o Braga penso que JJ fez bem em poupar algumas peças.
É certo que até eram jogadores em risco de exclusão e acaba por ter a dupla interpretação de que pode ser também a pensar na partida da Catalunha.
Qualquer que fosse a formação apresentada,este Benfica iria ter muitas dificuldades para conter o Bayern e foi o que aconteceu.
Caro António Tadeia,
Talvez não partilhe da minha opinião, mas entendo que a derrota de ontem tenha sido mais tática, do que física ou emocional. Num jogo desta dimensão, o Benfica esperou defender bem com João Mário, Pizzi e Everton, e ao mesmo tempo contava que esses mesmos jogadores fizessem o aproveitamento das bolas bombeadas que o Roman Y. conseguisse filtrar. Acabou o Benfica por nunca conseguir discutir o jogo a meio campo, dando sempre espaço e tempo para o Bayern decidir, e decide quase sempre bem, ao mesmo tempo que praticamente foi inexistente no contra ataque, exceção feita ao golo do Darwin, quando os bávaros já ganhavam por 4-1.
Mais do que mudar peças, não precisava o Benfica ontem de outras peças, diferentes das que colocou em campo do meio campo para a frente?
Cumprimentos