Assim não vamos lá
No “top 10” do ranking da UEFA, só um país perdeu uma equipa nas preliminares. Foi Portugal, que viu o Vitória SC cair. Além dos 3,4% que cada ponto nosso já vale a menos, demos mais 3,4% de borla.
A malta que discute futebol gosta muito de debater a percentagem das transferências que vai parar ao bolso dos empresários. Cinco por cento, dez por cento, seja o que for, é sempre visto como desperdício. Pois bem, vamos aplicar a matemática a outros exercícios. Se em condições normais o facto de Portugal ter seis equipas nas provas da UEFA já implica um “desperdício” de 34 milésimas de ponto (3,4 por cento) por cada empate, face aos resultados feitos pelos neerlandeses, que entram só com cinco equipas e por isso dividem o bolo por menos gente, a eliminação absurda da Liga Conferência do Vitória SC face a um opositor que não só lhe é inferior como se apresentava inferiorizado por lesões significa que doravante estaremos a mandar mais 34 milésimas (mais 3,4 por cento, portanto) para o cesto dos papéis. O que isto quer dizer é que, daqui para a frente, para pelo menos mantermos a desvantagem que nos condenou a ter menos uma equipa na Champions já a partir do ano que vem, teremos de fazer 2,13 pontos por cada dois pontos das equipas dos Países Baixos. Teremos que ganhar um jogo-extra a cada oito. E isso não são boas notícias para a globalidade das equipas que jogam a Liga Portuguesa. Ou serão? É que o que se lê nos jornais hoje é que, com a eliminação, André Amaro, provavelmente o mais promissor dos jovens jogadores do Vitória SC, já poderá sair para o Al Rayyan, do Qatar, por valores próximos dos dez milhões de euros. Que chatice seria ficar na UEFA e não embolsar já essa quantia... Da mesma forma que o que se leu do FC Arouca nos últimos dias foi que, a uma semana de defrontar o Brann, da Noruega, na terceira pré-eliminatória da mesma Liga Conferência, bateu o seu recorde de transferências, vendendo o extremo brasileiro Antony para os Portland Timbers, da MLS, por 3,5 milhões de euros. A continuada incompetência das equipas nacionais além das quatro que ainda vão pontuando é apresentada como argumento pelos que não querem centralizar os direitos televisivos e repartir de forma mais equilibrada a receita e, sendo evidente que a coisa também pode ser vista ao contrário – a fixação nas vendas e a sua prevalência sobre os resultados no campo seria mais facilmente combatida se essas equipas tivessem mais dinheiro de TV –, já me começa a aborrecer esta contínua desvalorização da competição por parte dos emblemas que depois passam o ano a lutar entre si para ficarem em posição “europeia”. Se este ano o Vitória SC foi eliminado por uma equipa da Eslovénia, na época passada caíra ante um adversário da Croácia – e a seguir vendeu André Almeida ao Valência CF. Na mesma edição, o Gil Vicente perdeu os dois jogos com um rival neerlandês e ficou também fora da fase de grupos. Nunca uma equipa portuguesa chegou à fase de grupos da mais fraca das competições europeias – e este ano até as Ilhas Faroé deverão lá ter um representante, porque isso é o pior que pode acontecer ao KI Klaksvík, se perder nas duas rondas que aí vêm. No top10 do ranking da UEFA dos últimos cinco anos, aquele que vai definir as vagas para a época de 2025/26, onde, além das Big Five, estamos nós, os Países Baixos, a Bélgica, a Escócia e a Áustria, só Portugal já perdeu uma equipa. Se o FC Arouca cair numa das duas barreiras que tem pela frente, lá se vão mais 34 milésimas (mais 3,4 por cento) de cada ponto ganho pelas equipas que ficam em prova. Fazem-se as contas e, tudo somado, serão 10,2 por cento – a comissão proibida para os agentes nas transferências.
Uma questão de concentração. Já aqui tinha chamado a atenção, na semana passada, para a debilidade competitiva do Vitória SC, que fizera quatro golos na Eslovénia mas não pudera fechar a eliminatória por causa de faltas de concentração competitiva, refletidas no golo que sofreu aos 18 segundos da primeira parte e noutro que encaixou a 53 segundos do fim do período de compensação da segunda. O jogo de ontem foi diferente, porque teve só um golo em vez de sete, acabando com a eliminação dos portugueses nos penaltis, mas mostrou mais do mesmo: uma equipa competitiva e outra que, com mais bola, não só pareceu sempre mais diletante no seu trato como foi menos rigorosa quando tinha de defender. O NK Celje passou a eliminatória porque, face ao Vitória, conseguiu fazer mais com menos – e o avanço que leva por já estar a fazer o quarto jogo competitivo da época não é explicação. No fundo, é sempre uma questão de interesse. E, digam-me o que disserem, dificilmente me convencem de que, tirando as quatro da frente, as equipas portuguesas têm interesse nas provas europeias. E é aqui que me dá saudades de ver o Boavista eliminar o Inter, o Vitória afastar o Atlético Madrid ou o Belenenses arrumar o Leverkusen. O futebol era diferente? Era. Mas as nossas equipas também olhavam para ele de outra forma.
O problema da comiseração. Disse-vos que me emocionei com o percurso da seleção nacional feminina, mas comecei o texto em que o afirmei por retirar da sala o elefante que era a onda unanimista em torno da epopeia das Navegadoras. Repito: a seleção foi digna e competitiva, mas não ficará na história deste Mundial, por mais vezes que o Presidente da República diga, como disse ontem, que ela foi melhor do que as adversárias. O problema da comiseração em torno das vitórias morais é que a realidade tende a desmenti-la e nos apercebemos disso se sairmos da nossa bolha. A história deste Mundial, fá-la-ão as melhores equipas que lá estão, que são o Japão, a Inglaterra, a França ou a Suécia – eventualmente até os Estados Unidos, a Espanha ou a Noruega, se melhorarem muito na segunda fase. Nas sensações também não está a equipa de Portugal, por muito que achemos que ser eliminado por pouco contra as seleções número um e nove do ranking mundial seja uma proeza para quem ocupa a 21ª posição da mesma tabela. Sensação foi o que fez a Nigéria (número 40 do ranking), que afastou o Canadá (7ª), o que fez a Jamaica (43ª), que eliminou o Brasil (8ª), ou o que fizeram Marrocos (72ª) e a Colômbia (25ª), que deixaram pelo caminho a Alemanha (2ª). Não digo isto por falta de sensibilidade ou para vos aborrecer: é só porque se tivermos a noção do local em que estamos podemos percorrer muito melhor o caminho que nos falta.
As novidades desta época. Já expliquei ontem (em texto que pode ler aqui) como vão ser as coisas no Substack e no meu canal de YouTube em 2023/24. Respondi a dúvidas numa emissão especial do Futebol de Verdade, ontem (pode ver aqui), e voltarei a estar à vossa disposição hoje, às 12h30, em nova emissão em direto (e pode inscrever-se aqui no canal). Além disso, os que não ligam às imagens e por isso não viram o banner ali em cima ficam a saber que está em curso até à meia-noite de amanhã uma campanha de promoção de início de época, com a oferta de quatro meses na subscrição anual do serviço Premium (e pode aproveitá-la aqui). Pelo preço de um café por semana podem ler tudo o que aqui vai estar durante um ano, ver todos os vídeos que produzirei em 2023/24, entrar no meu canal de Telegram e no meu servidor de Discord e ainda ter a satisfação de estar a apoiar o jornalismo que se faz fora dos grandes grupos de media. Depois não digam que não avisei.
ATadeia, então com a minha subscrição tenho ou não acesso a todos os seus conteúdos? Incluindo o telegram?
Quanto ao Ranking UEFA, estes clubes que fazem estas figuras são os mesmos que, qd a Liga tenta fazer algo para levar mais espectadores aos estádios, se colocam à margem