As lágrimas de Jessica
Portugal chorou com Jessica Silva, ontem, por causa da bola no poste que impediu a seleção nacional de fazer ainda mais história no Mundial. E não foi por uma questão desportiva. Foi pela genuinidade.
Vamos começar por tirar o elefante da sala. Portugal, no Mundial de futebol feminino, foi uma equipa muito digna e competitiva, cuja participação honrou o símbolo que levava ao peito, mais ainda por ser a primeira, por desbravar caminhos, mas a coisa acaba aí. As jogadoras e toda a comitiva merecem os nossos parabéns, mas já me parece demasiado estarmos a cantar loas a esta participação como se ela fosse uma epopeia digna de um décimo-primeiro canto dos Lusíadas. O grupo era bem difícil, mas tinha de o ser, que a seleção era estreante e por isso entrava em desvantagem no sorteio. Em campo, a equipa nacional fez ligeiramente mais do que seria de esperar. Ganhou ao Vietname, perdeu pela diferença mínima com os Países Baixos e sacou um 0-0 aos Estados Unidos, que é verdade podia bem ter sido diferente, tivesse o remate de Ana Capeta nos instantes finais entrado nas redes em vez de acertar no poste, como aconteceu. Mas esse resultado também pode ser relativizado, porque o empate servia perfeitamente às campeãs do mundo e pelo facto de – estou convencido, mas o futuro da competição dirá se me engano... – esta ser uma seleção dos EUA mais fraca do que as anteriores. A questão é que a grande vitória desta seleção não foram os resultados indiscutivelmente dignos que alcançou em campo. A grande vitória desta equipa foi ter posto o país a olhar para ela, a puxar por ela como só puxa pelos homens quando eles estão à beira de conquistar títulos – até esse momento, eles são vistos como milionários que têm tudo e que não respeitam nada, como meninos mimados com quem o público embirra até ter de os apoiar. Talvez isso tenha acontecido porque um apuramento para os oitavos-de-final equivaleria a um título na escala das expectativas desta seleção, mas creio que as razões são muito diferentes e estão à vista no discurso descomprometido das jogadoras, cujo ponto máximo foi a vulnerabilização de Jessica Silva no instante em que teve de enfrentar a flash-interview e o fez literalmente a chorar a eliminação. Naquele momento, Jessica não foi a profissionalona que até já ganhou uma Liga dos Campeões no Lyon – foi uma de nós e com isso arregimentou-nos para a sua causa. Deixou uma lição de empatia a qualquer grupo de jogadores que venha a representar o país no futuro. No final, porque me pareceu notar a voz um pouco embargada à Clara Osório, a jornalista da RTP que entrevistava Jessica, mandei-lhe mensagem a perguntar se ela (que não aparecia no plano) também tinha chorado. Não vou contar-vos o que me respondeu, porque não tenho esse direito, mas digo-vos uma coisa que não lhe disse a ela: eu estava só a ver e também me vieram as lágrimas aos olhos. Porque a diferença não é entre homens e mulheres. Essa ideia de que elas choram porque são mulheres e os jogadores da seleção masculina não o fazem porque são homens é uma treta preconceituosa tão vazia de sentido como seria dizer que eles se refugiam em lugares-comuns absolutamente banais por uma questão de género, que a inteligência e a sensibilidade dos monstros de testosterona que são os nossos jogadores não dá para mais. A Jessica chorou porque foi para ali como é. E nós não só chorámos com ela como ficámos desde aquele momento a pedir mais. Não dá para fazer outro Mundial já para o ano que vem?
Vlahovic ou Lukaku? Está em curso há algumas semanas a operação de troca entre Vlahovic e Lukaku, difícil de entender mas de certa forma compreensível desde que a desmontemos. O Chelsea, que há doze anos pagou 15 milhões de euros por Lukaku mas não o aproveitou, vendendo-o ainda assim com lucro após dois empréstimos, e que há um par de épocas voltou a contratá-lo, por 113 milhões, continua sem saber o que fazer com o possante avançado belga que teve estacionado no Inter Milão e está a tentar usá-lo como moeda de troca para ir buscar Vlahovic à Juventus. O sérvio tem duas enormes vantagens: é sete anos mais novo e ainda não fracassou em Stamford Bridge uma vez, quanto mais duas. Entendem-se, por isso, as razões dos londrinos, sempre em busca da “next big thing”, mas a operação já se torna mais difícil de explicar do lado italiano, onde os adeptos começam a torcer o nariz àquela que foi apresentada como a grande adição deste ano, a do diretor desportivo Cristiano Giuntoli, sacado às garras do SSC Nápoles, onde montou uma equipa campeã. É certo que a Juventus pode capitalizar com a troca – estarão a pedir 40 milhões de euros, que são a razão pela qual o negócio ainda não se fez – e que esta época nem vão estar nas provas europeias, o que vem facilitar a utilidade de um jogador que tem sido algo propenso a lesões, como é Lukaku. Com um jogo por semana, o belga chega perfeitamente, tal como chegou há dois anos, quando foi uma arma impactante no Inter de Conte, que ficou fora da Europa em Novembro e ganhou depois a Serie A, com ele e Lautaro a dar cartas na frente. Além de que pode ser um encaixe melhor no futebol minimal e eminentemente físico de Allegri, onde Vlahovic, que também não é um virtuoso, chega a parecer um desperdício. E pronto, está explicado.
Aquilo que faltava a Vitinha. O golaço de Vitinha ao Inter, em jogo de preparação, levou-me a pensar no que faltava ao médio do Paris Saint-Germain para se chegar ainda mais ao topo da hierarquia para a sua posição no plano internacional. E creio que uma das coisas que lhe tem sempre faltado é uma equipa disposta a jogar ao seu ritmo. É claro que em equipas mais diretas e físicas, como eram o FC Porto de Sérgio Conceição ou o PSG de Christophe Galtier, o futebol de filigrana de Vitinha se destacava pela diferença. Mas na equipa de Luis Enrique ele pode ser o fulcro, o jogador em função do qual toda a gente se move. Olha-se para Vitinha e pensa-se que ele pode ser não aquilo que foi Iniesta no Barcelona que Luís Enrique conduziu a todos os títulos em 2015 mas aquilo que podia ter sido Xavi nessa equipa, fosse ele uns anos mais novo e não tivesse já tido que ceder a posição a Rakitic. A coisa, para já, promete.
Noto um verto descrédito em relação à nossa selecção feminina. Esta selecção é fruto de um enorme trabalho que vem a ser feito de há uns anos para cá.
Estas mulheres quando começaram a jogar em meninas, tinham de jogar em equipas masculinas e ouvir de todo o tipo de palavrões etc.
O chorar de Jessica, é o desabafo de terem conseguido ir ao mundial e de terem tido uma participação digna.
Ficaram a um pequeno passo de vencerem as americanas, quando todos davam a goleada como certa.
Não sei o que vem a seguir, mas o futebol feminino, está-me a surpreender pela qualidade em todos os aspectos.
Este futebol é mais genuino do que o futebol masculino onde os jogos já são sempre mecanizados onde não passam do mesmo tipo e que se está a tornar enfadonho e monótono.
Com tanto jogo dado pelas tvs, estou a ver o futebol masculino a entrar numa enfadonha monotonia.
Para mim no futuro, acontecerá ao futebol o mesmo que as telenovelas.
Quando apareceram, todo o país parava para ver, com a sobrecarga de umas atrás das outras, perderam a magia e a audiência.
Na década de 2000 o Fut Feminino era disputado por equipas totalmente amadoras e os maiores protagonistas eram o Gatões, Boavista, Fut Benfica, Cadima, o 1º Dezembro. A Seleção Nac era goleada vastas vezes. A promoção da FPF, a entrada e investimento de grandes clubes (SCP e SCB e depois SLB) e a profissionalização fizeram dar um grande salto qualitativo e esta participação no FIFA WWC2023 é prenúncio de muitas alegrias no futuro!