As tendências da "silly season"
O Benfica está a trabalhar bem e isso amplia a habitual euforia popular. O FC Porto resiste, o Sporting deprime-se e no SC Braga... bem, não há lá muita gente para alimentar estados de alma.
Os plantéis e os adeptos vão de férias, mas pouca coisa muda quando nos dignamos a dar atenção ao sentimento geral. O ambiente no Benfica é de euforia, própria não de quem vai ganhar mas de quem já ganhou por antecipação, tudo facilitado pela participação de Di Maria em dois dos três golos dos encarnados ao FC Basileia, num particular de pré-época – e mesmo que ele o não tivesse feito, bastaria ter aparecido e sorrido à multidão, que o efeito seria igual. No FC Porto, como sempre a lutar “contra tudo e contra todos”, o que é mais tema é a recusa de propostas, as reais e as imaginárias, dos malandros dos árabes que querem muito o Otávio e até meteram o Ronaldo a dizer-lhe algo como “anda jogar, tu jogas bem” aos italianos que nem dormem a pensar no Taremi, crentes naquela fórmula mágica do preparo físico que lhes permite prolongar o auge dos jogadores até aos 40. Perante isso, o que vale a perseguição de um substituto para Uribe? No Sporting, como sempre em estado de depressão, mesmo que entre os jogadores relevantes da época passada Rúben Amorim só tenha perdido Ugarte e já possa finalmente contar com o ponta-de-lança que toda a gente queria, é neste momento mais ou menos consensual entre seguidores que se está perante “o pior plantel da história”, seja porque não vai o Fatawu, porque não vão o Esteves, o Tanlongo ou o Marsà – mas a realidade é que se eles fossem também se estaria perante o pior plantel da história, porque esses todos já lá estiveram e não conseguiram impor-se a um nível superior. E no SC Braga contratam-se jogadores com capacidade para ajudar na luta pela entrada na fase de grupos da Champions – e o regresso a Portugal do mais velho dos irmãos Fonte é disso prova –, mas a coisa passa por entre os pingos da chuva, porque a verdade é que o SC Braga ainda não mobiliza as multidões dos outros três e, portanto, não há assim muita gente que queira saber. Entendo a vertigem da “silly season” – também aqui, o mês que tenho passado a contar histórias reais de campeões reais, nos Reis da Europa, a aprender a cada texto sobre o futebol no Mundo, tem tido muito menos apelo para o público do que teria uma notícia sobre o aparar das sobrancelhas do Di Maria – mas tenho de vos dizer uma coisa. Estamos a 17 de Julho. Faltam sete semanas para fechar o Mercado. Se olharmos para as coisas a partir de uma radiografia a fazer hoje, é indiscutível que Benfica e SC Braga estão a trabalhar mais rápido – e isso é bom para os treinadores, que podem começar a trabalhar um grupo com estabilidade desde mais cedo. Mas nem o Benfica nem muito menos o SC Braga fizeram um upgrade assim tão grande em face do que tinham na época passada nem o FC Porto e o Sporting estão assim tão mal, se comparados com as equipas de 2022/23. Kokçu é melhor do que Chiquinho ou do que o João Neves de hoje, mas será mais forte do que o Enzo de há um ano? Jurasek ou Ristic conseguirão fazer o que fazia Grimaldo? Di Maria empolga, é certo, mas ente ele, Rafa, João Mário, Neres, Gonçalo Guedes e, porque não dizer, Schjelderup e Tiago Gouveia, continuarão a jogar só três de cada vez. Ao contrário dos treinadores, para quem a pré-época é fundamental na criação de rotinas, para quem está a ver a pressa é inimiga da perfeição. O Benfica está na frente, sim senhor, porque é o campeão e porque se mexeu depressa e aparentemente bem no mercado. Mas nem o jogo da construção dos planteis chegou sequer ao intervalo nem as diferenças no campo serão depois tão pronunciadas como as tendências dos adeptos para a euforia, para a depressão e para a revolta parecem indicar. E entretanto, hoje, ao fim do dia, aqui estará mais um episódio (o 25º) dos Reis da Europa. Hoje escreverei sobre o último campeonato de Itália e complementarei o texto com uma entrevista a Paulo Sousa, antigo jogador da Juventus e do Inter e atual treinador da Salenitana. Se ninguém vos revelar onde é que o Gyokeres vai cortar o cabelo, pensem na possibilidade de ler.
O futuro dos sub19. Há uns anos houve uma polémica grande no futebol de formação, porque os alemães criticavam a forma resultadista de Carlos Queiroz trabalhar as seleções jovens em Portugal, porque os resultados, afinal de contas, não interessavam nada, sobretudo se a sua obtenção implicasse um menor investimento noutras valências daquilo que deviam ser bons profissionais. Eu sempre achei que o problema maior foi de tradução do que disse na altura Berti Vogts – traduzir alemão não é pera doce e a cabeça de Vogts não era das mais simples de descodificar – e que aquilo que havia a reter era que os resultados das seleções jovens são e serão sempre um objetivo e refletirão sempre o valor das equipas que vão às competições, mas que o fundamental naquelas idades é desenvolver jogadores, até de forma individual, de modo a que depois possam ser bem sucedidos no momento que conta, que é quando chegam aos seniores. Há uma frase que continua a ecoar-me dentro da cabeça, que me era dita, acho até que com algum carinho, pelo António Florêncio, na altura jornalista de A Bola, quando me via chegar na desfaçatez dos meus 19 anos aos locais onde os consagrados da máquina de escrever trocavam impressões em cada serviço: “Puto, juniores é de manhã!” Por isso, depois de uma fase de algum fervor motivado pelo facto de começar a tornar-se hábito ganhar – e foi essa a faceta mais importante da revolução de Queiroz, a forma como ensinou ao país que ganhar também era uma opção – comecei a relativizar as proezas das nossas seleções jovens. Acompanhei o Europeu de sub19 que ontem terminou em Malta, com Portugal em segundo lugar, com muito menos atenção do que faria há um par de décadas, colocando-o claramente atrás do duelo Vingegaard-Pogacar no Tour ou da saga de Carlitos Alcaráz em Wimbledon no meu ‘atenciómetro’, e fi-lo na perspetiva de antecipar quem, daqueles miúdos, vejo vingar a um nível superior. E só para concluir que, tal como na ‘silly season’ a carreira deles está muito longe sequer de chegar ao intervalo. Estão nos exercícios de aquecimento. Já lhes provaram que, ganhando ou perdendo, se batem com os melhores da idade deles. Agora cabe-lhes a eles dizer o que é que são capazes de fazer com isso.