À espera de Nico
O que Nico González pôde ver das bancadas do Dragão foi um meio-campo com dificuldades criativas. E também ele há-de ter pensado: quem sai para eu entrar? E em que medida é que isso muda a equipa?
O empate do FC Porto contra o Rayo Vallecano, com o reforço Nico González já nas bancadas a ver a equipa jogar, trouxe uma espécie de consciencialização do pós-Uribe que se vive hoje no Dragão. De repente, ainda que isso possa até ser mais ilusório do que real, provocado pelo facto de, ante um adversário que trate bem a bola e não responda à pressão com o desespero de um chutão, as necessidades defensivas da equipa forçarem não só o encaixe de Otávio na saída de bola pela esquerda como a sua presença mais prolongada por lá, parecia que o 4x4x2 assimétrico de Sérgio Conceição se tornara clássico, que o corredor central se apresentava mais vazio. Com bola, contudo, o luso-brasileiro foi aparecendo mais por dentro, até para dar a lateral a Pepê, pelo que a ausência que se sentia ali, no meio, seria muito mais a memória do colombiano, cujo fantasma Grujic e Eustáquio não conseguiram exorcizar. A insistência (normal) da realização em mostrar Nico na bancada complementava bem a forma como, no campo, a equipa gritava por soluções na zona que ele deverá vir a ocupar. E, enquanto Galeno se mostrava como sempre, excelente a furar linhas mas frágil a definir, Taremi parecia ainda esperar que a equipa lhe abrisse o espaço para ele encontrar a inspiração que tantas vezes o tornou decisivo. E a mente de quem tentava adivinhar o que será o FC Porto de 2023/24 procurava definir as funções que o filho do antigo médio galego Fran ocupará no equilíbrio global. Quem sairá do onze para nele entrar Nico, quando Sérgio Conceição achar que ele já cumpriu o período de preparação tática e estratégica que exige sempre aos reforços? Grujic? Eustáquio? Uma coisa parece certa: os equilíbrios do FC Porto vão mudar. É que Nico não é bem Uribe – é melhor em condução, muito mais capaz de queimar linhas em posse, mas mais fraco no passe progressivo, por exemplo, e sobretudo na dimensão defensiva do jogo. Joga com Grujic, então? É bem admissível, ainda que se na época passada Conceição chegou a abordar jogos com Uribe e Otávio por ali, também será possível ver Nico com Eustáquio. Então e Varela, que o FC Porto está a tentar resgatar ao Boca Juniors? Sendo o argentino ainda mais defensivo do que Grujic, mais clássico médio de marcação e menos de transporte, igualmente pouco propenso a roturas ofensivas ou a subir para ocupar as entrelinhas sem bola, se ele vier para fazer meio-campo com Nico o que vai acontecer é que isso vai exigir ainda mais de Otávio. Nesse caso, o equilíbrio da equipa, que neste sistema assimétrico anda sempre ali entre o 4x4x2 e o 4x3x3, penderá cada vez mais para o 4x3x3, mesmo que seja um 4x3x3 com dois pontas-de-lança e a direita entregue à capacidade de Pepê para fazer todo o corredor. Os sistemas são o fato que as equipas vestem, mas são estas que os fazem. E se o FC Porto muda os dois homens nucleares do meio-campo, o mais normal mesmo é que acabe por caber de forma diferente no fato que o alfaiate lhe desenhou.
O Benfica, o físico e o tático. Aursnes recebeu ontem a medalha de campeão neerlandês, porque antes de chegar ao Benfica, em Agosto de 2022, ainda fez dois jogos na campanha do título do Feyenoord. A evolução dos jogadores e dos coletivos está bem à vista no facto de o médio norueguês ter feito com Kokçu o meio-campo da equipa de Roterdão no terceiro lugar de 2021/22 – não foi há assim tanto tempo, caramba, foi há 14 meses que Roger Schmidt os viu enquanto treinador do PSV... – e de se esperar agora que os dois sejam o coração de um Benfica que os adeptos acreditam possa ser absolutamente dominador. A derrota de ontem, com o Feyenoord, como a sofrida na semana passada, com o Burnley, veio deitar um pouco de água na fervura e tem motivado críticas à falta de dimensão física da equipa do Benfica. Não concordo. É evidente que, apesar de haver aí muita gente capaz de garantir o contrário, o físico importa. Uma equipa não pode ser bem-sucedida se não for rápida, se não aguentar as cargas, se ficar a dever aos rivais nas bolas aéreas. Mas tal como a forte reação à perda do Benfica de Roger Schmidt foi sempre mais tática do que física, a incapacidade que a equipa mostrou nestes dois jogos para responder à pressão alta dos adversários também foi mais tática do que física. O Benfica de Schmidt recuperava muitas bolas no meio-campo ofensivo porque atacava com muita gente e, no momento de transição, metia essa muita gente no quadrante da bola em vez de a baixar imediatamente. Embora servida por jogadores cujos comportamentos defensivos individuais eram por vezes insatisfatórios, a pressão alta do Benfica tinha uma raiz tática – impunha a força dos números e funcionava. Da mesma forma, neste momento, a dificuldade que o Benfica está a ter para meter a sua saída a quatro – os dois centrais e os dois médios-centro – e levar a bola em condições aos aceleradores que tem no último terço tem sido de raiz tática. Kokçu ainda não é Enzo, nem Jurasek nem Ristic dão a saída que dava Grimaldo e Di Maria pode ser excelente mas isso só se verá se a bola lá chegar redondinha. E para já o Benfica está a ter dificuldades ali. Pode ser uma questão de tempo, que o turco acaba de chegar, mas é possível que Schmidt tenha de trabalhar uma dinâmica diferente.
Foi do Catamo. Rúben Amorim voltou ao 3x4x3 que o Sporting tem bem trabalhado e voltou a ganhar com score tranquilo a uma equipa europeia da Liga espanhola. E se a Real Sociedad se tinha apresentado com muitas baixas no Algarve, o Villarreal CF já trouxe ontem a Alvalade um onze próximo do que se espera ver em competição. Os leões deixaram as mesmas dúvidas – Morita jogou os 90 minutos, mas poderá ele fazer sempre 90’, duas vezes por semana? E trouxeram uma boa surpresa, que foi a entrada de Geny Catamo para ala direito, logo aos 57’. O moçambicano foi o primeiro dos suplentes a entrar, um canhoto para ala direito, algo que Amorim tentara fazer por vezes com Fatawu na época passada. Deixou reservas acerca do comportamento nos momentos defensivos, mas a atacar roubou o palco na segunda parte. Foi descarado, surgiu confiante na forma como jogou sempre com a perna esquerda, até os adversários ficarem a perceber claramente que é a que ele privilegia. E foi nesse momento que resolveu driblar em direção à linha de fundo e dar-lhe com a direita, de surpresa, para oferecer o golo do 3-0 a Paulinho. Catamo já fez 20 jogos na Liga, entre Sporting, Vitória SC e Marítimo. Nesses jogos conta quatro passes de golo, mas nunca mostrara poder ser útil a este nível. É, por isso, a surpresa da pré-época leonina.
Entre ter um Rochinha no banco ou o Catamo, prefiro este último.
Margem de progressão enorme, mais barato, e se nao tiver que ser utilizado como o Rochinha raramente foi, pelo menos é um miudo da formação.