Um desabamento emocional
Conceição tem razão quando diz que o apuramento sorriu "à equipa emocionalmente mais madura". Mas a imaturidade não se revelou só nem sobretudo no cotovelo de Wendell.
Comecei a fase de grupos desta Liga dos Campeões a escrever que o FC Porto era a única equipa portuguesa que na atualidade tem pedigree europeu, acabo-a a escrever que os dragões estragaram essa vantagem com uma falta de lucidez que não é normal num grupo com a sua experiência acumulada a este nível. É verdade que os azuis e brancos foram os únicos dos nossos representantes que não puderam levantar o pé em nenhuma das suas partidas, tão semelhante era o valor dos três que lutaram até ao último dia para ser segundos classificados, mas nem isso serve de justificação para a forma como deitaram tudo a perder ontem, em casa, contra um Atlético Madrid debilitado e viciado na quezília. E se repararem bem escrevi debilitado antes de me referir ao caráter confrontacional que serve como uma luva às duas equipas e que a dada altura transformou aquele jogo num desafio às capacidades de controlo emocional.
No final, Sérgio Conceição não hesitou um momento em expor publicamente Wendell, pela forma como foi expulso. O treinador do FC Porto tem razão quando diz, sobretudo depois da expulsão de Carrasco, que era importante manter a cabeça fria. Escapa-me a intenção de ir disputar cada bola antes de um lançamento lateral como se fosse um “ruck” de rugby. O que é que se ganha com isso? Cinco segundos? Dez segundos? Vale a pena jogar aquele jogo do empurra em frente aos bancos, fazendo levantar toda a gente que lá está sentada e acabando invariavelmente em ação disciplinar e perda de lucidez dos intervenientes? Creio que todos concordaremos que não. Wendell tem, contudo, três atenuantes. A primeira é que no calor do jogo ninguém se lembra disso – mas devia. A segunda é que bateu menos do que o belga, que tinha sido expulso antes dele – Carrasco fez uma gravata a Otávio, que também tinha ido socar a bola que ele segurava, para a reter, antes do tal “momento definidor” do lançamento lateral, e Wendell “só” meteu o cotovelo no pescoço de Matheus Cunha, até em atitude mais defensiva. A terceira, e mais importante, é que não foi só ele que perdeu a cabeça no jogo de ontem.
O FC Porto estava em desvantagem naquele momento porque não tinha tido cabeça fria em várias ocasiões de finalização anteriores – e não foi só ontem, já tinha acontecido noutros jogos, onde também ficou a dever a si mesmo outros resultados. Ontem, acabou por ver essa desvantagem agravar-se para números insuperáveis porque o próprio treinador não teve cabeça fria para continuar a acreditar no processo e desequilibrou de tal maneira a equipa que a deixou letalmente vulnerável a dois contra-ataques e fora da luta pela qualificação quando finalmente chegou o golo de Sérgio Oliveira, de penalti. A dez minutos do final – que já se sabia seriam pelo menos 15, por causa das compensações – o FC Porto passou a jogar numa espécie de 3x2x4, com Corona a lateral direito, Mbemba a defesa central, Pepe a lateral esquerdo, Sérgio Oliveira e Vitinha a meio-campo e Fábio Vieira e Díaz a saírem das alas do ataque para se juntarem a Evanilson e Toni Martínez no corredor central. Mostrou coragem? É verdade. Mas mostrou sobretudo desespero – e o desespero não tende a ser a arma dos mais esclarecidos.
Dir-me-ão que naquela altura era preciso fazer alguma coisa. Aceito a interpretação, mas se o plano tinha sido bom até ali, se tudo o que fazia falta era um golo – até porque o Milan já estava a perder com o Liverpool FC –, se até ali o processo chegara para colocar Taremi em situação de marcar duas ou três vezes e se o FC Porto nem estava em desvantagem numérica, porquê mudar de uma forma assim tão radical? Mais decisivo do que o cotovelo de Wendell no pescoço de Matheus Cunha foi o contra-ataque de Griezmann que deu o 0-2 a Correa, na sequência de um lance em que Pepe foi apanhado na frente, como lateral-esquerdo ofensivo. Seguiu-se o 0-3, em período de compensação, mas aí já a Liga dos Campeões estava perdida de forma irremediável. É verdade que, como diz Sérgio Conceição, o apuramento “caiu para o lado da equipa emocionalmente mais madura”. Mas é demasiado redutor considerar que essa imaturidade emocional – que existiu – se limita à forma como Wendell se fez expulsar ou ao modo como Taremi perdeu os golos que podiam ter colocado o FC Porto no lugar do condutor e com domínio sobre a corrida. O treinador também devia ter esperado e acreditado mais no plano que tinha desenhado.
Na minha opinião acho que o Sergio Conceição é um bom treinador. Mas peca pelo temperamento, já bem conhecido de todos. (Como o Gattuso em Itália) Foi um grande jogador, não se chegará ao mesmo patamar como treinador, no entanto, resta-me esperar que sim. Não vi o jogo, mas quando li a incidências nem queria acreditar... claramente o muro desabou naquela segunda parte. De qualquer maneira, achei que estiveram bem durante a faae de grupos, claramente o grupo mais dificil de todas as equipas portuguesas. Resta desejar lhes boa sorte para a Liga Europa, aonde sim consigo ver um Porto Europeu a passar um playoff e os last 16. Acima de tudo espero que o treinador e os jogadores tenham tirado uma licao importante desta derrota.