Ronaldo e a Divina Comédia
Do paraíso ao inferno em dois dias, eis o percurso de Ronaldo, que passou da contra-luz da cerimónia de Zurique para a atenção crua das câmaras em Brentford. Há coisas que nem ele pode fazer.
No momento em que o Portugal “desportivo”, assim mesmo, com aspas, se vai entretendo a debater o que é mais grave, se é agarrar os genitais em direção ao público do rival ou ir para o banco lesionado para limpar uma série de cartões amarelos sem prejuízo, Cristiano Ronaldo voltou a usar o elevador da Divina Comédia de Dante Alighieri para baixar do paraíso a que a FIFA o alcandorou na segunda-feira até ao inferno que, parece ele julgar, está a ser a coabitação com o alemão Ralf Rangnick no Manchester United. Especializado em atos excessivos, como a quantidade anormal de golos que sempre marcou, o capitão da seleção portuguesa precisa de introduzir alguma normalidade na vida quotidiana, que esta montanha-russa permanente não pode fazer bem a ninguém.
Em causa aqui está a reação de Ronaldo à substituição, ontem, em Brentford. Empatado a zero ao intervalo, o Manchester United fez dois golos nos primeiros 15 minutos da segunda parte. Dez minutos depois, Rangnick decidiu substituir Ronaldo, que vai fazer 37 anos e vem de uma lesão que o impediu, por exemplo, de defrontar o Aston Villa, no fim-de-semana. Foi um ato de gestão perfeitamente normal, mas algo difícil de engolir por um Ronaldo que ainda não marcou golos em 2022 e certamente traria o ego semi-inflado pela cerimónia de segunda-feira, na qual a FIFA lhe deu honras de encerramento, remetendo para segundo plano a entrega do prémio de The Best a Lewandowski, e semi-diminuído pelas análises que o apresentam como maior razão para a falta de rendimento coletivo do Manchester United. O que se passou a seguir, no entanto, se já era dificilmente justificável num jogador banal é inaceitável numa referência para milhões como é o CR7. As câmaras focaram um Ronaldo furioso, de olhos faiscantes, a mandar o casaco ao chão e a vociferar expressões de revolta, mostrando também depois Rangnick a dirigir-se a ele para o acalmar e, possivelmente, explicar a decisão com argumentos como o facto de a sua saída não ter impedido o United de somar os três pontos.
Poupem-me, por favor, à conversa de que nenhum futebolista gosta de ser substituído e que mau mesmo é um jogador estar no banco e conformar-se com isso, que assim não encontra dentro dele próprio o impulso necessário para se superar. Tudo isso é verdade, e Ronaldo foi sempre um exemplo de superação, mas há limites de respeito pelo resto da equipa que ninguém pode ultrapassar. Nem Ronaldo, conforme se percebe, por exemplo, na expressão facial de Juan Mata, no banco, por trás dele, enquanto o português fazia a sua birra. Por muito que, aqui, a culpa seja menos dele do que de quem tenta retirar dividendos políticos ou financeiros do seu endeusamento permanente e o convence do seu caráter sobrenatural a cada coisa que ele faz. Habituado ao Olimpo dos deuses gregos durante anos, Ronaldo vive nestes dias dentro da Divina Comédia, o poema escrito no século XIV pelo italiano Dante Alighieri, a retratar as diferenças entre o paraíso, o purgatório e o inferno. E quem anda ao lado dele convence-o a cada momento que é ele quem dita, para o bem e para o mal, o que acontece no Mundo e como toda a gente transita entre estes três locais dependendo das ações que ele vai concretizando.
Porque aqui não se trata só de achar que os golos de Ronaldo são os melhores golos, que Ronaldo tem o melhor físico, que possui a maior coleção de carros, faz os melhores posts de Instagram, tem mais seguidores, consegue os melhores contratos... É também o caso inverso, no debate, recente em Inglaterra mas já com barbas em Portugal, acerca da possibilidade de ser ele o maior problema do Manchester United – por cá já há muito tempo há quem sustente essa ideia peregrina de que a seleção ficaria melhor sem ele. Baseados no que se tem passado nas equipas onde ele está, há analistas que já decretam que o United não joga bem por culpa de Ronaldo, que não é possível adotar o “contra-pressing” de Rangnick com Ronaldo, que ele é mais problema do que solução. Aliás, cada vez que este tema passa por aqui, como aconteceu por exemplo em finais de Agosto, aparecem sempre indefetíveis de um e do outro “partido”, o Ronaldista e o anti-Ronaldista.
Não creio que um jogador da qualidade de Ronaldo possa alguma vez ser a base de um problema, mas tenho a certeza de que um futebolista das suas caraterísticas exige a quem idealiza a forma de jogar de uma equipa algo de diferente. Porque ele é diferente. E se Solskjaer não conseguiu fazê-lo, Rangnick também está a sofrer com a sua própria incapacidade face a essa urgência criativa. O problema é que, em vez de contribuírem para lhe estabilizar os índices de cortisol e baixar o stress, os muitos assessores de Ronaldo ainda avolumam esta questão. Porque tão anormal como a birra de ontem, nascida dos momentos de dúvida à volta da impossibilidade de fazer equipa com ele, foi a sua transformação em figura maior da gala da FIFA destinada a entregar o prémio “The Best” a Robert Lewandowski.
Ronaldo limitou-se a fazer o que seria esperado dele nas duas situações. Na segunda-feira disse que tem “enorme respeito” pela instituição que é a FIFA, ontem mostrou ao Mundo que esse respeito não se alarga aos colegas de plantel.
O Ronaldo olhou para o campo e viu Elanga !! Ele deve ter pensado assim para ele " então tira-me do jogo e deixa Elanga ?" Ficou louco o rapaz. Sobretudo porque com o resultado em 2-0 ele sabe que podia ter mais oportunidades ou mais espaço na frente, coisa que não teve todo o jogo. Aliás eu estou completamente de acordo com o António de que o City nesta fase da carreira do Ronaldo era claramente a melhor opção, de uma o City passa 75% dos jogos a atacar e na grande área dos adversários, e de duas o Guardiola seria o treinador ideal nesta fase da sua carreira porque é um gênio e traria coisas novas ao seu jogo.
Veremos para o ano quem virá para o Utd, ou talvez Ronaldo não queira ficar. Cumprimentos
Caro António
Lamento muito pelos insultos que recebe todas as vezes que você dá a sua opinião honesta sobre o CR7 e entre outros temas. Todos temos a nossa opinião (vale o que vale) e é preciso aprender respeita-la.
Penso que quem sente a paixão pelo futebol e não clubites pode adorar os dois, seja Messi, seja Ronaldo.
Messi para mim é um GÉNIO, nasceu com um dom, parece que a bola flutua nos seus pés, é extraordinário aquilo que faz quando tem a bola.
Cristiano Ronaldo é um trabalhador ambicioso. É um grande exemplo para qualquer profissão, ou objectivo de vida. CR7 trabalhou arduamente para ser o melhor e competir com um génio que tem um dom devia-nos de encher todos de orgulho e olhá-lo como exemplo de vida. São dois jogadores completamente diferente mas cada um tem o seu mérito. Como português sinto-me orgulhoso pelo que fez porque levou o nome de Portugal aos 4 cantos do mundo.
Como qualquer ser humano, temos defeitos e qualidades e ontem na minha opinião não se comportou a altura de um professional, como Messi em outros momentos em que foi substituído. Tem-se ouvido muitas notícias negativas ultimamente do CR7, balneário, jogadores, treinadores, começa a ser um problema e era triste vê-lo acabar a carreira assim.