Pote e as renúncias
Pedro Gonçalves ficou fora da lista de Martínez pelas mesmas razões que levam João Mário a renunciar: os selecionadores não têm sabido motivar e mobilizar os atacantes de segunda linha.
Há dois aspetos a reter na segunda convocatória de Roberto Martínez para a seleção nacional – e um não merece que se perca muito tempo com ele. O facto de Pedro Gonçalves ter voltado a ficar fora da lista deve ser associado à renúncia anunciada de véspera por João Mário para se refletir acerca da concorrência que não existe nas posições de ataque da seleção. No fundo, as duas situações estão intimamente ligadas. O atacante do Sporting, único responsável por um duplo-duplo entre golos (15) e assistências (11) na Liga Portuguesa, não foi chamado pelas mesmas razões que terão presidido à renúncia de João Mário. A explicação que encontro para a desistência do jogador do Benfica, tratando-se de um jogador que viveu momentos felizes naquela equipa e em relação ao qual não se conhecem anticorpos no grupo, é ele sentir que os dias que passa em estágio na seleção de forma reiterada o prejudicam profissionalmente. Ao contrário de Pedro Gonçalves, João Mário já não vê na seleção uma forma de se valorizar no mercado, que não vai para mais lado nenhum, mas tal como o jogador leonino sente que na equipa nacional dificilmente viverá algo de diferente do que viveu por alturas do último Mundial (e que Pote experimentou no Europeu anterior): um mês fora para 127 minutos em campo (117 no caso de Pote, quando vinha de ser o melhor marcador da Liga de 2020/21), sempre em contexto de zero competitividade. No final, porque o Mundial se jogou a meio da época, João Mário ainda viu Roger Schmidt explicar a quebra de rendimento do Benfica na sequência da aventura qatari com o facto de alguns jogadores terem passado um mês a treinar sem competir. A questão é que, ao contrário do que sucede nos outros setores do campo, as três posições de ataque da seleção pouco rodam – e já era assim com Fernando Santos. Joga Bernardo, joga Ronaldo e tem jogado Félix. O primeiro porque é cada vez mais a referência da equipa, o segundo por se estar a testar até quando consegue dar-lhe um contributo válido, o terceiro porque Martínez quererá recuperar aquilo que ele em tempos mostrou. Os efeitos da realidade começam por ser devastadores quando levam ao desaproveitamento do talento de Leão, o atacante mais diferenciado que Portugal produziu em muitos anos. E prosseguem com a desmobilização que provocam nos atacantes de segunda linha, como João Mário, Pedro Gonçalves, Ricardo Horta, Rafa, Jota e por aí a fora. É por isso que os próximos dois jogos vão ser fundamentais na declaração de intenções do selecionador – e a ausência de Pote na lista não foi um bom sinal. Ficou a faltar o outro aspeto? Pois foi. O tal que nem merece que se gaste assim tanto tempo com ele. São as chamadas de Nélson Semedo, Toti Gomes e Renato Sanches para as vagas de Nuno Mendes (lesionado), Diogo Leite e Matheus Nunes (opções): enquadram-se no que é mais normal no trabalho de um selecionador. Há que ver jogadores, não só a jogar pelos clubes, mas também a treinar e a conviver no ambiente social de uma seleção nacional. É só isso. Mais nada.
Evangelizar é preciso. Armando Evangelista não aceitou a proposta de renovação de contrato com o FC Arouca, que brilhantemente conduziu ao quinto lugar da Liga. Tenho de Evangelista a ideia de ser um treinador de projeto, daqueles que pode nem impressionar à primeira vista, mas vai consolidando processos e melhorando o produto à medida que acumula o tempo de trabalho. Pegou no FC Arouca na II Liga, em três anos deixa-o na Liga Conferência da UEFA e entende que está na altura de ir em busca de novos desafios e, muito provavelmente, de novo e mais recompensador salário, nem que seja no estrangeiro. Está no seu direito, mas há que ter a noção de que a incapacidade das nossas equipas-sensação segurarem treinador e plantel no ano em que lhes aumentam o grau de dificuldade é um problema do futebol português. A sensação de 2022 foi o Gil Vicente, Ricardo Soares saiu para o Al Ahly e o Gil caiu de quinto para 13º lugar, falhando de caminho o compromisso europeu. A sensação de 2021 foi o FC Paços de Ferreira, Pepa saiu para o Vitória SC e o Paços caiu de quinto para o 11º lugar. Pelo meio, também falhou o compromisso uefeiro e este ano até desceu. A sensação de 2020 foi o Rio Ave, Carlos Carvalhal saiu para o SC Braga e os vilacondenses caíram do quinto para o 16º lugar, falhando a entrada na fase de grupos da prova europeia. Não é preciso continuar a dar exemplos. O que é preciso é evangelizar, é espalhar a palavra. Porque, como já escrevi aqui, serve de rigorosamente nada continuarmos a queixar-nos da perda de lugares nos rankings da UEFA e do contributo fraco das nossas equipas além dos grandes se não lhes damos condições para serem atrativas até para os profissionais que nelas atingem sucesso. Pensem nisso durante as férias.
Abel e o telemóvel pós-moderno. Há muito tempo que me irrita a obsessão pelo direto nas agendas das TVs, que justifica momentos com um jornalista a falar frente a uma parede num local onde não está a acontecer rigorosamente nada, mas onde presumivelmente antes terá acontecido alguma coisa. Quem já esteve comigo em estúdio sabe que há poucas coisas mais capazes de me transformar no Grinch ou no Gru mal-disposto do que os diretos com a partida dos autocarros das equipas para os estádios. A questão é que já mo provaram com números: esses momentos fazem crescer a audiência. Porquê, se assim de repente não vejo nada menos interessante? A explicação mais plausível é porque esses são os únicos momentos em que o espectador sente que está aos comandos, em que o que estão a servir-lhe é o mais próximo que vai ter de uma “reality TV” na qual os jornalistas também não controlam o que vai suceder a seguir – e que em 99,9 por cento dos casos é absolutamente nada. Mas nunca se sabe... Esta “magia do direto”, como diria qualquer radialista dos anos 80, foi potenciada pelas facilidades de captação e difusão de imagem, que a tecnologia deixou ao alcance de qualquer cidadão e esteve na origem do mais recente caso em torno de Abel Ferreira no Brasil. Abel viu alguém a filmar, com um telemóvel, uma discussão entre Anderson Barros, diretor do Palmeiras, e um dos árbitros do jogo com o Atlético Mineiro, e não esteve com meias medidas: tirou o telefone ao cidadão, que calhou ser um repórter da Globo. Há aqui tantos comportamentos abusivos que fica até difícil saber por onde começar – embora seja fácil entender onde isto vai acabar, que é num castigo pesado a Abel, que tinha obrigação de saber que não pode apropriar-se do telefone de ninguém. O telemóvel de Pedro Spinelli, assim se chama o repórter, converteu-se no primeiro telefone pós-moderno do futebol brasileiro. Antes de pedir desculpa, o treinador ainda disparou aos jornalistas: “O futebol brasileiro está assim por vossa responsabilidade”. De todos, Abel, de todos. Treinadores, dirigentes, jornalistas, público...
Quanto à selecção, só agora se ouve falar que é prejudicial para os jogadores que não jogam.
Estará o interesse selecção estar a mudar?
Quanto às saídas do autocarro é tal iqual aos resumos de futebol com 3 minutos e 15 de conferência de imprensa onde dizem sempre o mesmo.
Para o futebol e adepto interesse ZERO.
Bom dia, sou novo nisto ahah, sou subscritor pagante como posso aceder ao Telegram e ao discord? Desculpe ser por aqui a pergunta e obrigado