Para onde corre o mercado
O mercado fecha em quatro dias e, como sempre, são mais as vozes do que as nozes. Díaz, Palhinha, Darwin, Grimaldo ainda estão todos aí. E quem sai são jogadores como Tomás Ribeiro, a preço de saldo.
Quem chegasse aqui hoje, vindo de Marte, seria confrontado com a realidade aparente de um futebol cheio de pujança, com milhões a circular daqui para ali e jogadores extraordinários a seguir o caminho inverso. Paira a incerteza sobre craques como Luis Díaz, melhor jogador da primeira metade da Liga Portuguesa, por quem o Tottenham terá feito uma oferta de 45 milhões de euros ao FC Porto. Palhinha, médio determinante na forma de jogar do Sporting, estará no mercado por uns 30 a 35 milhões. Darwin, maior esperança do Benfica na área da capitalização repentina, também terá por aí interessados – tal como Grimaldo e até, pasme-se, Meité. Mas não me espantaria que, chegado o fim do dia de segunda-feira, todos ainda por cá estivessem, porque o mercado se rege por regras próprias e a exposição excessiva ou a aflição para vender não costumam ser boas para o negócio. Como se viu no caso do jovem central Tomás Ribeiro.
A notícia da saída de Tomás Ribeiro, da Belenenses SAD para o Grasshoppers, da Suíça, por um milhão de euros, até pode passar despercebida no meio de verbas tão astronómicas como as agitadas nas discussões televisivas acerca de mercado ou nas primeiras páginas dos jornais. Mas, a exemplo do que se passou nas negociações que o FC Porto fez por Eustáquio, Corona ou Sérgio Oliveira, é um caso paradigmático do que é hoje o mercado dos clubes nacionais. Faz-se o que se pode, não o que se quer ou o que se propagandeia, na tentativa de chamar os estrangeiros ao engodo. Tomás Ribeiro tem 22 anos, 62 jogos na Liga e está avaliado em 1,5 milhões de euros pelo Transfermarkt. Era um dos valores mais seguros da equipa agora comandada por Franclim Carvalho e um daqueles em quem o treinador mais podia suportar-se para a hercúlea luta pela fuga à despromoção que terá de enfrentar nos próximos meses. E no entanto saiu em saldo, para uma equipa da segunda metade da tabela de uma Liga que é absolutamente periférica. Porquê? Provavelmente porque a gestão da Belenenses SAD tem necessidade daquele milhão para chegar ao fim da época.
E atenção, que as operações de mercado não têm de assemelhar-se sempre ao desespero do “junkie” que vende as joias da família ao desbarato para comprar a próxima dose. São quase sempre uma questão de oportunidade, como se viu nos negócios de Sérgio Oliveira, Corona e Eustáquio, feitos pelo FC Porto. Que Oliveira não contava muito como opção no plantel do FC Porto era evidente. Que a questão não era pessoal com o treinador também ficou à vista de todos na forma como ambos festejavam golos em conjunto. Que ele não desaprendeu percebeu-se pelo impacto súbito que teve quando chegou a Roma. O que se passou, então? Provavelmente, o jogador só aceitou renovar quando lhe prometeram que saía, porque essa era a sua vontade e ele, dragão de coração, não quis que o clube ficasse prejudicado. Não se conseguiu vender-lhe o passe no verão, pelo que ele passou estes meses a fazer companhia a Sérgio Conceição, à espera que o mercado reabrisse – e mesmo agora saiu por empréstimo e terá que fazer pela vida.
Eustáquio chegou ao Dragão para o substituir e logo houve quem apontasse o dedo à gestão do FC Paços de Ferreira, que terá recusado em tempos ofertas mais generosas do que aquela que agora aceitou – um empréstimo com opção de compra de 3,5 milhões de euros. Mas gerir é aceitar o risco. Se na altura os castores recusaram melhores negócios foi porque achavam que o jogador podia vir a valorizar ainda mais ou até que podia render aquilo para que os jogadores verdadeiramente servem, que são vitórias em campo. O FC Porto está agora a ser confrontado com a necessidade de fazer uma opção parecida com Díaz. Diz o Transfermarkt que o jogador vale 40 milhões de euros, mas o FC Porto escuda-se na cláusula de rescisão, que são 80 milhões, e lamenta o facto de ter apenas 80 por cento do passe. O Tottenham terá oferecido 45 milhões. O que fazer? Aceitar vender? Recusar? E se o jogador fica e se lesiona? E se fica e baixa de rendimento? E se ele vai e o FC Porto, sem ele, perde a vantagem que tem sobre os rivais na classificação? E se fica e se valoriza, permitindo um negócio mais vantajoso no final da época, feito em cima da conquista de títulos?
Tudo isto tem de ser devidamente equacionado. Mas não é só isso que tem de ser muito bem ponderado. Porque, como vimos no caso de Sérgio Oliveira – e poderemos estar a ver no caso de Palhinha ou na ‘open sale’ que é feita na comunicação social por Darwin – aqui há mais vontades (do jogador, do seu agente) e necessidades (liquidez do clube potencialmente vendedor) a ter em conta. O problema dos adeptos quando pensam o mercado é que o fazem exclusivamente a pensar nos interesses dos seus clubes. Envolvem-se apaixonadamente em campeonatos de milhões, como se houvesse uma taça para quem fez mexer mais dinheiro, mas raramente se dão ao trabalho de avaliar outras perspetivas. O que pensa Díaz? Quer sair para o Tottenham ou prefere esperar que apareça um clube mais vencedor? Como estão as contas do FC Porto? Precisa de fazer já dinheiro ou pode esperar? O que quer Palhinha ? Quer ir já para o estrangeiro (faz 27 anos em Julho e sabe que não passarão muitas mais carruagens por ele) ou admite ficar à espera? E tem interessados ou é a ele que lhe interessa? E Darwin? O Transfermarkt diz que ele vale 32 milhões – e na verdade quase duplicou ali o valor desde o início desta época, pelo que não pode dizer-se que esteja subavaliado – mas o Benfica vai fazendo saber que nem fala abaixo de valores astronómicos que o tornariam, de longe, o mais caro desta janela de transferências em todo o Mundo. Há interessados num negócio desse calibre? Ou trata-se somente de uma tentativa de inflacionar o valor público do jogador numa espécie de venda em hasta pública para resolver os excessos cometidos na construção de um plantel demasiado vasto?
Tudo isto deve ser devidamente ponderado antes de se falar de mercado. E o mercado dos nossos clubes, infelizmente, é cada vez mais um mercado de aflitos, que dependem destas operações para se manterem vivos. Isso é que convém mudar.
Mercado de inverno até acho que devia ser mais curto, porque nunca é benéfico para uma equipa mexer muito em janeiro. Serve para libertar um ou outro jogador insatisfeito ou para compensar uma lesão grave. Ou noutros casos mas esses mais raros de fazer uma super transferência e ser benéfico para o clube financeiramente.
E se......
E se os jogadores forem vendidos?
E se os clubes aceitarem, à última da hora, ofertas irrecusáveis?
E se os jogadores aceitarem mesmo que sigam para clubes de menos nomeada?
E se os clubes portugueses conseguirem salvar a época com estas transferências?
E se?
Deixai o mercado funcionar e depois... Logo se verá