O Benfica com que Schmidt sonhou
As contingências de mercado levam a que o Benfica que começa hoje a caminhada rumo à fase de grupos da Liga dos Campeões não seja aquele com que Roger Schmidt sonhou. Mas parece mais que suficiente.
Nunca saberemos se a equipa com que Roger Schmidt vai enfrentar hoje o início da fase de qualificação para a próxima Liga dos Campeões é a equipa que ele idealizou ou não. Não deve sê-lo, na medida em que há lesões a afastar potenciais titulares, há gente que está a jogar e não se enquadra no histórico do treinador alemão e houve jogadores que ainda não chegaram num mercado que está a revelar-se tão difícil como se esperava – e bem mais complicado do que proclamavam os vendedores de ilusões. Ainda assim, o Benfica entra como amplamente favorito na eliminatória com um Midtjylland que leva avanço porque já está a competir (20h, BTV). E não é por ter ganho todos os jogos de uma pré-época desenhada exclusivamente para ganhar balanço. É porque é mesmo melhor equipa.
Não é difícil adivinhar que a equipa com que Schmidt sonhou incluía outro guarda-redes, uma dupla de centrais diferente, mais um médio, que ele gostaria que fosse Sangaré mas que ao que tudo indica aceita que seja Aursnes, e ainda Ricardo Horta. E o facto de os jogadores que ele queria não estarem cá não significa que tenha havido incompetência na abordagem ao mercado – pelo menos não neste defeso em particular... – nem tão pouco que houve imensa perspicácia na decisão de levar para estágio a carrada de excedentários que faltava colocar e de cuja saída depende, na maior parte dos casos, a contratação de novos craques. Há que contrariar o tradicional “oito-ou-oitentismo” opinativo. É que nem sempre o mercado se comporta no sentido em que os clubes desejam. Nem mesmo os clubes que mais nele se mexem, como o Benfica, mas cuja índole periférica não lhes permite influenciar o movimento global da coisa.
Todos os casos são diferentes, neste plantel do Benfica. Vlachodimos não é, a jogar com os pés e no controlo da profundidade, o guarda-redes com que Schmidt sonhou, mas é muito melhor guarda-redes do que Helton Leite, pelo que continuará a jogar enquanto não aparecer a tal proposta – e os especialistas estão a empurrar o Leicester City para a fazer – que permita trazer o jogador pretendido. Ele pode não dar à equipa tudo o que o treinador quer de um guarda-redes, mas não será seguramente por ele que o Benfica vai começar a perder jogos. Morato não é, ainda, o jogador feito, experiente e com horas suficientes de campo para tomar quase sempre boas decisões, como será João Vítor, três anos mais velho, mas o reforço chegado do Corinthians está magoado e não resta a Schmidt outra hipótese a não ser atribuir a vaga ao lado de Otamendi ao jovem brasileiro, que ainda assim suplantou Vertonghen na hierarquia. E não só não creio que haja elevado potencial de erro no atual titular, como acho que pode fazer-lhe bem o assumir de responsabilidade, de modo a refrear-lhe o risco que muitas vezes ainda corre, seja em posse ou a defender, e a dar à equipa cinco boas opções – que ainda há o também lesionado Lucas Veríssimo.
Florentino – a propósito, achei piada ao mito do Robocop construído no ginásio, como se o médio campeão com Bruno Lage não servisse... – está a impor-se ao lado de Enzo Fernández na vaga para a qual Schmidt quereria Sangaré. O marfinense custa valores proibitivos – uns 40 milhões de euros – e até já há uma segunda escolha em linha, que é o norueguês Aursnes, do Feyenoord. A questão é que provavelmente só poderá vir se o Benfica conseguir vender Weigl. Não se trata só do excesso de gente para a posição, que conta ainda com o promissor Paulo Bernardo e com Meité e Gabriel, e do necessário equilíbrio na folha salarial. Porque há aqui três situações diferentes. Paulo Bernardo está em valorização, mas para valorizar tem de ter espaço para jogar. De Meité e Gabriel o Benfica já não espera nada e libertá-los-á desde que alguém lhes pague o salário. Mas um eventual investimento em Aursnes virá da venda de Weigl, porque o norueguês é um jogador mais físico, mais próximo do protótipo preferido de Schmidt, mas se passar a quarta opção o alemão desvalorizará de forma ainda mais veloz do que nos anos que já passou na Luz: chegou por 20 milhões, ao que parece o Benfica tenta vendê-lo por 15, mas se passa uns meses a ver jogar em 2023 já nem dez conseguirá obter por ele.
E depois há o caso de Horta. Já expliquei numa edição passada do Último Passe (que pode ler aqui) as razões pelas quais o negócio está num impasse do qual só sairá se o jogador fizer força para deixar Braga. De todos os jogadores cuja entrada no plantel Schmidt terá aprovado, o internacional português é, contudo, quem mais falta faz. Porque traria golo à segunda linha de ataque, onde ninguém chega aos dois dígitos num campeonato desde que Rafa fez 17 tentos na Liga de 2018/19 – Neres fez 14 na Liga holandesa de 2017/18. E porque traria ainda um notável incremento na qualidade da tomada de decisão, fruto de uma clarividência futebolística que nos titulares do Benfica naquela zona do campo só tem par em João Mário – o tal que não faz golos e por isso devia jogar mais atrás. É verdade que a eventual chegada de Horta deixaria Schmidt com um problema para resolver, que seriam quatro galos para três poleiros, mas não é menos certo que ele seria o mais habilitado dos quatro.
Não estando, como não está, há que resolver com os que estão. E estes, ainda assim, parecem mais do que suficientes para superar a primeira barreira no acesso à Liga dos Campeões.
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