Detalhes, detalhes
Os quatro grandes passaram pela quarta eliminatória da Taça de Portugal com um score global de 18-1 e, sobretudo, aproveitaram para acertar detalhes que podem ser importantes para a semana europeia.
Pela segunda vez esta época, enquanto o Manchester City regressa da pausa de seleções para um jogo com o Liverpool FC, chamando a atenção do Mundo para a Premier League, e o Inter de Milão o faz para enfrentar a Juventus, em luta pelo topo da tabela da Serie A, os nossos clube europeus têm a via mais macia da Taça de Portugal para se prepararem para a semana uefeira que aí vem. Na primeira vez, há um mês, não correu muito bem – só uma vitória e um empate em quatro jogos a seguir a uma rentrée tão suave. Os jogos de terça, quarta e quinta-feira serão fundamentais para todos, ainda que só o SC Braga jogue de forma mais decisiva a continuidade na competição: os minhotos recebem o Union Berlim sabendo que a vitória é fundamental, não só porque lhes garante a vaga na Liga Europa como também porque, desde que o SSC Nápoles não ganhe ao Real em Madrid, lhes permitirá encarar o último dia com chances de qualificação para os oitavos-de-final. Mas também o Benfica precisa dos primeiros pontos, na receção ao Inter, para poder viajar até Salzburgo, depois, com hipóteses de prosseguir na Liga Europa. E até FC Porto e Sporting, que decidirão o apuramento nos confrontos diretos com Shakhtar Donetsk e Sturm Graz, em casa, na última jornada, terão esta semana com o FC Barcelona e a Atalanta partidas fundamentais para perceber se podem ou não ser primeiros classificados dos seus grupos. A Taça de Portugal, que os quatro arrumaram com a limpeza de quatro vitórias e 18-1 em golos, serviu, por isso, para afinar detalhes. A experiência de Varela a defesa-central para contrariar o erro que terá sido a não inscrição de Zé Pedro na lista da Liga dos Campeões, quando entre os quatro jogadores da posição havia dois veteranos, mais atreitos a lesões, e um David Carmo que tem sido cliente assíduo dos cartões. As dificuldades defensivas mostradas por uma asa direita composta por Aursnes e Di María face a Francisco Moura e Puma Rodríguez, a evidenciar o erro que terá sido a gestão do dossier defesas-laterais no mercado do Benfica, que por isso mesmo chega ao fim de Novembro com dois jogadores adaptados – o norueguês e Morato – nas duas alas. O tempo que demorou o SC Braga a ver que precisa de dois médios de perfil complementar e que com o seguro Moutinho ao lado dos progressivos Zalazar ou Al Musrati ganha uma dimensão defensiva completamente diferente do bar aberto em direção à baliza de Matheus que foram os primeiros meses de época. A capacidade do Sporting para impor as bolas paradas como arma perante uma frágil equipa do quarto escalão, que mesmo assim ia chegando para a lentidão da criação leonina enquanto se manteve atrás e não se deixou empolgar a atacar e a pressionar mais alto para o lado da bancada dos mil heróis que vieram do Minho a Lisboa apoiar. No fim, ganharam todos e todos mostraram algumas coisas boas, mas é bom que tenham a noção de que a coisa só começa a ser mesmo a sério a partir de amanhã.
Detalles, detalles. A foto, republicada por Pep Guardiola no Instagram após a morte de Terry Venables, mimetiza mais do que um gesto por parte do atual treinador do Manchester City, naquela noite de Abril de 1986 um simples apanha-bolas em Camp Nou. El Tel, o técnico que cantava Frank Sinatra para os jogadores, começou por interromper um longo jejum de títulos, ganhando o campeonato espanhol de 1985 com o FC Barcelona, e naquela noite garantira uma já inesperada vaga na final da Taça dos Campeões Europeus, com um 3-0 aos suecos do IFK Gotemburgo seguido de um bem sucedido desempate por penaltis. No momento da foto, era levado em ombros por Migueli e Clos e erguia os braços ao céu, longe ainda de saber que na final o sonho catalão seria parado pelas proezas de um guarda-redes romeno – Ducadam – capaz de defender tudo o que lhe mandassem para cima, incluindo quatro pontapés da marca de grande penalidade. Do nível do relvado, o próprio Pep Guardiola erguia os braços ao céu também – e parece o cúmulo do oportunismo dizer que o detalhismo do mais fiel discípulo de Johan Cruijff terá começado a nascer nele durante a adolescência, quando assistia aos treinos daquele Barça, mais tarde descritos como complexas experiências de laboratório, em que até os lançamentos laterais eram trabalhados à exaustão. A ver como o Manchester City e o Liverpool FC lutam pelo topo da Premier League com um jogo que tem tão pouco que ver com as bases daquele futebol inglês tradicional, do “kick and rush” e do ênfase nas bolas longas e nos duelos entre pontas-de-lança massacrados por defesas-centrais com pinta de machos-alfa, há sempre a tendência de se tentar perceber quem iniciou este caminho de globalização, quem deu o primeiro passo em direção à continentalização do futebol inglês. Ainda há dias, no Futebol de Verdade, falei no Liverpool FC de Bob Paisley ou no Ipswich Town de Bobby Robson como possíveis pontos de viragem, mas é justo que se lhes some também o nome de Venables, pela forma como deixou que a experiência catalã nele perdurasse para os anos que mais tarde haveria de viver à frente do Tottenham e depois para o curto período que passou aos comandos da seleção inglesa, no Europeu 1996. Nesse ano, o futebol voltou a casa – era o slogan da competição – e encontrou uma família mudada, capaz de normalizar o percurso iniciado por Robson entre 1982 e 1990. Aquela Inglaterra, como a de Robson em 1990, aliás – e como o Barça de 1986, dez anos antes – caiu nos penaltis. Na meia-final, contra a Alemanha, o selecionador detalhista, o treinador que trabalhava até lançamentos laterais, esquecera-se de definir quem bateria os penaltis no caso de a primeira série de cinco não chegar para separar as duas equipas. Quem se ofereceu para avançar foi Gareth Southgate, hoje selecionador inglês. Falhou, como falhara Pearce em 1990 ou como voltaria a falhar Saka em 2016. Foram e serão sempre detalhes a impedir ou a impulsionar a glória, mas o que faz a história do futebol é o desejo de mimetizar gestos. Guardiola ou Southgate como Venables.
Detalhes, detalhes (mas com sotaque brasileiro). É impossível desligar da luta pelo título da Série A do Brasileirão. O Palmeiras de Abel Ferreira conseguiu ontem manter o primeiro lugar, anulando por duas vezes a desvantagem de um golo a jogar com dez contra o Fortaleza, mas tem agora os mesmos pontos que o Flamengo, que passeou por cima do América em Minas. O Botafogo voltou a empatar e continua a queda livre, mas quem deixa as melhores sensações neste momento até é o Atlético Mineiro de Scolari e Hulk, que aviou o Grêmio por 3-0 e deve ter tirado os gaúchos da luta. O Verdão não só tem o calendário menos complicado como tem o hábito de vitórias recentes a reforçar-lhe a candidatura, por via da solidez mental, mas o que se viu ontem no Castelão foi uma equipa a reagir no coração e com pouca cabeça-fria. E na quarta-feira à noite, a seguir à Champions, há Flamengo-Atlético.