Sábado de decisões
Há eleições do FC Porto, há conferência de imprensa de Rúben Amorim e há reencontro entre Roger Schmidt e o público da Luz. No sábado teremos uma ideia mais concreta do que pode ser a próxima época.
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Pinto da Costa escolheu a semana antes das eleições para dizer que Sérgio Conceição já se comprometeu a continuar no FC Porto, mas só se for ele o escolhido dos sócios. Rui Costa fez uma declaração meramente circunstancial na sequência da contestação de Faro e das palavras mal medidas de Roger Schmidt no final da partida, a tentar manter tudo em banho-maria até acabar a época, mas fê-lo sem se referir uma só vez ao nome do treinador – o que é revelador de que nem ele confia que este consiga manter a paz com os adeptos a cujos apupos reagiu já duas vezes de forma excessiva. No Sporting, as notícias da expedição de Rúben Amorim a Londres foram seguidas de contra-notícias acerca da hipótese de ele continuar em Alvalade, mas sem declarações do clube nem do campo do treinador. Há esclarecimentos prometidos para sábado, tanto nas eleições do FC Porto como na conferência de imprensa de Amorim, mas muito daquilo que se passará dependerá também do que não será dito, da química que nesse dia se estabelecer na Luz entre os adeptos que forem ver o Benfica-SC Braga e o treinador alemão.
Rui Costa sentiu-se impelido a falar, ontem, face à gravidade dos acontecimentos no final do jogo do Benfica em Faro. Os jogadores e os treinadores foram insultados à saída do relvado por um grupo de adeptos inconsoláveis com os resultados, que a não ser que assistamos a um gigantesco golpe de teatro levarão o Benfica a deixar esta época de grande investimento com uma Supertaça, apenas. O treinador não se ficou e, na conferência de imprensa, repetiu algo que já tinha dito uma vez esta época: que se é para isto mais vale os adeptos ficarem em casa. Não haverá maior insulto a uma massa associativa que se orgulha de ser a alma de um clube, de ser a razão e o motor da sua existência. “Era o que faltava, agora, ser mandado para casa por alguém que chegou aqui há ano e meio, por um funcionário do clube”, protestam, como se ser funcionário de um clube fosse um dos maiores insultos que se pode fazer a alguém se o que está em causa é medir o amor a um emblema. Só Schmidt saberá o que lhe ia na mente quando disse o que disse, se o fez por desencanto, desilusão, irritação genuína ou taticismo, tentando esticar a corda e forçar Rui Costa a avançar no sentido da rotura do contrato que o liga ao clube por mais duas épocas. Mas esta ainda não é a altura de fazer as contas – e por isso esteve bem Rui Costa ao encher metade da declaração gravada de ontem com nada e a outra metade com coisa nenhuma.
Aliás, não estivesse o edifício em chamas, havendo por isso risco de ele vir a ser chamado à pedra por não as ter tentado sequer extinguir, e eu até diria que mais valia ao presidente ter ficado calado. O ideal, aliás, até teria sido Schmidt ensaiar um passo à retaguarda, mas nem o alemão será homem de recuar nem, por uma questão de decência, Rui Costa se terá sentido no direito de lhe pedir isso, por saber que é possível que daqui a um mês esteja a mostrar-lhe a porta da rua. Porque o Benfica tem quatro jogos até final da época e esse, sim, será o tempo de avaliar o que cada uma das partes fez mal e delinear a estratégia para mais um ano. O sucesso dependerá de todos serem capazes de pôr a mão na consciência. De a administração entender que deu ao treinador vários jogadores que não eram os mais indicados para a ideia de jogo que ele defende, o que não só redundou num desbaratar de recursos financeiros como dificultou as escolhas que este tinha de fazer – e que por isso não resolve nada apenas mudando o treinador. De o técnico compreender que pela gestão exclusivista que fez do grupo reduziu a dimensão de um plantel vasto em vez de a alargar, ajudando ainda mais no tal desbaratar de recursos – e que por isso não chega darem-lhe muitos jogadores que encaixem na ideia dele. E de os adeptos entenderem que Rui Costa tem razão numa das coisas que, ainda assim, disse ontem: que há limites para o direito à contestação. E que a possibilidade de verem a equipa pressionar o Sporting neste final de época, forçando-o a entrar no Dragão, domingo, a quatro pontos, passa muito por uma vitória no sábado e não pela transformação do jogo com o SC Braga numa manifestação anti-Schmidt.
Mais simples – e ao mesmo tempo mais complexa – parece ser a situação no Sporting. Rúben Amorim fez mal em ir a Londres na segunda-feira e, sobretudo, ao ser apanhado. Fez mal por estar a contradizer o que ele tinha anunciado que faria, conforme expliquei aqui ontem. E fez mal porque não creio que o West Ham seja o passo correto para uma carreira que ele quer ver em ascensão. Que sentido faz ao homem que tentou convencer – primeiro com sucesso, depois sem ele – Matheus Nunes a não trocar a Champions no Sporting pelo meio da tabela da Premier League no Wolverhampton a trocar agora a Champions no Sporting pelo meio da tabela da Premier League no West Ham? Matheus entretanto já está no banco do Manchester City? É verdade. Mas o mercado dos jogadores é bem mais manejável do que o dos técnicos, sempre dependentes das (poucas) vagas que se abrem – razão pela qual nos últimos dez anos houve apenas dois casos de mobilidade ascensional na pirâmide do futebol inglês até um dos grandes, as escolhas de Frank Lampard e Graham Potter pelo Chelsea. Esta vai ser uma época animada no capítulo das mudanças, mas o Liverpool FC já parece mais inclinado para Arne Slot (do Feyenoord) e do Chelsea e do Manchester United ainda não se sabe se irão trocar ou manter Pochettino e Ten Hag. De resto há o Bayern, mas a ideia ali será seguramente apostar num tipo mais low-profile e germanófilo, e há o FC Barcelona, que fica sem Xavi Hernández mas está em tantas dificuldades que dificilmente poderá oferecer, no imediato, seja a quem for, mais do que a possibilidade de fazer uma equipa à base da formação – e daí que ganhe força a ideia de ser Rafael Márquez o seu condutor.
Outros clubes poderiam apresentar a Amorim um salário atrativo, mas fará isso assim uma tão grande diferença a quem já ganha 2,5 milhões de euros limpos ao ano? O Sporting quer continuar com Amorim e a Amorim não sobram muitas opções melhores do que continuar no Sporting – até porque muitos clubes torcem o nariz a pagar os 20 milhões de euros que custa libertá-lo. A continuação faz sentido na minha cabeça – onde no entanto não encaixam as sucessivas declarações do técnico no sentido de poder sair no final desta época. Só entendo isso numa eventual lógica de pressão sobre a administração para lhe ser dado mais poder (ainda) na formação do grupo. A não ser isso, há aqui algo que nos escapa a todos e, sendo certo que não será respondido no sábado, é o que mais curiosidade me motiva na conferência de imprensa que antecede o FC Porto-Sporting de domingo. Tal como gostaria de entender o posicionamento de Sérgio Conceição perante as eleições do FC Porto. Renovou, como garantiu Pinto da Costa? E, se o fez, porque é que isso não foi apresentado antes? Vai ficar mesmo? As indicações que foram sendo dadas ao longo da época foram sempre de fadiga de projeto, que é normal ao fim de sete anos. Várias vezes Conceição pareceu desiludido com a atuação de quem está acima, na SAD, a ponto de deixar a sensação de que o amor ao clube já não seria o suficiente para o segurar.
Sucede que também ele tem poucas opções – Conceição é fiel aos seus emblemas e a Lazio, que é um deles, já substituiu Maurizio Sarri por Igor Tudor. Mesmo assim, se tivesse de arriscar hoje, eu diria que tal como André Villas-Boas já disse que se sentaria com ele para discutir uma eventual continuação mas não terá assim grande vontade de prolongar a ligação, também Conceição admitirá prosseguir mas sem uma enorme inclinação para o fazer. Também isso, provavelmente, ficará decidido no sábado, mas dificilmente transpirará para o conhecimento público.
Dado o comportamento de Ruben Amorim no interesse do West Ham, onde viajou de imediato em jato privado, em contraponto com o que fez quando se falou do Liverpool, em que negou qualquer tipo de negociação, desconfio que Liverpool não passou de rumor de mercado. A permanência de Amorim é boa para o Sporting, mas dá a ideia de que o mercado de treinadores nos candidatos ao título Europeu, está hoje "viciado" e a escolha se dá mais pela fama do que pelo mérito desportivo. Claro que não ajuda a falta de uma campanha Europeia de maior sucesso, marcada apenas por uma vitória sobre o Arsenal na Liga Europa da época passada e eliminações prematuras na Liga dos Campeões, mas Amorim parece-me melhor treinador do que muitos dos que falam para os tais tubarões, seria um risco calculado, mas falta-lhe a fama.
Pelas notícias que já sairam o jogo contra o Braga nao será de ataque ao treinador mas sim uma mobilização ao minuto 10 para apelar a que o Presidente Rui Costa se demita.
Ora se o desânimo e as manifestações de desagrado em Faro foram de "meia dúzia" de indignados, na Luz teremos um estádio cheio e aí, acho que se pode avaliar melhor o nivel de descontentamento da nação benfiquista, ainda por cima contra uma figura do clube.