Para ganhar é preciso querer
O Sporting não quis ganhar em Bruges? Quis, conscientemente. Mas na mente de todos pesou muito mais o medo de perder. Está aí a explicação para a “estrelinha” ao contrário que assombra Alvalade.
Palavras: 1308. Tempo de leitura: 6 minutos (áudio no meu Telegram).
O Sporting fez em Bruges o melhor jogo da curta era João Pereira. E, mesmo assim, perdeu. Não perdeu porque pela frente tivesse um adversário intransponível – pelo contrário, que este FC Bruges pareceu sempre uma equipa acessível. Não perdeu por falta de domínio ou por inferioridade. Perdeu sobretudo porque não quis ganhar. “Como assim?”, perguntarão. “Não quis ganhar? Então justifica-se a anormalidade que foi o arremesso de uma tocha contra os jogadores no final do desafio?” Não. À partida porque anormalidades dessas não se justificam. Depois porque aquilo que vimos não foi um boicote consciente. Sim, os jogadores quiseram ganhar, os treinadores também quiseram ganhar, mas em todos pesou mais o medo de perder. Na campanha até ao título de 2020/21 falou-se muito em Alvalade de “estrelinha”, como se um campeonato de 34 jornadas se pudesse vencer com sorte. Só que a “estrelinha” não é sorte. A “estrelinha”, de que há inúmeros casos internacionais – havia, por exemplo, o “Fergie Time”, a assinalar a quantidade absurda de golos marcados nos descontos pelo Manchester United de Alex Ferguson –, é convicção, é a vontade subconsciente de vencer que se incute através da liderança. E é isso que tem falhado, e muito, no Sporting desde que de lá saiu Rúben Amorim.
Se virmos o jogo de ontem no plano meramente estratégico, ele mostrou um crescimento do Sporting. O FC Bruges é melhor equipa do que o Moreirense ou o Santa Clara, mas joga mais alto no campo, deixa mais espaço às ligações interiores e à busca da profundidade, que são as melhores armas destes jogadores do Sporting. A saída de bola correu melhor aos leões, porque o FC Bruges quis pressioná-la como o fizera o Arsenal, mas sem a qualidade que tem o Arsenal nesse momento. E isso foi meio caminho andado para um Sporting a mandar no relvado, capaz de verticalizar o jogo por dentro e de deixar de abusar dos cruzamentos: ontem já só foram 16, 12 dos quais na segunda parte, quando em Moreira de Cónegos tinham sido 29 e com o Santa Clara 34. O golo surgiu cedo, tal como na partida com o Moreirense, e foi aí que, mantendo os argumentos futebolísticos, a equipa voltou a não saber construir em cima da vantagem, transformar a superioridade em arrogância positiva, a que leva à convicção de que a vantagem é para alargar e não para segurar. O Sporting teve mais bola que o FC Bruges (56 por cento), fez mais passes (657 a 517), mas teve menos ações na área (17-21) e rematou menos (oito-nove). O que faltou foi a vontade de desequilibrar que nasce da consciência da superioridade, simplesmente porque o Sporting nunca consolidou em si a noção de que era superior. Pelo contrário, teve sobretudo pavor de ser inferior, o que se viu no comportamento que a equipa assumiu em campo e nas opções do treinador no banco.
Que também João Pereira estava aterrorizado com a perspetiva da derrota ficou bem claro na primeira substituição que fez. Não a de Quaresma por Saint Juste, porque por mais confusão que me faça o facto de Debast se ter transformado em última opção num jogo no seu país, essa já era naturalmente reativa, por se seguir à incapacidade física de um titular. Mas, com a equipa por cima no jogo, a precisar de um empurrão, Pereira nunca lho deu e, pelo contrário, o primeiro sinal que lhe deixou foi de receio, quando trocou Maxi Araújo pelo mais defensivo Esgaio, aos 81 minutos. Claro que Esgaio é, como afirmou o treinador, “um profissional como os outros, que trabalha todos os dias para jogar”, mas não era o mais adequado para empurrar a equipa para a vitória. Foi sempre, em todos os anos de Sporting, um ala conhecido pela sua capacidade de estabilizar e não por acrescentar qualidade ofensiva. E a própria justificação do treinador, mais uma vez a refugiar-se no vazio de um cliché, ajuda a explicar a dificuldade que ele mostra para mobilizar o plantel. Estou hoje convencido de que João Pereira entende de futebol e que a escolha de Frederico Varandas se terá baseado em inúmeras conversas que com ele há-de ter tido, desde o tempo em que partilharam balneário, um como futebolista e outro como responsável clínico. O que falhou foi a avaliação de um fator importantíssimo, que é o carisma. Porque é de carisma que se fazem as lideranças. E, ainda que não possamos saber se ele é com os jogadores o reflexo do que é com os jornalistas, ainda que tenha sido bastante mais afirmativo nas últimas conferências de imprensa, que tenha substituído aquele assassino “agora é levantar a cabeça” das duas primeiras derrotas por frases mais mobilizadoras, João Pereira ainda precisa de largar os clichés que reproduziu durante toda uma vida como jogador e de aproveitar as oportunidades que tem de comunicar para mobilizar a equipa em torno de um objetivo ambicioso.
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No mesmo ano em que igualaram o seu melhor arranque de Liga de sempre, com onze vitórias nas onze primeiras jornadas, os leões repetiram agora a sua pior sequência da história, com quatro derrotas consecutivas. Em mais de 100 anos, isto só lhes tinha acontecido duas vezes: à equipa de Carlos Carvalhal, em 2010, e à de Ricardo Sá Pinto e, depois, Oceano Cruz, em 2012. Carvalhal aguentou-se no cargo, porque quando entrou, em Novembro de 2009, para substituir Paulo Bento, já apanhara a equipa a onze pontos dos líderes, sem expectativas de vir a lutar pelo que quer que fosse. Mas acabou a época em quarto lugar. Oceano, que ocupara provisoriamente o lugar deixado vago pela demissão de Sá Pinto, ficou para um quinto desafio (0-0 em casa com a Académica) antes de ser trocado por Frankie Vercauteren, na temporada que os leões acabaram na sétima posição, fora até das provas europeias. A questão que hoje se coloca a Frederico Varandas é que, ao contrário de José Eduardo Bettencourt ou Godinho Lopes, que eram presidentes naquelas duas sequências, o ponto de partida é bem diferente. Quando Varandas diz que “o Sporting nunca será gerido de fora para dentro” está a colocar o foco no estímulo errado. O que importa neste momento não é se os adeptos acham que ele deve mudar de treinador, é se ele acredita que este treinador conseguirá dar a volta à questão. E se, mudando de treinador agora, isso lhe será suficiente para emendar os dois erros que cometeu no processo – a cláusula de rescisão de Amorim e a tirada arrogante a afirmar que João Pereira estava destinado a altos voos, que agora lhe retira espaço de recuo. E se a mudança virá a tempo de salvar os objetivos da equipa.
O Sporting joga no sábado com o Boavista. Quatro dias depois recebe o Santa Clara, para a Taça de Portugal. Mais quatro dias e vai a Barcelos defrontar o Gil Vicente. E depois terá uma semana para preparar a receção ao Benfica. Se o adversário ganhar os jogos que fará até lá, o Sporting enfrentará sempre o dérbi atrás na tabela. Mas se de caminho ganhar ao Boavista e ao Gil Vicente, estará a uma vitória nesse jogo de reassumir a liderança. Varandas pode querer dar à solução que escolheu mais tempo para provar a sua validade, mas é difícil imaginar João Pereira a atacar 2025 à frente do Sporting se não for como líder do campeonato. Porque ao contrário de 2010 e 2012, este Sporting joga para ser campeão. E, para ganhar, tal como os jogadores em campo, quem dirige o clube também precisa de o querer.
Essa mentalidade fraca de medo de perder é, na minha opinião, o que classifica a maioria dos falhanços internacionais de clubes e seleção Portuguesa. No Sporting destaca-se mais pelo fracasso de um treinador falhado. E já posso dizer isto, porque seria de esperar uma quebra, que poderia se traduzir num empate e uma derrota contra o Arsenal, ou em exibições menos conseguidas, mas 4 derrotas consecutivas? O Sporting de João pereira lembra o Sporting de Godinho Lopes, dos salários em atraso, em que "qualquer um" podia vencer o Sporting com enorme facilidade, o que tendo em conta que se trata de um grande plantel, de um clube vencedor, campeão, líder, é grave! Quando o Sporting começou a Liga dos Campeões, o playoff era o mínimo, era uma vitória até, mas após 10 pontos em 4 jogos, é uma derrota. Até fisicamente a equipa está fraca. Inácio lesiona-se de cada vez que calça as chuteiras, Quaresma demorou a recuperar (o choque acontece e não tem nada a ver), Bragança e Morita... João Pereira tem de sair porque estragou o trabalho de Amorim e tem falhado todos os jogos. E o pior...Aquele discurso da confiança...Que neste caso é só ridículo a lembrar os discursos de Muhammad Saeed Al-Sahhaf, o Ministro de Saddham Hussein que relatava a vitória do Iraque na guerra enquanto o exercito da NATO avançava a toda a força.
A pergunta que se coloca hoje. Os sportinguistas preferem ganhar logo e manter João Pereira ao comando, ou não ganhar e resolver já essa questão?!