O Sporting e Slimani no contexto
Em todas as janelas de mercado o nome de Slimani tem aparecido associado ao Sporting. O argelino faz sentido em Alvalade? Possivelmente, sim. E o salário dele? Definitivamente, não.
Islam Slimani voltou ontem a ser associado ao Sporting, seja envolvido no negócio que parece ir levar Tiago Tomás por empréstimo para o VfB Estugarda ou apenas porque o argelino pode ser a resposta à constatação de que falta um “homem de área” no plantel de Rúben Amorim – ou até uma alternativa a Paulinho ou alguém a somar a este naqueles momentos de aperto, em que o treinador manda avançar Coates para perto das redes adversárias. No mercado de transferências, cada caso tem as suas próprias particularidades, o seu próprio contexto – e se o facto de entrarem no domínio público pode por vezes conduzir ao fracasso de operações, neste caso parece ser evidente que os rumores se destinam a criar uma vaga de fundo de adeptos saudosos de Slimani, de forma que os leões não possam recuar. Contudo, há três aspetos que não devem ser ignorados: que o Sporting precisa, de facto, de mais um avançado; que Slimani até pode ser esse jogador; e que no modelo de Amorim o argelino nunca será primeira opção, pelo que tudo dependeria do custo.
Já todos ouvimos dizer que “Fulano até conseguiria vender congeladores a esquimós”. Esta é uma expressão idiomática que tanto pode servir para enfatizar que o tal Fulano é muito bom vendedor como que os esquimós em questão não sabem o que fazer ao dinheiro e o investem em bens que não lhes fazem assim tanta falta. E pode bem servir para contextualizar o tema de Slimani e a sua relação com o Sporting. O modelo de jogo de Rúben Amorim não contempla um jogador como Slimani, que era fundamental no modelo que quase levou a equipa de Jorge Jesus ao título de campeão em 2016. Não se trata de ser melhor ou pior jogador, de ser uma ideia melhor ou pior: são só coisas diferentes e o importante é que se adequem umas às outras, recursos humanos a princípios. Na equipa de Jesus, os sucessivos e devastadores ataques do argelino à profundidade, sobretudo pelos corredores laterais, levavam os adversários a precipitar-se no afundamento da última linha, aumentando o espaço entre essa linha defensiva e a de meio-campo – espaço esse que depois era aproveitado por Gutièrrez, Ruiz, Adrien Silva e João Mário para criar desequilíbrios. Além disso, Slimani era um finalizador extraordinário, forte na área. O argelino tem mais seis anos, terá perdido parte dos argumentos que levaram o Leicester City a pagar 31 milhões de euros por ele, mas ainda será esse finalizador temível – mais ou menos aquilo que Rúben Amorim pretende quando manda subir Coates nos últimos minutos dos jogos, em busca de um golo salvador.
Além disso, o modelo de Rúben Amorim também passa muito por favorecer os tais ataques à profundidade, ainda que em sucessivas combinações de contramovimentos. Isto é, quando um dos avançados busca a profundidade, o espaço nas costas da defensiva adversária, outro (ou outros) baixa em apoio, oferecendo-se como hipótese de ligação entre linhas e criando a dúvida a quem defende. Porque uma daquelas movimentações é pura manobra de diversão – a questão é saber qual e onde a bola vai entrar. Por isso, se há coisa que os avançados que podem ser titulares neste modelo têm de ter – Pedro Gonçalves, Paulinho, Sarabia, Nuno Santos, Jovane, Tabata, eventualmente Edwards, menos Tiago Tomás – é a capacidade para fazer as duas coisas. Isto é: têm se ser convincentes tanto no ataque à profundidade como nos movimentos de apoio e na presença entre linhas. Além de terem de ser fortes no último passe, na capacidade de dar bolas de golo. Pode parecer estranho, mas na ideia de Rúben Amorim, a capacidade de finalização é o menos importante quando se trata de avançados. Os golos surgem pela teoria dos grandes números: se tudo o resto funcionar, acabarão por aparecer. Daí que a presença na área, a capacidade para servir de recetáculo de cruzamentos, seja o menos importante para o Sporting quando se trata de recrutar atacantes. É um bocadinho como o congelador para os esquimós: pode dar jeito, se aparecer uma vaga de calor, se a equipa estiver a precisar de um golo perto do fim de um jogo, mas não é – nunca será – um bem de primeira necessidade.
Portanto, se a pergunta é “Slimani faz sentido neste plantel do Sporting?”, a resposta pode ser positiva. Para esses momentos de aperto, em vez de mandar subir Coates, o argelino seria a tal presença imponente a que a equipa poderia recorrer. Mas ele nunca seria parte do Plano A de Rúben Amorim, porque não tem a capacidade associativa que o levasse a ser ameaçador entre linhas ou a dar passes de golo – e não creio que de repente já haja assim tanta gente a pensar que afinal de contas o plano é mau. Assim sendo, há que ter em conta mais duas variáveis. Uma é se a presença pouco aproveitada de um jogador que ainda tem tanta moral junto dos adeptos pode contribuir para virar esses mesmos adeptos contra a equipa, o treinador, os dirigentes e acabar por funcionar como fator de desestabilização e desunião do grupo. Admitamos que não e que a estrutura leonina opta por aceitar o risco. A outra é se faz sentido pagar um salário elevado a um jogador de recurso, se faz sentido o esquimó gastar boa parte do seu orçamento familiar num congelador em vez de pensar no aquecimento da casa. E aqui é que está o ponto. É disso que tudo depende.
O António já falou nos riscos da transferência do Slimani no início da época e continua a ser o mesmo problema, salário muito alto, sistema táctico diferente do modo como joga o Sporting com Paulinho e será que aceitaria ser suplente e só entrar quando o Sporting procura-se desesperadamente o golo? A ideia de ter Slimani parece inteligente mas têm-se que avaliar a outra parte da moeda.
Tudo depende do salário. E da disponibilidade do jogador para ser segunda opção. Se for muito caro, não faz sentido ter dos jogadores mais bem pagos a aquecer o banco na maior parte das vezes. E se slimani chega com a expectativa de ser titular, ainda pior. Porque com certeza ele não sai de onde está por gostar de jogar pouco... Mas também concordo que é mais uma das ruidosas notícias deste período de mercado...