O poder do concreto
Vitória SC e Benfica apuraram-se para as meias-finais da Taça e, dias antes de se defrontarem, na Liga, mandam notícias acerca do que vale ser-se concreto se não se consegue ser brilhante.
Palavras: 1394. Tempo de leitura: 7 minutos
Arthur Cabral sorriu em cima dos três golos que marcou nos últimos três jogos do Benfica, ainda por cima três golos fundamentais, porque foram sempre os primeiros da equipa e não daqueles que valem pouco mais do que zero e que se somam a resultados já feitos. “Esse é o Cabral que ajuda a equipa”, disse no final, respondendo com satisfação à pergunta que já lhe tinha sido dirigida nesse sentido. A vitória dos encarnados em Vizela não foi brilhante, longe disso, mas teve os seus momentos concretos em cima dos quais a equipa pôde edificar a sua passagem às meias-finais da Taça de Portugal. Como a exibição de Cabral, aliás. Se o avançado ontem voltou a dar de canela na bola, por exemplo no lance do segundo golo, depois marcado na emenda por um João Mário que insiste em provar utilidade sempre que ela é questionada de fora para dentro, o Benfica continua a dar passos seguros que lhe permitem, ainda que à condição, ser líder da Liga, à frente de um Sporting que mete muito mais fogo de artifício nas suas exibições, e lhe permitirão ir defrontar os leões nas meias-finais da Taça de Portugal. O paradigma explica-se bem na recuperação dos últimos dérbis de Lisboa. Desde a final da Taça da Liga de 2022, que o Sporting ganhou de virada ao Benfica, fez dois anos no mês passado, as duas equipas defrontaram-se quatro vezes, com duas vitórias encarnadas e dois empates. No entanto, não só o Sporting saiu na frente em três desses jogos como esteve globalmente em vantagem por mais tempo (117 minutos contra 76) e estava mesmo a ganhar ao minuto 90 dos dois últimos confrontos, acabando por empatar um e perder o outro. Este poder do concreto pode, é óbvio, ser superado, e é também a maior arma de um Vitória SC que Álvaro Pacheco transformou numa esquadra imbatível no seu castelo desde que ali perdeu com o FC Porto, numa noite de Novembro em que os pós de perlimpimpim favoreceram as luvas de Diogo Costa e levaram os três pontos para o Dragão. São já sete vitórias seguidas em casa, no lote incluída uma frente ao Sporting, quase sempre com intervenção desses magos do concreto que são Jota e André Silva – ambos marcaram nos últimos três jogos no D. Afonso Henriques – montados em cima da produção turbinada de um meio-campo altamente complementar, como é o formado por Händel e Tiago Silva. Ontem, contra o Gil Vicente, o Vitória SC que Pacheco transformou numa máquina de somar pontos que já não se via de branco desde os anos 80 entrou a mil e depois sentou-se a ver o jogo. Geriu. Teve sorte, porque os gilistas não chegaram a reabrir a questão do resultado? Não, porque na verdade isso aconteceu no golo de Murilo, a reduzir para 2-1. Só que aí voltou a ver-se o poder cínico do concreto no momento em que Jota Silva voltou a alargar a distância, mesmo no último lance da primeira parte. A questão é que Vitória SC e Benfica se defrontam no domingo, num jogo fundamental para as aspirações dos dois. O Benfica precisa de ganhar para se manter na frente da Liga, o Vitória também para continuar a dar lastro a uma campanha que o viu reduzir bastante a diferença para os rivais minhotos do SC Braga. Frente a frente estarão duas equipas que são exemplos dessa frase-feita que nos diz que “o futebol são onze contra onze e no fim ganha a Alemanha”. A questão aqui é: qual delas?
Posso recandidatar-me? Posso, mas não quero. Aleksandr Çeferin surpreendeu quase toda a gente no Congresso da UEFA, em Paris, deixando correr a votação que acabou por aprovar a alteração estatutária que lhe tirará o primeiro meio mandato, quando foi chamado a substituir Michel Platini, permitindo-lhe concorrer em 2027 e prolongar a presidência até 2031, para depois dizer que “não planeia” recandidatar-se. Sendo verdade que qualquer um de nós faz, todos os dias, algumas coisas que não planeou fazer – e Çeferin não disse taxativamente que não vai recandidatar-se, só que não planeia fazê-lo... –, a forma como o presidente da UEFA justificou a ação mostra que ele se transformou num misto entre um frio jogador de póquer e uma criança ressentida. Por um lado, é o “bluffer” que deixa decorrer a votação só “para ver a verdadeira cara de algumas pessoas”. Por outro é um ego ferido com a traição do ex-aliado Zvonimir Boban e o seu “patético grito pela moralidade”. Com o escrutínio permanente dos jornais ingleses, alinhados com a sua própria federação na oposição a boa parte das ações do organismo europeu apesar de estarem na mesma trincheira a propósito da SuperLiga. Com os que, diz, quase o fazem parecer Kim-Jong-un, o ditador norte-coreano que não permite a mais pequena dissensão de pensamento. Çeferin pode até levar até ao fim a intenção de, em 2027, se retirar para perto da família, mas não é porque o tenham vencido. É porque ele quer. “Posso recandidatar-me?”, perguntou ele ao Congresso. “Pode, sim senhor”, responderam-lhe. “Pois, mas agora não quero”, atalhou.
Vem aí o Brozovic. Anda muita gente a dizer que o sorteio da Liga das Nações nos correu bem, porque não apanhámos Espanha, nem Itália, nem França, nem sequer os Países Baixos ou a Alemanha. Estão a ver mal, pois então. Nos cabeças-de-série, Portugal enfrentará a Croácia, a equipa de Brozovic, o temível centrocampista do Al-Nassr que o nosso selecionador, Roberto Martínez, escolheu como melhor do Mundo em 2023, quando foi chamado a votar para os prémios The Best. Depois, do Pote 3, chega a Polónia, que vai ainda lutar pela presença neste Europeu jogando os play-off – coisa a que Portugal até está habituado – e tem Lewandowski, um ponta-de-lança que se não está a marcar golos atualmente é porque há-de começar a fazê-los em breve. E por fim, do Pote 4, aparece-nos a Escócia, um ambiente temível em Hampden Park, onde ganhámos em 2018 com o Hélder Costa a camisola 10, mas que cresceu muito daí para cá, a ponto de até ter ganho um jogo à Espanha e de se ter apurado para a fase final do Europeu. E, sobretudo, a seleção da mulher e dos sogros de Martínez – e já se sabe que não se pode arranjar problemas com a família. Vai ser dureza, esta Liga das Nações.
Um adeus a João Oliveira Pinto. Primeiro era só João Pinto. Na década de 80, os jornais ainda davam muito destaque às competições de miúdos, com as crónicas do professor Sequerra e a cobertura exaustiva do Rui Santos, e a malta sabia tudo dos miúdos que aí vinham. E havia este João Pinto nos iniciados do Sporting que marcava golos às pazadas. Exagerava-se e logo se faziam comparações com os últimos fenómenos a saírem da fábrica de talentos que eram aqueles pelados entre o velho Estádio José Alvalade e a estação de metro. O Futre, o Litos... Depois, o rapaz chegou aos juniores e encontrou outro João Pinto, o do Boavista. Ainda por cima, havia um primeiro, já consagrado, o lateral do FC Porto e da seleção principal, só para aumentar a confusão. Nos juniores, a coisa resolveu-se com a introdução de um nome: o do Sporting passou a ser o João Oliveira Pinto, o do Boavista, que até veio a ser, dos dois, o único a jogar de facto pela equipa principal leonina, ficava o João Vieira Pinto. Os dois estiveram nas mesmas seleções jovens, foram campeões mundiais de sub20 juntos, em 1991. Nessa altura já o JVP estava no Atlético Madrid. O JOP vira a chama extinguir-se um pouco e, chegado a sénior, foi dispensado. Jogou no Atlético, no Vitória SC, no Estoril, no Gil Vicente, no SC Braga, no Farense, no Marítimo, na Académica, no Imortal, no Amora FC e no GD Sesimbra. Não foi o jogador que prometeu ser, mas foi jogador de I Divisão. Uma leucemia levou-o ontem, aos 52 anos. Foi o primeiro dos nossos 34 campeões mundiais de sub20 a deixar-nos. E para essas coisas é sempre cedo demais.