Muito Messi em dia de França
A França junta-se à Argentina na final do Mundial, mas fosse porque já o esperava ou porque está agora a despertar para a grandiosidade de Messi, a imprensa estende hoje panegíricos ao argentino.
Há muito Messi por tudo o que é jornal de hoje. Os grandes jornais montaram equipas para cobrir um Mundial com 32 seleções e, numa altura em que já só restam quatro, dividem as redações ao meio: metade focou-se no França-Marrocos de ontem, que permitiu aos gauleses qualificarem-se para a segunda final consecutiva e acabou com o sonho magrebino, a outra metade ficou a digerir o apuramento argentino da véspera. E estes não tinham muito mais para onde se virar a não ser para Messi e para aquele que pode ser o culminar de uma carreira internacional à qual, de facto, falta um título mundial. Os melhores textos acerca de Messi – e há alguns muito bons... – têm links para seguir na ponta final desta newsletter, mas aqui, no corpo principal, vou centrar-me na competição.
A crónica do França-Marrocos no L’Équipe é assinada por Vincent Duluc e chama a atenção para mais do que a possibilidade de os franceses virem a ser os primeiros bicampeões em duas edições consecutivas do Mundial desde o Brasil em 1958 e 1962: é que esta não é apenas a quarta final de França em 24 anos (aos títulos de 1998 e 2018 soma-se a final perdida em 2006), é também o jogo em que os franceses podem privar Messi a consagração. “Depois do falhanço do conceito de uma equipa construída a partir do ataque no Euro’2021, o Mundial é o modelo de construção de um grupo e de uma energia e de adaptação às circunstâncias”, sublinha Duluc, em elogio ao trabalho de Didier Deschamps. Aliás, páginas mais à frente, é a vez de Anthony Clément medir a dimensão do sucesso do selecionador francês, assinalando que ele pode ser o primeiro tricampeão mundial nas tarefas de jogador (1998) e treinador (2018 e, eventualmente, 2022).
A proeza francesa é também destacada por Bem Sphigel, que no The New York Times aponta o facto de a seleção gaulesa ter sido “a primeira a marcar presença em duas finais seguidas em mais de 20 anos”. Algo que já não sucedia desde que o Brasil esteve nas finais de 1994, 1998 e 2002. Na mesma edição do diário norte-americano, Rory Smith vê o jogo mais pela perspetiva dos marroquinos, que “deram tudo”, quando “a França exigia um pouco mais”. E foi também essa a abordagem de Jacob Steinberg no The Guardian. “Bastou uma pequena escorregadela. Aos cinco minutos, Raphael Varane saiu da defesa, em busca de opções, e levou a bola pela meia-direita, atraindo Jawad El Yamiq, tirando o defesa marroquino da sua posição e enganando-o ao fazê-lo pensar que conseguia extinguir o perigo”, vinca Steinberg, para depois explicar como o esquecimento de Griezmann foi fatal nesse lance para a equipa de Walid Regragui. “Num estádio cheio de adeptos seus, Marrocos via-se em território nada familiar: indo buscar a bola às suas próprias redes, em desvantagem pela primeira vez neste Mundial”, prossegue.
Quase toda a gente destaca o papel de Griezmann na vitória francesa. No Daily Telegraph, Oliver Brown considera mesmo que o médio esteve “no coração do brilhantismo francês”. “O coreógrafo, como sempre, foi Antoine Griezmann. A fábrica de peróxido da França. Até Emmanuel Macron, a supervisionar a cena aqui em Al Khor do seu poleiro VVIP, se esforçou para fazer justiça ao altruísmo da exibição que acabara de testemunhar”, escreve Brown, que ainda cita uma frase do presidente francês, que viu o jogo no estádio entre Gianni Infantino, presidente da FIFA, e Noël Le Graet, líder da Federação Francesa de Futebol. “Griezmann é muito generoso”, disse Macron. Mas não falta quem chame a atenção para a importância da entrada de Marcus Thuram: no seu habitual debrief, no L’Équipe, o ex-jogador e treinador Sabri Lamouchi considera-a mesmo “decisiva”. “Foi um ponto de viragem no jogo, como a defesa de Lloris antes do intervalo”, explica. E até o facto de Mbappé ter estado ligado aos dois golos, ambos nascidos de recargas a remates da figura mais mediática da equipa gaulesa, merece destaque. A esse propósito, o Telegraph aponta mesmo, pela pena de Tom Morgan, que o Mundial teve a final que a organização queria. Em artigo que inclui uma foto do instante em que Macron se cruzou com Nasser Al-Khelaifi, o catari que preside ao Paris Saint-Germain em nome do emir, mas que está também na organização da competição e no topo da cadeia beIN Sports, a detentora dos direitos televisivos, Morgan escreve que “Al-Khelaifi e os seus perceiros asseguraram um final que faz com que tudo valha a pena, com Mbappé e Messi, os dois maiores jogadores do Mundo, frente a frente. O facto de já estarem ambos na folha de pagamentos do estado do Qatar, no PSG, supera até os sonhos mais otimistas que o país terá tido quando lhe foi atribuída a organização do torneio, em 2012”.
Conversas de Bancada
A Ler:
Argentina tiene um himno contra sus fantasmas, por José Pablo Criales, no El País, responde a uma dúvida que me assalta desde o início do Mundial: que canção cantam os adeptos argentinos nas bancadas? Aqui está ela. A história vem no jornal.
Era Messi, era Mané, era Chaplin, por Juca Kfouri, na Folha de São Paulo, encontra na jogada “chapliniana” do terceiro golo da Argentina à Croácia traços de Mané Garrincha na forma como Messi bateu Gvardiol e como “Josko virou João”.
Sixteen years later, Messi’s story ends in the greatest game of all, por Sid Lowe, no The Guardian, explica a importância que a final de domingo terá na carreira de Lionel Messi, que é ironicamente apresentado como “um conhecido falhado a nível internacional”.
Even at 35, Messi finds new ways to prove he was always the greatest, por Sam Wallace, no Daily Telegraph, usa os argumentos de Kfouri e Lowe para glorificar Messi e pergunta por que razão Gvardiol não meteu o físico naquele lance. “Há uma aura especial em Messi”, defende.
“Messi mai così leader, Mbappé come Ronaldo. E chi va in vantaggio...”, é uma entrevista de Massimo Cecchini a Claudio Ranieri, na Gazzetta dello Sport, na qual o treinador italiano aponta os pontos fortes das duas seleções finalistas deste Mundial.
An essay on gratness, immortality and unburdened happiness, por Oliver Kay, no The Athletic, é mais um panegírico ao capitão argentino, tentando definir o que ele pode vir a alcançar e relacioná-lo com a sua personalidade menos excessiva do que a de outras estrelas.
Les lionnes du Maroc, por Hervé Penot, no L’Équipe, é uma reportagem com as apoiantes femininas que tão importante têm sido na carreira da equipa de Marrocos neste Mundial.
La fête des copains, por Théo Troude, no L’Équipe, também é uma reportagem, mas em torno da forma como franceses e marroquinos viram o jogo em Paris, em clima quase fraternal e sem incidentes.
Keeping the national in national team coach, por Rory Smith, no The New York Times, parte da campanha para a nomeação de Fernando Diniz para a seleção do Brasil para avaliar se os selecionadores devem ser da nacionalidade das suas seleções.
El fútbol es libre, no totalitário, por Philipp Lahm, no El País, faz a transição do Mundial do Qatar totalitário para o Europeu de 2026, a “celebrar a democracia”, na Alemanha, e deixa a crítica às instâncias que mandam no futebol mundial.
The Qatar World Cup is peak sportswashing. But will it work?, por Spencer Bokat-Lindell, no The New York Times, analisa os pros e os contras da operação de lavagem de imagem através do desporto por parte do Qatar neste Mundial.
A ver:
Hoje não há jogos