“Estão mortos”
Messi e Ronaldo não estão mortos. Pelo contrário: continuam a disputar a atualidade. Ontem o argentino foi figura na derrota da sua seleção contra a Arábia Saudita e o português ficou sem clube.
“Estão mortos!” Foi com estas palavras que Lionel Messi descreveu, na zona mista, depois da derrota com a Arábia Saudita, o estado de espírito que tinha visto dentro do balneário aos seus companheiros de seleção. Ali, na ressurreição, tinha de começar a reação – e é isso que nos conta o artigo de Nahuel Lanzillotta, no Clarín, a descrever o que foram as horas seguintes ao desaire dentro do “bunker” argentino: longo discurso motivacional de Lionel Scaloni e um jantar opcional, para que cada um pudesse fazer a catarse conforme achasse melhor. Havia que lidar com a crítica, que foi mais ou menos universal. Mario Kempes, campeão do Mundo em 1978, disse na ESPN que os jogadores tinham sido arrogantes, “muy cancheritos”, como lhes chamou, considerando que tinham menosprezado o rival.
O desastre, que Jonathan Liew considerou no The Guardian um “abalo sísmico”, teve algo de tático – e essa explicação está bem patente num trabalho de Vicente Muglia na edição de hoje do diário Olé: “a estratégia defensiva da Arábia Saudita levou a seleção a jogar de uma forma em que não se sente cómoda”, explica o analista, num artigo em que recorre a imagens para demonstrar o posicionamento alto do bloco defensivo saudita e a falta de alternativas à frente da bola por parte dos argentinos. Scaloni, no entanto, centrou-se mais no VAR e nas decisões que levaram à anulação de três golos à Argentina ainda durante a primeira parte. “Isto decidiu-se por milímetros. Aceitamo-lo. Mas se tivéssemos marcado o 2-0 muita coisa mudaria”, explica o selecionador argentino, por exemplo, ao L´Équipe, em afirmação inserida na crónica de jogo assinada por José Barroso. Isso, no entanto, levou Adrián Maladesky a referir, no Clarín, a “pouca autocrítica” do selecionador, considerando errado que ele tenha optado por basear a sua análise no novo sistema de avaliação dos foras-de-jogo. “A análise de Scaloni pareceu também semi-automática”, escreve.
Claro que há sempre o outro lado do jogo, o dos vencedores. E o herói do dia foi, sem qualquer dúvida, Hervé Renard, o treinador francês que liderou a Arábia Saudita na vitória. Nick Ames conta, no The Guardian, o percurso do técnico pelo futebol africano e até a sua passagem pelo Cambdrige United, na sombra de Claude Le Roy, o compatriota que é o seu mentor. Vale a pena ler. Como vale a pena ler o artigo do L’Équipe que conta a troca de mensagens entre os dois depois de finalizado o jogo – e cujo link está nos onze que selecionei para este dia, mais abaixo nestas Entrelinhas. A verdade é que o jogo da Argentina condicionou o resto do dia, como que entorpecendo as equipas de Dinamarca, Tunísia, México e Polónia, que nem saíram do 0-0 nos dois jogos da tarde. Antes da vitória da França sobre a Austrália, muito bem explicada neste artigo de Barney Ronay no The Guardian, ou neste outro, de Vincent Garcia, no L’Équipe, ambos muito centrados na ação de Mbappé, houve espaço para mais dois temas. O da braçadeira. E Ronaldo.
Tom Morgan deu conta, na edição de hoje do Telegraph, que “a Alemanha ameaça processar a FIFA” a propósito da proibição de usar a braçadeira One Love, partindo de declarações de Steffen Simon, diretor de comunicação da Federação Alemã. É um tema que os ingleses não vão deixar cair – e como lhes doerá se mais logo levarem uma lição de moral dos alemães. A acompanhar até ao início do Alemanha-Japão, um dos jogos de hoje. Tal como não deixarão cair nos tempos mais próximos a questão Ronaldo. Ontem, o Manchester United e o próprio jogador divulgaram comunicados revelando que está rescindido por mútuo acordo o contrato entre as partes. E agora? No Telegraph, Jeremy Wilson considera que o caso está a ser uma “distração indesejada para um dos favoritos deste Mundial”. O The Guardian opta por colocar o tema fora das páginas do Mundial: escreve Jonathan Wilson que o maior erro do United foi ter voltado a contratar o jogador português. E Andrea di Caro, subdiretor da Gazzetta dello Sport, começa já a fazer as contas ao futuro do futebolista, escrevendo acerca de uma “última dança entre a Arábia e o orgulho”. Um pouco no sentido do que eu próprio disse ontem, no espaço do Mundial das 18h, na RTP3. E isso, se quiserem ver, creio que terão de recorrer à vossa box.
Conversas de Bancada
A Ler:
What’s in the water in Brampton?, por James Wagner, no The New York Times, que parte da constatação de que sete dos jogadores da seleção do Canadá nasceram ou foram criados no mesmo subúrbio de Toronto para perceber o que está a ser bem feito.
Ils n’ont Dieu que pour lui, por Vincent Villa, no L’Équipe, reportagem em Zadar e Zapresic, na Croácia, para ajudar a entender a paixão que os adeptos no país têm por Luka Modric, em dia de estreia da seleção.
Renard, derrière le cliché, por Hervé Penot, no L’Équipe, partindo da forma como Hervé Renard viveu as horas posteriores à vitória da Arábia Saudita sobre a Argentina, para chegar à relação que tem com Claude Le Roy.
Che dura battere Maradona, por Sebastiano Vernazza, na Gazzetta dello Sport, sem link na edição online, fazendo uma comparação entre o percurso de Maradona em quatro Mundiais e os cinco já disputados por Leo Messi.
Ramón Díaz y su papel clave em la derrota de Argentina, por Maximiliano Benozzi, no Clarín, explicando que nove dos onze titulares da Arábia Saudita que ontem venceram a Argentina jogam no Al Hilal comandado pelo treinador argentino.
Eastern Europe was the crucible of modern football. Now it’s a wasteland, por Jonathan Wilson, no The New York Times, acerca da raiz inovadora do futebol na Europa de Leste e da pobreza tática vivida hoje na região.
È tempo di Serie A, por Matteo dalla Vite, na Gazzetta dello Sport, revelando que as indicações dadas às equipas de arbitragem neste Mundial e que têm prolongado os descontos vão alargar-se à Serie A já em Janeiro, mas que já se pensa na adoção do tempo útil.
I went to four games in one day but still missed greatest upset of all time, por Thom Gibbs, no Daily Telegraph, descrevendo a experiência que este Mundial compactado permite aos jornalistas e aos adeptos.
La sórdida ciudad de las caravanas del Mundial, por Francisco Cabezas, no El Mundo, uma reportagem nos parques de caravanas com poucas condições, disponibilizados a preços altos pela organização do Mundial a quem não tem possibilidade de pagar um quarto de hotel.
A Doha, “prendre l’avion le matin pour assister à um match de la Coupe du Monde puis repartir, c’est une bonne chose”, por Julien Lecot, no Libération, fazendo as contas à pegada ecológica deste Mundial em função do tráfego aéreo a ele associado.
A star is born as Bellingham bursts on the scene to raise England’s level, por Jacob Steinberg, no The Guardian, explicando a influência do médio do Borussia Dortmund no crescimento da seleção inglesa neste Mundial.
A Ouvir
Os argentinos ainda não assimilaram o que lhes aconteceu ontem e é uma pena não se poder ouvir em podcast as explicações de Jorge Valdano ou do espanhol Iker Casillas, que estão no Mundial ao serviço da TV Azteca, do México. Quem quiser pode procurar no YouTube, que há por lá extratos da narração e dos comentários em direto em perfis, digamos assim, piratas. Vale a pena, ainda assim, seguir o La Primera Jugada, podcast matinal da produtora Torneos e do diário Olé , que já lançou dois episódios desde que os argentinos perderam com a Arábia Saudita – há que contar aqui com a diferença horária. Logo após o jogo de ontem, Emiliano Pinsón fez uma análise fria ao que faltou à equipa de Lionel Scaloni no jogo de estreia. E hoje de manhã já começou a antecipar o que poderá mudar para o jogo com o México, prevendo, por exemplo, as entradas de Lisandro Martínez e Enzo Fernández no onze titular e admitindo até que Acuña e Julian Alvarez possam também aparecer.
A ver
Marrocos-Croácia, 10h, Sport TV1
Alemanha-Japão, 13h, RTP1 e Sport TV1
Espanha-Costa Rica, 16h, SIC e Sport TV1
Bélgica-Canadá, 19h, Sport TV1