Como a Espanha venceu a crise
Há meses, os espanhóis arrancavam os cabelos para entender porque é que as suas equipas tinham deixado de ser competitivas. Agora já colocaram duas – e podem ser três – nas meias-finais da Champions.
Comecemos por regressar a Setembro, à primeira jornada da fase de grupos da Liga dos Campeões. O FC Barcelona perdeu em casa com o Bayern Munique por 3-0, o Atlético Madrid não foi além de um empate caseiro com o FC Porto, o mesmo sucedendo ao Sevilha FC na receção ao RB Salzburgo e ao Villarreal CF quando a Atalanta visitou a cidadezita de 50 mil habitantes que lhe serve de sede. Dos cinco representantes espanhóis – os quatro primeiros da Liga anterior mais o Submarino Amarelo, na condição de vencedor da Liga Europa – só o Real Madrid venceu, batendo o Inter em Milão, por 1-0. Mas até os merengues perderam na segunda jornada, escandalosamente, no Bernabéu, contra os moldavos do Sheriff. Ao fim dos primeiros dez jogos na Champions, os espanhóis somavam duas vitórias – o Atlético bateu o Milan no segundo jogo... – quatro empates e quatro derrotas. Crise!? Eles achavam que sim, mas afinal parece que não. A Espanha já colocou duas equipas nas meias-finais da mais forte competição de clubes do futebol mundial e pode até qualificar uma terceira, caso o Atlético consiga hoje anular o golo de desvantagem que traz de Manchester, após a primeira mão com o City.
No início da época falámos – todos – de muita coisa. De um futebol que não sabia renovar-se, da fuga do capital para Inglaterra, do défice físico evidente das equipas espanholas quando comparadas com as inglesas ou as alemãs. Mas, quando as coisas se definem, que é sempre no início da Primavera, os espanhóis lá estão. Pela sexta vez nos últimos dez anos, Espanha mete duas equipas nas meias-finais da Champions – foi, ainda assim, a primeira vez que o conseguiu desde 2017, o que pode prenunciar alguma espécie de retoma. Além disso, caso o Atlético de Simeone hoje leve a melhor sobre o City de Guardiola, Espanha pode igualar um feito que já ninguém consegue desde que os ingleses colocaram o Chelsea, o Manchester United e o Arsenal nas meias-finais de 2009. Aliás, os ingleses fizeram-no durante três anos seguidos, de 2006 a 2009 sempre com três equipas nas quatro mais resistentes do futebol europeu. A Itália também o fez, em 2003. A própria Espanha o tinha feito, em 2000. Mas se o que se quer é perceber uma tendência dominante, os últimos anos não a deixavam ver assim com tanta clareza.
Como é que os espanhóis o conseguem, então? Melhores treinadores? Dificilmente. O futebol de Simeone é rejeitado por tudo o que é catedrático – ainda que tenha sido com um simulacro do mesmo tipo de jogo, com toda a gente atrás da linha da bola, em 30 metros, à espera de um par de contra-ataques, que o Villarreal CF de Emery eliminou ontem a máquina do Bayern Munique. O próprio Emery, não se cansam de dizer os puristas, fracassou no Arsenal e no Paris Saint-Germain – mas quem é que não fracassa nesses dois clubes? Ancelotti, o treinador que ontem foi tirado do jogo pelo audacioso plano tático de Thomas Tuchel, já estava fora de prazo e do círculo dos técnicos de topo quando foi recuperado por um Florentino Pérez tão desesperado por alternativas como estava ontem o próprio treinador italiano, no momento em que abdicou de Kroos e Casemiro para meter em jogo as pernas frescas e a cabeça menos complicada de Camavinga e Rodrygo. Os espanhóis não têm melhores treinadores do que os ingleses, os italianos ou os alemães. Terão, eventualmente, treinadores mais habilitados pelo meio ambiente para utilizarem os recursos que os jogos pedem, mesmo quando eles não são os mais populares. O que sucederia a Diego Simeone se fosse trabalhar assim para a Premier League?
Têm melhores jogadores? A sério que admitimos essa possibilidade quando o Villarreal CF está na meia-final da Liga dos Campeões com uma espécie de misto entre as equipas B do Tottenham e do Watford FC? Lo Celso está em Espanha emprestado pelo Tottenham. Foyth passou três anos sem contar nos Spurs. Estupiñan entrou no futebol europeu através dos sub21 do Watford FC, mas não convenceu. Capoue tem dois anos de Tottenham e cinco de Watford FC. Danjuma foi recrutado no Championship, depois de ter fracassado na Premier League e ter descido de divisão no AFC Bournemouth. Coquelin nunca conseguiu afirmar-se durante anos nas categorias jovens do Arsenal. Seis dos onze titulares ontem utilizados por Emery frente ao Bayern Munique são rejeitados do futebol inglês – e no último minuto ainda entrou mais um, o francês Aurier, que também deixou de servir ao Tottenham. E, mesmo sem entrar em aproveitamento de restos – que o estatuto não lho permite – o próprio Real Madrid tem a equipa cheia de jogadores que estariam ao alcance de qualquer clube das Big Five, assim neles tivessem querido apostar. Rodrygo e Vinicius Jr., por exemplo, chegaram do Brasil para a equipa B, a mesma que serviu ao Villarreal CF de “choco” a Chukwueze, o autor do golo decisivo em Munique, a permitir ao pequeno clube espanhol atingir a segunda meia-final da Champions na sua história.
O que há em Espanha, por comparação com Inglaterra, é mais persistência e menos vício de mercado. Ricos, sem saber o que fazer com a receita da televisão ou com os milhões injetados pelos seus poderosos donos da bola, muitos clubes ingleses compram o passe de um jogador e se, em dois meses, ele não se transformou no Messi ou no Ronaldo, já estão doidos a ver se encontram outro. Claro que há exemplos de sucesso mesmo no meio de tanto desperdício – o Liverpool FC, o Manchester City e o Chelsea têm tido alguma cabeça na gestão de ativos ou, em contrapartida, têm tantos ativos que atingem o sucesso, mesmo deitando muitos ao lixo. Sempre que ouvirem dizer que o dinheiro não compra títulos, é nisto que devem pensar. O dinheiro ajuda muito – e é por isso que na estrutura atual da competição não é possível a uma equipa fora das Big Five ganhar a Champions. Mas a partir de um determinado patamar, ter um plano ajuda muito mais. Só assim os espanhóis ganham, mesmo quando não são os mais fortes, ajudando-nos a todos a recordar que, afinal, o futebol ainda é um jogo.
Não posso estar mais de acordo, em fases a eliminar o dinheiro conta menos que por exemplo na fase de grupos em que mesmo que haja um jogo ou outro que corra mal ainda dá para enmendar. Tendo um bom grupo e uma boa estratégia os mais pequenos também podem chegar lá e é por isso que o Futebol é espectacular, temos um bom exemplo no Brasil com o nosso Abel, sempre outsider nos últimos 2 anos da Libertadores porque não tinha de longe o melhor plantel mas ganhou as 2.
Claro que é muito difícil fazer o que fez o Villareal ontem mas eles provaram que é possível de vez em quando fazer uma gracinha, há que dar mérito a esta equipa e ao treinador.
Por acaso outro dia dei por mim a pensar na equipa do submarino amarelo e no facto de grande quantidade daqueles jogadores serem "reciclados" o lo Celso é um jogador brilhante que eles aproveitaram mas que a outros não servia..... Já dizia o wenger que quando queria contratar ia sempre ver as listas de dispensados do real, Barcelona, Juventus e por aí adiante....