A permissividade do Benfica
O Benfica sofre mais golos. É porque defende pior? Porque desaprendeu as artes da contra-pressão? Lamento desapontar-vos, mas os números dizem que não. É porque ataca pior, isso sim.
Há um número que se impõe quando se analisa a performance defensiva do Benfica nesta época: os sete golos sofridos em oito jogos de campeonato. Não que ele seja catastrófico em comparação com o dos outros candidatos, porque o Sporting também já deixou entrar sete, o FC Porto tem seis e o SC Braga vai em 14. Mas é assustador se o compararmos com os números do Benfica que foi campeão na época passada, com apenas 20 golos sofridos em 34 jogos. Projetando o parcial atual para todo um campeonato, vemos que o Benfica terminaria a Liga com algo como 29 ou 30 golos sofridos – e não há um campeão defensivamente tão simpático desde 2019, a época em que o Benfica de Bruno Lage se impôs sofrendo 31 golos mas, em contrapartida, sendo também a última equipa da nossa Liga a ultrapassar os 100 nas balizas adversárias no total das 34 jornadas. Os sinais de alarme na Luz chegam um pouco por comparação com o início da época passada, em que tanto se falou de Gegenpressing e em reação à perda para definir o Benfica de Roger Schmidt. À oitava jornada da época passada o Benfica tinha sofrido apenas três golos e, tal como agora, esse número estava em consonância com o xG – o índice de golos esperados – que permitira aos adversários. Aliás, esta época, o Benfica até está a dever à boa performance dos três guarda-redes que já utilizou e à aselhice dos finalizadores adversários mais dois golos, pois permitiu um xG total de 8,8 aos opositores, quando nas primeiras oito jornadas de 2022/23, é certo que protegido pelo calendário que lhe evitou os confrontos com os quatro primeiros até à décima jornada, tinha um xG de 2,8 permitido aos adversários. Conclui-se, portanto, de forma mais ou menos consensual, que o Benfica está mais permeável. O que já não é objeto de qualquer espécie de consenso são as razões dessa permeabilidade. Porque há demasiada gente a centrar-se na saída de Gonçalo Ramos e na diminuição da capacidade do Benfica para pressionar alto, como se a pressão alta fosse definida pelo comportamento de um jogador. Sempre disse que, sendo muito eficaz em reação à perda, pela concentração de muita gente na zona da bola quando estava a atacar, o Benfica de Schmidt não era tão forte assim na organização da pressão alta. Foi sempre uma equipa mais forte em transição do que em organização defensiva, porque neste momento já lhe era pedido que cobrisse toda a largura e profundidade do campo sem ter tanto controlo da zona da batalha. E os números negam a tal atitude menos agressiva do Benfica deste ano nos momentos sem bola. Por exemplo, consultando a base de dados da Opta Sports verifica-se que este Benfica está com uma média de 20,6 tentativas de desarme por jogo, contra os 19,4 com que fechou a Liga anterior. Melhorou, portanto. Destas, 3,4 são no terço atacante do campo – na época passada eram 3,3. Portanto, esqueçam lá essa ideia segundo a qual o Benfica defende pior porque deixou de ter Ramos. Ramos trazia muita coisa a esta equipa, mas essa não era, de todo, a mais importante. O futebol é mais complexo do que nos querem fazer crer estas abordagens mais imediatistas. Por exemplo: já pensaram que se o Benfica até tem mais tentativas de desarme esta época isso se deve ao facto de passar mais tempo sem a bola? É que quando uma equipa tem a bola não precisa de ir correr atrás dela... O que o Benfica regista, sim, é um aumento significativo nas perdas de bola, de 17,3 por jogo na Liga passada para 19,1 nas primeiras oito jornadas de 2023/24. E querem adivinhar em que zona do campo a coisa piorou? Não foi no último terço nem no terço defensivo. Foi, sim, na zona média (de 31,4% de perdas aí para 32,6%), deixando o Benfica mais à mercê do veneno que servia aos adversários, a contra-pressão. A reação à perda tem condições para ser tanto mais eficaz quanto mais à frente se dá, porque mais atrás as equipas ainda estão forçadas a fazer o chamado “campo grande”, estão mais abertas. E se este Benfica de 2023/24 está ainda longe da afinação da equipa campeã nacional – não tão longe como se podia pressupor em função de um calendário que foi esta época mais complicado de início – é preciso ter a noção de que isso não se deve a uma menor capacidade do seu jogo sem bola mas sim a uma pior qualidade da sua posse.
O que é que se passou aqui? Ainda não consigo entender bem o que se passou na questão Otávio-Diomande. A história é simples. O marfinense foi eleito o melhor defesa do mês de Setembro e o brasileiro, que ficou em segundo na votação, apareceu a comentar a publicação de Instagram da Liga onde era feito o anúncio com um jocoso “Estou jogando basquete?”, seguido de quatro emojis com gargalhadas. O assunto, que imediatamente, mesmo sendo o Instagram a mais saudável das redes sociais, levou centenas de adeptos à boçalidade absoluta e à necessidade de tomar partido através do insulto ou do apoio incondicional ao defesa-central do FC Famalicão – que o Mundo de hoje não está cá para posições equilibradas –, começou por me fazer ponderar se a reação não viria de uma conta falsa. Não vinha, como se percebe pelo selo azul que o Instagram vende aos interessados para que se evitem episódios de usurpação de perfis de figuras públicas. Só aí é que me passou pela cabeça uma ideia meio maluca. Mas afinal não é isto que estamos sempre a reclamar? Uma opinião sem amarras... Se Otávio entende que foi injustiçado, pois então diz que acha que foi injustiçado. Mas um futebol que aceita e até subscreve massivamente narrativas que todos os anos defendem que classificações absolutamente objetivas, como as do vencedor da Liga, são manipuladas por interesses obscuros, já descobre uma falta de respeito inaceitável quando um jogador que ficou em segundo lugar numa votação que é subjetiva ironiza com a situação e deixa claro que achava que devia ter ganho. É provável que a esta hora os responsáveis pelo FC Famalicão já estejam a explicar a Otávio que esse não é o caminho, que se venha a descobrir que afinal o telemóvel do jogador tinha sido convenientemente roubado e que, numa próxima vez que perder uma votação ou um jogo, ele diga que “agora é levantar a cabeça”. Ficamos todos bem mais tranquilos quando isso acontece. Mas infelizmente, neste Mundo feito de radicalismos e de consumo imediato do direito à indignação, a realidade é que este incidente fez mais pela divulgação de que há um Otávio a jogar no FC Famalicão do que todas as boas exibições que ele assinou em Setembro e que nos dão a certeza de que ele é um dos melhores esquerdinos a preencher a posição na Liga portuguesa.
A complexidade de Sousa. Paulo Sousa já não é o treinador da Salernitana. A aventura acabou com uma derrota por 3-0 em Monza contra a mesma equipa à qual ele arrancara a primeira vitória, em Fevereiro – e pelo mesmo resultado. Se os 21 pontos que fez nos últimos 16 jogos da Serie A de 2022/23 levaram a uma pontuação histórica e à permanência da equipa do tacão da bota italiana, os três com que fechou as primeiras nove jornadas de 2023/24 ditaram-lhe o afastamento. Os resultados acabam por decidir tudo, mas seria redutor encarar a situação a olhar apenas para eles. A crise da Salernitana explica-se com a falta de opções do plantel, com o facto de algumas dessas opções – o senegalês Dia, por exemplo – estarem ali contra as suas vontades mas também com a complexidade da personalidade do treinador português. O Paulo Sousa treinador é naturalmente a evolução do que era o Paulo Sousa jogador – e lembro sempre um episódio, durante o estágio em Macau que antecedeu o Mundial de 2002, quando a equipa teve um dia de folga e Sousa foi o único dos seus integrantes que optou por ficar a descansar no hotel em vez de ir passear pela cidade ou até dar um salto a Hong Kong. Por ser um treinador mais tático e menos empático, Sousa terá mais dificuldades em ambientes onde a dimensão relacional do trabalho se torne mais importante. E talvez seja eu que estou a ver as coisas condicionado, mas a ideia com que fiquei da derrota em Monza foi a de que havia ali gente a esfarrapar-se em campo, quem sabe se para salvar o treinador, que sabia que seria demitido se perdesse, da mesma forma que havia gente que parecia que tinha ido passear ao relvado.
Deschamps contra 2030. Depois de Gareth Southgate, o selecionador de Inglaterra, ontem foi a vez de Didier Deschamps, responsável pela França, também se manifestar contra a solução da FIFA para o Mundial de 2030. “Gosto que as coisas sejam mais coerentes”, disse o campeão do Mundo de 2018, centrando-se nas dificuldades logísticas e fisiológicas que terão as equipas forçadas a ir jogar com o Uruguai, a Argentina e o Paraguai à América do Sul, antes de voltarem para fazer mais dois jogos no hemisfério norte, bem como na situação de desvantagem em que ficarão face aos outros integrantes dos grupos em que forem incluídas – e se à partida isso não é coisa que nos afete, porque na qualidade de co-organizador, Portugal será um dos cabeças-de-série e nunca calhará num desses grupos, o facto de só haver seis posições por atribuir no Pote 1 pode deixar muito boa gente em apuros. Ora, a verdade é que Southgate e Deschamps têm razão. Ainda ontem, com a atribuição dos Europeus de 2028 a Inglaterra, Escócia, Gales, Irlanda do Norte e República da Irlanda e de 2032 a Itália e Turquia, se viu que isto de organizar grandes eventos deixou de ser coisa para um país só. O Europeu de 2024 na Alemanha será certamente o último do seu género até à tão ansiada (pela FIFA) organização de 2034 na Arábia Saudita. E é pena. Chamem-me tradicionalista se quiserem, mas começo a achar que isto está a assumir proporções desmedidas e que com isso se perderá o charme da participação.
Comparasse o Benfica de agora, com resultados da época passada, mas o Benfica está a jogar com meia equipa diferente e o sistema de jogo não é o mesmo.
Importa saber como melhorar o jogo, que para mim a falha está no meio campo e isso foi evidente na segunda parte do jogo com o Inter e encontrar o jogo mais eficaz para este plantel.
Para mim o Alemão não encontrou e está a falhwr nesse ponto