A lição de Veríssimo
Nélson Veríssimo assumiu que era treinador de conjuntura e que só podia ter sucesso renegando a ideia dominadora que deve ser a do Benfica. Essa é a lição que deixará a quem manda no clube.
Não estou mais convencido hoje do que estava há quatro meses de que Nélson Veríssimo poderia ser solução para o comando da equipa técnica do Benfica. Aliás, apesar da vitória dos encarnados em Alvalade ou do sucesso que foi a eliminatória europeia com o Ajax, a verdade é que o treinador-interino igualou no domingo o total de jogos de Jorge Jesus nesta Liga (15) fazendo menos sete pontos. E permitindo que a desvantagem para os leões crescesse em dois pontos – de quatro para seis – ou que o atraso para o FC Porto praticamente quadruplicasse – de quatro para 15 pontos. Veríssimo provou na equipa principal que é um razoável treinador de conjuntura, mas não conseguiu – nem poderia, porque nunca lhe deram essa possibilidade – confirmar aquilo que o seu êxito na equipa B até prenunciava: que podia ser o líder de que o Benfica precisa para mudar o paradigma estrutural de insucesso que lhe tem marcado os últimos cinco anos. No entanto, deixou a quem manda uma importante lição, que nasce da constatação do que vale este grupo de jogadores.
No final do Sporting-Benfica, ganho tática e estrategicamente com mais descaramento de ir contra o pensamento dominante do “benfiquismo” do que com brilhantismo realista, há uma frase de Veríssimo que é marcante para entender o que é o Benfica. Ou, melhor, como disse o treinador, o que é “esta equipa” do Benfica. “Esta equipa percebeu que, contra equipas do grau de dificuldade do Ajax, do Liverpool e do Sporting, tem de ter capacidade para defender mais. Assumimos isso sem problema nenhum”, afirmou, numa tirada que só a “embriaguez” da vitória impediu que fosse encarada como uma menorização imperdoável face ao eterno rival. “Enquanto treinadores, temos de reconhecer quais são as capacidades da nossa equipa, o que é que os nossos jogadores naquele momento são capazes de fazer”, disse mais à frente, deixando subentendido aquilo que eu já defendo desde o início da época passada e que o acréscimo de qualidade desta temporada, no plano ofensivo, acabou por não mascarar totalmente ou de forma duradoura. Este plantel tem debilidades defensivas que o levam a casar mal com a ideia de jogo dominador e subido no campo que Jorge Jesus professava. Foi por isso que os desafios que mais felicidade trouxeram aos benfiquistas foram marcadamente defensivos, sempre baixos no campo e com menos bola do que os adversários, como a resistência com dez em Eindhoven (29 por cento de posse) ou as vitórias em Amesterdão (33 por cento) e Alvalade (40 por cento).
Dir-me-ão que isto não é o Benfica, que o Benfica tem de ser dominador. E em tese concordo. Em 90 por cento dos jogos que faz numa época é isso que se exige à equipa e, por isso, quem vier em Julho tem de partir desse pressuposto. E não é quando montar a equipa para cada jogo. É quando fizer o plantel. Veríssimo, contudo, não estava nesse papel. E, da mesma forma que o facto de ter ganho em Alvalade ou em Amesterdão não prova que ele seria o homem certo para isso, a maneira como ganhou não o torna incompatível com aquilo de que o Benfica precisa. “Sei desde o início o que vai acontecer”, disse o técnico após o 2-0 em Alvalade, em resposta a um jornalista que lhe perguntou se este resultado não podia servir de base para ele poder ficar no cargo na nova época. A verdade é que, a ele, não lhe pediram que montasse a equipa, que fizesse a coisa como ela deve ser feita – primeiro a ideia, depois a composição do grupo de forma a poder servi-la. Que começasse já na primeira metade do ano de 2022 a construior a base para a equipa de 2022/23. O que lhe pediram, sim, foi que safasse a conjuntura, que se mantivesse vivo na Europa e na Liga durante o máximo de tempo possível, enquanto quem tem capacidade para pensar resolve o que vai ser a equipa da próxima época. A ação do treinador-interino centrou-se sempre mais na segunda parte da expressão. No “interino”. Veríssimo foi treinador de conjuntura e não de estrutura, por mais que agora os jornais sejam inundados por notícias segundo as quais o Benfica quer que ele passe a integrar a “estrutura” para 2022/23.
E foi isso, em rigor, que Veríssimo foi fazendo. Geriu uma conjuntura. Chegou aos quartos-de-final da Liga dos Campeões, igualando o máximo histórico do clube no século XXI, e mantém-se na luta pelo segundo lugar, ainda que com ele aos comandos a missão se tenha complicado e dependa agora de uma crise de identidade do Sporting: além de ter de ganhar os seus jogos, o Benfica precisa ainda que os leões percam sete dos 12 pontos que lhe faltam disputar. A muito falada mas ainda não oficialmente confirmada chegada de Roger Schmidt (pode ficar a conhecê-lo melhor aqui) é mais uma tentativa do Benfica recuperar a hegemonia que chegou a ter no passado recente, mas é importante que no clube compreendam que o sucesso na tarefa passa por casar o grupo com a ideia, como defendi aqui. Passa por começar do zero e, provavelmente, mudar radicalmente o grupo atual de jogadores, construindo-o a partir da tal ideia e abdicando de vacas sagradas que a ela não se adequem. Porque enquanto o clube persistir na vitimização com arbitragens, Covids ou que quer que seja e não mostrar a coragem política de interiorizar aquilo que Veríssimo assumiu antes dos jogos com o Ajax, o Liverpool ou o Sporting, não entenderá como é que passou de cinco anos com 11 dos 20 títulos nacionais em disputa (quatro Ligas, duas Taças de Portugal, três Taças da Liga e duas Supertaças entre 2012 e 2017) para outros cinco com três troféus (uma Liga e duas Supertaças de 2017 a 2022). Ou como é que em Agosto assinalará três anos completos sem ganhar nada e precisa de vencer a próxima Taça da Liga para evitar superar o jejum de três anos e sete meses sem troféus que viveu entre a Supertaça de Agosto de 2005 e a Taça da Liga de Março de 2009.
O Benfica precisa claramente de 2/3 anos para voltar a ser campeão! Quem vier nunca poderá ser para menos de 2/3 anos … o projeto terá de ser renovado e acima de tudo terá de ser moldado por estrutura e treinador … neste momento não existe projeto no Benfica ! As pessoas tem de perceber que estruturalmente o Benfica está de rastos … há que contratar urgentemente pessoas competentes , renovar o plantel e contratar um treinador com uma ideia compatível com o projeto … depois e dar tempo ao tempo , só assim poderemos ser novamente competitivos !
Olá António Tadeia, boa tarde. Acabo de ler o Último Passe e vou ouvir agora o Futebol de Verdade, portanto não sei se falou deste assunto. No entanto, gostava de ouvir a sua opinião relativamente a quais os jogadores do plantel actual deveria o Benfica manter, que melhor se alinhem à ideia de jogo de Roger Schmidt, caso se confirme a sua vinda na próxima época.