A distância de Portimão a Tondela
O Portimonense esteve quatro meses sem ganhar, mas manteve a confiança em Paulo Sérgio e fica na I Liga. O CD Tondela voltou à política da "chicotada", que deixara há quatro anos, e vai descer.
Nunca se falou tanto de Paulo Sérgio como este ano, quando o treinador do Portimonense optou por apresentar no Dragão uma equipa plena de reservistas, saindo do jogo com o FC Porto vergado a um 7-0 que até pareceu curto, tão fraco foi o desempenho coletivo dos seus. Já nem vale a pena debater se nessa noite o treinador fez bem. Eu acho que não, mas o que tinha a dizer sobre o tema escrevi-o aqui – e mantenho cada palavra do que lá está. O que ainda vale a pena, sim, é refletir acerca da anunciada renovação de contrato do treinador com o clube, alargando por mais dois anos uma ligação que se iniciou em Fevereiro de 2020 e que já é a segunda mais longa do escalão principal, apenas atrás da que mantêm o FC Porto e Sérgio Conceição. E isso é um sinal de que em Portimão se trabalha com convicções, o que é meio caminho andado para se obterem resultados.
O Portimonense esteve esta época 16 jogos seguidos sem uma vitória. Entre o 1-0 em Moreira de Cónegos, a 12 de Dezembro, e outro sucesso pelo mesmo resultado, em casa, contra o FC Famalicão, a 10 de Abril, a equipa algarvia somou sete empates e nove derrotas, uma delas a valer o afastamento caseiro da Taça de Portugal, contra o CD Mafra, da II Liga. No início desta série, que durou quatro longos meses, a equipa era sexta classificada, a um ponto da Europa. No final era 12ª, só quatro pontos acima da linha de água. Tudo somado, podia ser o suficiente para abalar convicções, mas o dono e o presidente – brasileiros – da SAD algarvia deram uma lição de tranquilidade e, se vacilaram, fizeram-no só em privado, que em público mantiveram sempre o mesmo rumo firme. Fizeram o contrário do que fez, por exemplo, a liderança cino-espanhola do CD Tondela, que resolveu mudar de treinador depois de um 0-4 com o FC Porto no Dragão – sempre foram menos três golos do que os que ali apanhou o Portimonense... – e vai no domingo vai jogar a final da Taça de Portugal com a certeza da descida de divisão e muitas dúvidas acerca da viabilidade do projeto sem as receitas e a visibilidade que dá a estas equipas a presença no escalão principal.
Em Março, a oito jogos do fim da Liga, quando era antepenúltima colocada – em posição de playoff, portanto – e depois de já ter dado um passo importante rumo ao Jamor, ao ganhar por 3-0 na primeira mão das meias-finais da Taça ao mesmo CD Mafra que tinha afastado o Portimonense, a equipa beirã resolveu substituir o treinador espanhol Pako Ayestarán pelo português Nuno Campos. Deu-se mal. Não é o trabalho de Campos que está em causa, que ele até subiu a média pontual (de 0,80 para 0,87 pontos por jogo) e vai garantir o tal “lugar na história do clube” só pela presença na final da Taça de Portugal. Ao mesmo tempo, porém, ficará ligado à descida de divisão de um projeto que estava a consolidar-se, a viver a sétima temporada seguida no escalão principal. Com um pormenor adicional: é que se nos dois anos de estreia, os mais sofridos, o CD Tondela mudara sempre de treinador a meio da época, nos últimos quatro tinha mantido a confiança até ao fim em Pepa (duas vezes), Natxo González e Pako Ayestarán e vira crescer as margens pontuais que o separavam da descida de divisão, obtendo mesmo um 11º e um 12º lugares.
A comparação entre Portimonense e CD Tondela, neste aspeto, ganha ainda mais acuidade por serem dois projetos relativamente similares em termos de negócio. São duas SAD detidas por capital privado – o Portimonense pertence desde 2103 ao brasileiro Theodoro Fonseca e o CD Tondela desde 2018 ao chinês Jiang Lizhang. São duas SAD com presidentes estrangeiros também – quem dirige o Portimonense é o brasileiro Rodiney Sampaio, quem comanda o CD Tondela é o espanhol David Belenguer. São duas SAD de regiões periféricas, o CD Tondela como representante do interior beirão, o Portimonense em nome de um Algarve que fica mais distante à medida que a Liga acentua a sua componente minhota. São, ainda, duas SAD cujo objetivo é a estabilização na Liga principal, de forma a valorizar jogadores e obter mais-valias com a sua transação, o que vem sempre complicar a tarefa de quem tem de obter resultados no campo. E será provavelmente um abuso dizer que isso se deve inteiramente ou maioritariamente à estabilidade no comando técnico, mas a verdade é que uma está a fazê-lo e a outra não.
É certo que a política de intercâmbios do Portimonense com o FC Porto ajudou bastante nesse particular. Nos últimos anos, Nakajima, Bruno Costa, Manafá, Paulinho, Ewerton ou Rafa Soares andaram entre Portimão e o Dragão, levando à movimentação de muito dinheiro e levando a tal relação a subir um patamar – porque começou com jogadores da equipa B. Mas a tal estabilização está a ajudar o Portimonense a alargar o leque de clientes – até colocou Tabata no Sporting, por exemplo. E com a concretização da opção de compra de Beto por parte da Udinese, o Portimonense vai realizar esta época um valor próximo dos 15 milhões de euros em vendas (sete milhões por Beto, dois milhões e meio por Fali Candé, outro tanto por Bruno Costa, dois milhões por Gonda, 500 mil por Boa Morte...). É três vezes mais do que fez o CD Tondela nos seus sete anos de I Liga, nos quais, a crer no Transfermarkt, se ficou pelos 4,25 milhões de euros.
Os projetos em clubes médios são sempre estáveis quando as bolas entram, mais do que as dos adversários, e somam pontos de forma a garantir a manutenção. Paulo Sérgio sempre mostrou ser um treinador competente. Mesmo quando passou pelo Sporting, depois de uma época fantástica no Vitória de Guimarães. sabe organizar equipa, obter o máximo dos jogadores que tem ao dispor e potencializar outros, de forma a serem mais valias. Já o Tondela esteve quase sempre na linha dos aflitos, a escapar às descidas nas últimas jornadas. A sorte não dura sempre. Percebeu-se este ano, em particular, o desequilíbrio existente no plantel beirão. Tenho dúvidas se o Pako conseguiria manter a equipa na I Liga.
A realidade dos factos é que tirando aquela anormalidade já mais que discutida do jogo do Dragão, Paulo Sérgio tem feito aquilo que qualquer direcção dum clube como o Portimonense pode pedir ao seu treinador: salvar a equipa da descida e cereja no topo do bolo, fazer evoluir e rentabilizar jogadores para potenciar a venda e, sejamos sinceros, um clube como o algarvio fazer 15M em vendas numa época não é assim muito normal.
Próxima época lá vem mais um japonês e 3 ou 4 brasileiros para que Paulo Sérgio possa fazer o milagre que fez com Beto por exemplo, que até à lesão que teve, fez uma época fantástica na Udinese.