Varandas e os "40 anos disto"
O ataque ao FC Porto terá aproximado Varandas do sentimento anti-sistema tão arreigado no eleitorado sportinguista. Mas de caminho desfocou a equipa. E não avançou nada no sentido da credibilização.
O Sporting vai ter amanhã eleições e, muito provavelmente, elas vão ditar a continuação de Frederico Varandas em funções. Ricardo Oliveira e Nuno Sousa, os dois candidatos nascidos da oposição ao atual líder, apresentaram os seus argumentos e terão até levado o presidente a sair da toca mais do que pretenderia – ou do que fez nos quase quatro anos que durou este mandato –, num esforço de congregação de apoio popular que, como sucede sempre nestas coisas, consolida o sentimento de identidade através do confronto. Embora fora do âmbito da campanha, após um jogo de campeonato e com todo o peso institucional que implicou a sua presença na sala de imprensa do Dragão, o “são 40 anos disto” marcou o período eleitoral, porque marcou o sentimento leonino. E, a não ser que venha a ser seguido de atos concretos no plano regulamentar ou institucional, não terá tido sobre a realidade nenhum efeito a não ser o de chamar aliados para a trincheira, unir adversários na deles e desfocar a equipa de futebol, tornando-a mentalmente vulnerável às contrariedades – como se viu na quarta-feira, contra o FC Porto.
Também a mim me faz confusão que tanta coisa que se passou no futebol português no meu período de sentinela tenha passado sem punição – e atenção que não falo só de um clube mas, sim, falo também do FC Porto e do processo Apito Dourado, tão bem documentado em todas as investigações feitas pela polícia e na altura tornadas públicas. Mas a forma como o Sporting desapareceu do campo na quarta-feira, após o penalti assinalado por Artur Soares Dias e convertido por Taremi no golo do empate, aos 60’ do jogo das meias-finais da Taça de Portugal, contra o FC Porto, que os leões acabaram por perder, e o modo como a generalidade das opiniões ouvidas pelos repórteres televisivos à saída dos adeptos do estádio foram num só sentido mostram duas coisas: que com o “são 40 anos disto”, Varandas deu um passo de gigante no sentido de vencer as eleições, mas prejudicou a equipa de futebol, fornecendo-lhe uma escapatória para o insucesso. Pode nem tê-lo feito de modo propositado, pode nem ter sido estratégia eleitoral mas uma manifestação genuína de revolta ou de coragem de militar, mas o efeito que teve foi esse. Há muita coisa a mudar no edifício regulamentar do futebol em Portugal, mas nenhuma passa por declarações bombásticas – o que falta são ações que venham dar sentido ao todo.
Sejam ou não “40 anos disto”, é preciso que os sportinguistas percebam uma coisa. Durante anos, o Sporting já terá perdido jogos por causa das arbitragens – quem não?... –, mas não foi esse o caso do jogo desta quarta-feira. Acreditar nisso é perder a noção do que é preciso melhorar. E levar a equipa a acreditar nisso é instigar-lhe um sentimento misto de impotência e inimputabilidade que não a ajuda a ganhar títulos. Bem pelo contrário. Além disso, sendo verdade que, se ainda de tal precisasse, Varandas teria encontrado nesta aproximação ao sentimento mais profundo do sportinguismo a fórmula para garantir o sucesso nas eleições de sábado, será errado julgar o mandato que está prestes a extinguir-se por esse “soundbyte” de revolta. Até porque ele aproxima o presidente de um passado recente que ele se esforçou por aniquilar em Alvalade – o de que por lá estava tudo bem e que se a equipa não ganhava os jogos era porque não havia verdade desportiva, porque os fundos manipulavam, porque os empresários aldrabavam, porque os treinadores escolhiam mal jogadores, porque alguns adeptos só iam à procura dos croquetes etc, etc.
Teria sido muito mais razoável julgar Varandas pelos títulos que o Sporting conseguiu neste mandato. Afinal de contas, os leões ganharam quatro dos últimos troféus nacionais – a Taça da Liga de 2021, a Liga de 2021, a Supertaça de 2021 e a Taça da Liga de 2022 –, só deixando escapar a Taça de Portugal de 2021 para o SC Braga. O problema é que, de repente, em aproximação à data das eleições, a equipa se viu a seis pontos do líder na Liga e perante duas ameaças de vulto, corporizadas no Manchester City e no FC Porto, na Liga dos Campeões e na Taça de Portugal. E se os falhanços da primeira metade da presidência deixaram margem para que se instalasse a dúvida e para que os sócios achassem que estavam a votar em Rúben Amorim e não no presidente que o treinador terá salvo de uma hecatombe, a situação menos positiva na frente-futebol à data de depositar o voto em urna podia deixá-los vulneráveis aos discursos da oposição. Às promessas de um investidor externo trazidas por Ricardo Oliveira – e já se sabe como as multidões reagem à palavra “milhões” – e ao discurso mais anti-sistema de Nuno Sousa, visto pela generalidade como uma espécie de continuador do “brunismo” sem Bruno de Carvalho.
Com o “são 40 anos disto”, Varandas ter-se-á aproximado de boa parte do eleitorado que por muito tempo o acusou de ser complacente com quem desvirtua e manipula. Mas aquilo de que o Sporting precisa não é de um presidente que fale. É de um presidente que faça. E ainda não sabemos o que pretende Varandas fazer para acabar com este estado de coisas além de colocar umas taças de fruta atrás de Pinto da Costa no camarote de Alvalade.
Ontem, pode ter-lhe escapado:
(Mas ainda pode ler ou ver se clicar na imagem)
Não percebo até que ponto um discurso, uma tomada de posição, o quer que seja, de um qualquer presidente, influencia o modo de jogar de uma equipa. E já agora, Tadeia, porque as minhas perguntas são feitas com alguma lógia, hoje, no Futebol de Verdade, falei-lhe de Abel Ferreira. Não, não disse nada sobre ele esta semana porque, ontem, gastou todo o tempo a falar, e bem, do jogo de quarta-feira à noite. Sei que não é o seu caso, mas se fosse outro treinador, sei lá, por acaso, JJ, a história seria outra. Está a ver porque falo em treinador com ou sem imprensa?
Não se pode promover o silêncio num tema como este. Basta de gente q "acha que". A transparência no futebol tem q ser discutida sempre, a análise q o jornalista faz é mais à forma q ao conteúdo. E criar causa/efeito do discurso com o resultado da taça é pouco consistente. Transformar os comentários de meia dúzia de adeptos à saída do estádio no estado de alma sportinguista não é razoável. E sim, há muito trabalho realizado por esta direção q vai muito além do futebol. Neste e em outros clubes portugueses. Na vertente social e desportiva. Pena q o futebol eclipse tudo.