Um “outsider” a pedir exame mais exigente
Este Sporting já demonstrou profundidade de plantel nos miúdos e soube usar o tempo de treino para aprender a dominar uma ideia de jogo. Falta-lhe uma coisa: ganhar a outro candidato.
O Sporting voltou da pausa de seleções com andamento. É verdade que o adversário não era dos mais exigentes, mas os leões despacharam o Sacavenense com sete golos, duas bolas no poste e uma mão cheia de oportunidades flagrantes desperdiçadas, poupando cinco titulares e dando a outro (Palhinha) um quarto de hora em campo que não serviu para mais do que rever amigos de outros tempos. A diferença mais flagrante para a equipa que, nesta mesma fase da Taça de Portugal de há um ano, perdeu em Alverca, não está sequer no facto de, no Jamor, Rúben Amorim ter usado oito jogadores da formação nos 16 que competiram. A mais flagrante diferença está nas dinâmicas que esta equipa demonstra. Este Sporting começa a saber ao que joga e pede exames mais complicados para deixar de ser considerado “outsider” na luta pelo título.
Estes jogos da Taça de Portugal dependem sempre muito do subconsciente, daquilo que os jogadores que vão lá para dentro dão sem se aperceberem. Mas a diferença no empenho que os três grandes colocaram nos seus desafios nem foi assim tão grande como alguns fóruns de televisão posteriores ao jogo de ontem quiseram fazer-nos crer. O Sporting entrou com cinco titulares habituais (Neto, Coates, João Mário, Nuno Santos e Sporar) contra dois do FC Porto (Manafá e Otávio) e um do Benfica (Pizzi). Depois disso, os leões ainda chamaram mais uma escolha frequente (Palhinha), os dragões mais três (Sérgio Oliveira, Corona e Díaz) e as águias, sim, mais nenhuma. Mas os adversários eram do mesmo escalão e os leões foram muito mais assertivos e convincentes na forma de lidar com o deles. Era porque não tinham as provas da UEFA com que se preocupar? Então mas se muitos dos que estavam em campo nem sequer têm grandes perspetivas de jogar a UEFA, por que razão é que haveriam de se defender nas partidas da Taça de Portugal?
Sim, falamos de opositores frágeis – e neste aspeto o facto de estarem num clube com menos cultura de vitórias recentes pode ter levado os jogadores do Sporting a encararem o jogo com menos sobranceria. Além disso, se Fabril e USC Paredes quase nem se dignaram a comparecer no meio-campo ofensivo, o Sacavenense alternou entre uma equipa com autocarro parado na sua área na primeira parte e outra que quis ir pressionar a saída de bola do adversário na segunda – e até nisso o jogo funcionou como bom treino para os miúdos de Rúben Amorim, que ali encontraram um misto das duas atitudes que são esperadas dos adversários que vão ter pela frente na Liga. Mas se há uma ideia que esta jornada da Taça pode ter começado a desmistificar é a da falta de profundidade do plantel do Sporting. Não vai ser por aí que o edifício vai desabar. Porque começando a equipa a dominar os princípios de jogo defendidos pelo treinador, dando-lhe o calendário mais desafogado a possibilidade de rodar o plantel de uma forma correta, este Sporting não muda assim tanto com a ausência de um ou de outro elemento.
Quer isto dizer que o Sporting deve ser encarado como candidato ao título? Eu diria que ainda não, com foco no “ainda”, e continuaria a chamar-lhe “outsider”. Mas por que razão, se a equipa voa, se vai com cinco vitórias seguidas, se marcou 15 golos nos últimos três jogos e se é, no período de 18 jornadas em que foi orientada por Rúben Amorim, a que mais pontos fez na Liga (tem 40, mais quatro que o FC Porto, mais seis que o Benfica, mais oito que o SC Braga e mais 12 que o Rio Ave)? O Sporting de Rúben Amorim é líder nas sete jornadas que leva o campeonato de 2020/21, mas já foi a segunda melhor equipa das onze rondas finais da Liga de 2019/20, a dois pontos do FC Porto, que acabou por arrancar nessa fase para a conquista do título de campeão nacional. Qual é, assim sendo, a razão para que os miúdos de Amorim sejam ainda meros “outsiders” e não candidatos reais ao título? No meu ponto de vista, é por não terem ainda passado de forma concludente em testes a sério, que são jogos com outros candidatos.
Claro que é possível ser-se campeão sem supremacia nos jogos entre candidatos. Aconteceu, por exemplo, quando o primeiro Benfica de Vitória se impôs na tabela ao primeiro Sporting de Jesus – e a maioria achará hoje que aquele Sporting era superior àquele Benfica. Nas 18 jornadas debaixo das ordens de Amorim, o Sporting perdeu e empatou com o FC Porto e perdeu com o Benfica. O Sporting não ganha um jogo a outro candidato ao título desde Abril de 2019, quando venceu o Benfica em Alvalade, por 1-0, na meia-final da Taça de Portugal – a final ganhou-a nos penaltis. Desde então, empatou duas vezes e perdeu três com o FC Porto e perdeu três vezes com o Benfica. São oito jogos sem ganhar, todos eles a sofrer sempre pelo menos dois golos – e três deles já com Rúben Amorim. É verdade que este Sporting tem hoje armas que não tinha na ponta final da Liga passada, não só jogadores como o domínio de uma ideia de jogo. Mas para ser candidato de pleno direito, terá de responder no momento exato.