Um golo contra a estratégia
O Portimonense entrou em Alvalade com uma linha de seis homens na proteção à sua baliza, mas o golo madrugador de Trincão permitiu ao Sporting avançar para um 4-0 mais fácil do que se esperava.
Dois golos de Trincão, um de Pedro Gonçalves e um derradeiro de Nuno Santos valeram ao Sporting um claro triunfo (4-0) sobre o Portimonense, em jogo da sexta jornada da Liga, cujo resultado pode deixar a ideia de que ele foi mais fácil do que na realidade aconteceu - e sobretudo do que se esperava. A vitória dos leões nunca esteve em causa, mas a margem final de quatro golos foi construída em cima de um bom aproveitamento das oportunidades criadas e do desmoronar prematuro da estratégia defensiva elaborada por Paulo Sérgio, logo aos sete minutos, quando Trincão fez o primeiro tento. Se a ideia atrás da montagem da linha de seis homens atrás era a de proteger até aos limites a baliza do japonês Kosuke, o 1-0 marcado tão cedo deixou o Portimonense com a obrigação de corrigir sucessivamente a equipa e o Sporting confortável, a fazer girar a bola e a metê-la sucessivamente em zonas de criação, ora pelos lados, ora pelo meio.
Rúben Amorim fez várias alterações relativamente ao jogo de Frankfurt, com as trocas de Porro por Esgaio, Saint-Juste por Neto, Matheus Reis por Nuno Santos e Ugarte por Rochinha e com o recuo de Pedro Gonçalves para o meio-campo. O sistema era o mesmo de sempre, o 3x4x3. O ataque mantinha-se móvel, com Edwards e Trincão a aperfeiçoarem as trocas posicionais entre a direita e o meio, e desta vez com Pedro Gonçalves uns bons 15 metros à frente do outro médio, em vez de os ter a ambos a par. Isso era permitido pela colocação do Portimonense no campo e pela quase nula pressão feita pelos algarvios no início da organização leonina. Se só podia concentrar-se numa zona do campo, Paulo Sérgio optava pelas imediações da sua baliza, com uma linha defensiva de quatro homens colocada muito por dentro, de forma a assegurar superioridade sobre os três atacantes interiores do Sporting, e os dois médios-ala, Ouattara e Gonçalo Costa, a comportarem-se como defesas laterais, no acompanhamento que faziam dos alas leoninos. Isto gerava muitas vezes uma linha de seis homens atrás – e já se sabe que se estão seis (mais o guarda-redes) atrás, não sobram muitos para defender à frente.
Sem pressão ao portador da bola – só Welinton andava por lá e isso era curto para os três defesas leoninos – o Sporting nem precisava de adiantar Coates para as costas da primeira linha adversária, rodando a bola à vontade e fazendo-a entrar, ora à direita, ora à esquerda, ora até ao meio, em Esgaio, Nuno Santos ou Morita. Paulo Sérgio não se incomodava, desde que Kosuke mantivesse o zero nas suas redes. Só que isso não durou muito. Aos 6’, num lance que levou a bola de um ala ao outro, Esgaio entrou na área e chutou para defesa de Kosuke, para canto. No seguimento do canto, aos 7’, a bola foi repelida de volta para Edwards, que voltou a cruzá-la. Relvas afastou para a entrada da área, onde Neto insistiu. Ouattara voltou a afastar, de cabeça, outra vez para a entrada da área, de onde Trincão, num bom vólei, lhe deu de pé esquerdo, beneficiando de um desvio no corpo de Pedrão para iludir o guarda-redes e fazer o 1-0. “Marcar um golo cedo acabou por facilitar o jogo. Notou-se cansaço em alguns jogadores, como o Morita, que não tiveram sempre a velocidade que costumam ter”, reconheceu Amorim. “O golo deu muita confiança ao Sporting”, atalhou Paulo Sérgio, que com o 1-0 perdeu logo a possibilidade de irritar o adversário com uma eventual eternização do empate, tal como certamente lhe estaria na ideia.
A verdade é que os dois treinadores tiveram razão no que disseram. O Sporting não mostrou a velocidade e a intensidade para ir para cima do adversário e, apesar de continuar a rodar bem a bola, ia perdendo controlo, permitindo que o Portimonense respirasse. No seguimento do golo, teve remates de Trincão (aos 17’) e Rochinha (aos 21’), mas a ocasião mais flagrante desse período até pertenceu aos algarvios, que procuravam sair a jogar através do triângulo formado por Luquinha, Jocu e Estrela, de forma a lançarem os médios-ala na frente ou até de aproveitarem os movimentos na largura de Welinton. Foi nesse período em que os visitantes equilibraram a posse de bola que, num canto curto, aos 24’, Gonçalo Costa teve espaço na meia direita para cruzar ou rematar. Fez um misto das duas coisas, tentando um arrojado chapéu a Adán, que no entanto sacudiu pela linha de fundo. Paulo Sérgio sentiu a equipa a crescer e tentou puxá-la mais para a frente. Sacrificou Gonçalo Costa e fez entrar mais um avançado, Rochez, desviando Estrela para o corredor esquerdo, sem as mesmas obrigações na cobertura ao ala leonino. O Portimonense apresentava agora uma linha de três à frente do quarteto defensivo, adiantando Luquinha para perto dos dois pontas-de-lança, ambos à procura das costas dos alas.
Só que quem marcou foi o Sporting. Nuno Santos ainda deu a Kosuke uma oportunidade de brilhar, desviando para canto um remate cruzado, aos 40’, e um minuto depois Trincão fez o 2-0. Tudo começou num passe interior de Rochez, que Edwards intercetou a meio do meio-campo dos algarvios. O inglês lançou de imediato Rochinha em momento de contra-transição e, solto na esquerda, este foi inteligente e colocou a bola à frente de Trincão para uma finalização fácil. Com 2-0, já não haveria muito que o Portimonense pudesse fazer. Em contrapartida, era a situação ideal para o Sporting poder gerir o cansaço, uma vez que este jogo se desenrolou apenas três dias depois do de Frankfurt e outros três dias antes da receção ao Tottenham, também para a Liga dos Campeões. Ao intervalo, Amorim trocou Inácio por Matheus Reis, reconhecendo depois que o fez por uma questão de gestão física. Por seu lado, Paulo Sérgio mudou o meio-campo, substituindo Estrela e Jocu por Ewerton e Diaby. E se num primeiro momento isso não alterou grande coisa, em breve se viu o Portimonense próximo de um 3x4x1x2, a assumir o um para um atrás, com Moufi, Pedrão e Relvas como centrais e com Ouattara e Seck nas alas.
Não o ajudou grandemente, porém. É que ainda a segunda parte ia com apenas oito minutos e Amorim também mexeu. Neto, magoado, deu a vez a Porro, passando Esgaio para central pela direita. E Rochinha saiu para entrar Ugarte, avançando Pedro Gonçalves para a frente. Com Porro a dar mais energia à direita, Ugarte a travar jogo do Portimonense ao meio e Pedro Gonçalves a garantir qualidade de criação na frente, o Sporting tomou conta do jogo. Deu até para mais duas trocas, aos 60’, as entradas de Paulinho, para ganhar minutos no regresso à competição, e de Alexandropoulos, para entrar mais um pouco nas ideias da equipa. Pedro Gonçalves forçou Kosuke a mais uma defesa, após combinação com Trincão, aos 58’, e Ugarte esteve perto do golo, em remate de cabeça, após canto, fazendo a bola passar sobre a barra, aos 64’. Um minuto depois, Alexandropoulos recuperou uma bola na frente, Paulinho deixou-a com um toque de calcanhar para Trincão, que viu o remate travado por Paulão, sobre a linha de golo. O defesa brasileiro redimia-se assim do azar que teve no lance do primeiro golo. Um azar que voltou a bater-lhe à porta no terceiro, aos 72’. Porro deu a tal aceleração na direita e cruzou, para um cabeceamento de Pedro Gonçalves que bateu Kosuke depois de se desviar em Pedrão. A Liga começou por atribuir o golo ao defesa do Portimonense, mas entretanto já corrigiu – bem, porque o cabeceamento original ia em direção à baliza.
Até final do jogo, ainda cheirou a goleada. O 4-0 apareceu logo quatro minutos depois, com uma excelente intervenção de Pedro Gonçalves antes da habitual eficácia finalizadora de Nuno Santos – o lateral já vai com três golos em seis jogos, dos quais apenas três foram como titular. O lance começou no momento em que, recebendo de Trincão, Pedro Gonçalves partiu Moufi, travando e depois arrancando com a bola. Com espaço na área, descobriu Nuno Santos solto do outro lado, para um remate cruzado que passou debaixo do corpo de Kosuke. Com mais de um quarto-de-hora para jogar, no entanto, o Sporting não acelerou mais e o desafio entrou numa espécie de trégua que até Rochez respeitou, aos 86’, quando falhou o impacto com a bola, depois de ser descoberto nas costas da defesa adversária pelo animado Rui Gomes, o elemento que mais fez para agitar o ataque algarvio depois de sair do banco. O 4-0 permitiu aos leões somar a terceira vitória seguida depois dos desaires com o FC Porto e o GD Chaves, com nove golos marcados e nenhum sofrido. Mesmo assim, o Sporting ainda é apenas sétimo classificado, a oito pontos do Benfica – e a dois do Portimonense.
Arbitragem – Cláudio Pereira não teve influência no resultado nem erros de maior, mas não conseguiu levar os jogadores sem recorrer aos cartões. Tentou claramente fazê-lo, quando poupou Rochez a um amarelo por falta negligente sobre Gonçalo Inácio, aos 45’, mas acabou por ter de mostrar três cartões amarelos – a Nuno Santos, Pedrão e Rochinha – e um vermelho – ao adjunto leonino Carlos Fernandes – por causa do clima mais aceso que saiu desse lance. Talvez houvesse outra forma de controlar, mas para isso é precisa mais experiência e que os jogadores reconheçam ao árbitro um estatuto que este jovem juiz ainda não tem.