Serviços mínimos ainda sobraram
O Benfica confirmou a presença no playoff da Liga dos Campeões com nova vitória sobre o Midtjylland, desta vez por 3-1, num jogo em que não mostrou a intensidade habitual. Nem precisou, aliás.
Foi um Benfica em serviços mínimos aquele que passou ontem por Randers, na Dinamarca, para ganhar por 3-1 ao Midtjylland e carimbar com um total de 7-2 a presença no play-off da Liga dos Campeões, onde lhe caberá defrontar o Dynamo Kiev, da Ucrânia. A vantagem que já traziam da primeira mão, na Luz, mas também a avaliação feita nessa altura ao adversário, terá levado os encarnados a compreender que não necessitariam dos níveis de energia que habitualmente gastam em vertigem atacante e pressão defensiva para seguir em frente com tranquilidade. O terceiro golo do médio argentino Enzo Fernández em outras tantas partidas cedo se encarregou de acabar com qualquer teima, tendo Henrique Araújo e Diogo Gonçalves marcado os outros dois tentos encarnados, mais do que suficientes para responder a um onze do Midtjylland que se revelou mais competente do que há uma semana mas ainda assim uns bons degraus abaixo do nível que o Benfica exigia.
Ao contrário do esperado, Roger Schmidt nem poupou no onze inicial, mantendo dez dos elementos que tinham começado os dois jogos oficiais já feitos esta época – a exceção foi o extremo direito Neres, que estava magoado e foi substituído por Chiquinho. Do outro lado, o Midtjylland apresentava várias alterações em relação ao onze que trouxera à Luz, entre elas a titularização do seu par de médios habitual, o nigeriano Onyedika e o brasileiro Evander. E podem sempre ser motivo de debate irresolúvel as razões que levaram a que este jogo fosse um pouco mais equilibrado do que o primeiro. Fator casa? Regresso de alguns habituais titulares entre os dinamarqueses? Ou redução estratégica da intensidade de pressão entre os benfiquistas, confiantes de que em condições normais voltariam a ganhar a partida? Inclino-me mais para esta última explicação, ainda que seja possível que todas tenham contribuído um pouco para um início de jogo bem mais dividido e para um maior equilíbrio nas estatísticas finais.
E aqui não falo só de remates – de acordo com os dados GoalPoint (que pode consultar clicando na imagem), os do Benfica baixaram para metade, de 24 para 12, e os do Midtjylland quase duplicaram, de seis para dez. É ainda mais notória a redução do total de ações que o Benfica fez na área adversária (de 46 para 19, desta vez quase em linha com as 17 da equipa dinamarquesa). Ou o aumento da eficácia de passe da equipa do Midtjylland, que na primeira mão se ficara pelos 69 por cento e desta vez chegou aos 80. Os jogadores apresentados por Henrik Jensen eram melhores? Certamente. Mesmo que ainda sem 90 minutos nas pernas, por estar a voltar de lesão, nota-se que Evander dá à equipa muito mais critério em posse, ou que não há comparação entre a qualidade de Paulinho e do ala esquerdo que jogou em vez dele na Luz, Dhyr. Mas a sensação que ficou foi a de que foi fundamentalmente o Benfica que apertou menos, que condicionou menos a posse de bola do adversário, não só baixando um pouco o bloco como envolvendo menos gente em ações de pressão na saída de bola. Aliás, é deveras curioso que o primeiro golo do encontro, marcado por Enzo Fernández aos 23’, tenha resultado precisamente de um momento defensivo em que, apesar da clara indicação dada nesse sentido por Gonçalo Ramos, João Mário optou por não cair em cima de Dalsgaard, ficando mais baixo e acabando depois por participar no momento de construção que sucedeu à recuperação de bola no corredor oposto por Gilberto.
Até aí, o jogo estava razoavelmente dividido. O Benfica mostrava-se capaz de construir vários lances de perigo, sobretudo no corredor esquerdo, sempre com incorporação de Grimaldo, mas o Midtjylland ganhava muitos pontapés de canto, que batia sempre muito fechados, com quatro homens na zona de ação do guarda-redes. O desbloquear do resultado acabou por nascer de um momento de boa movimentação coletiva – o movimento de arrastamento da defesa elaborado por João Mário e Gonçalo Ramos é bem conseguido – e de inteligência de Enzo Fernández no ataque ao espaço de finalização, mas também das claras carências que os dinamarqueses revelam em início de construção. Antes de bater longo, ainda por cima em direção ao menos capacitado de todos os seus companheiros neste tipo de situações – Sisto – Juninho tinha quatro opções de passe às quais renunciou por claras limitações técnicas da generalidade da equipa. Acabou Enzo Fernández por marcar o seu terceiro golo em outras tantas partidas com a camisola do Benfica, igualando um registo que ninguém conseguia no clube desde a chegada de Seferovic – o avançado suíço marcou nos seus primeiros quatro jogos de encarnado, em 2017.
Se alguém ainda tinha dúvidas acerca da passagem do Benfica ao playoff, o golo do médio argentino encarregou-se de as dissipar. Mas o Midtjylland queria mostrar que não era tão fraco como a primeira mão parecia ter deixado entender e esforçou-se para pelo menos dar réplica neste jogo. Aos 36’, depois de ganhar uma bola a Gilberto e de superar Otamendi num ressalto, Paulinho conseguiu chegar a uma posição promissora, optando (mal) por chutar em vez de dar ao meio em Kaba. Valeu ao Benfica que Morato estava a chegar e impediu o tiro nas melhores condições, bem como uma excelente intervenção de Vlachodimos, a desviar para canto. E aos 41’ foi a vez de Evander perder o empate, num lance em que Florentino foi atrapalhar Gilberto no momento em que este ia despachar a bola da área: o médio brasileiro do Midtjylland viu-se na cara de Vlachodimos mas assustou-se com a mancha do grego e chutou para fora.
Ao intervalo, enquanto Jensen trocava Evander por Sorensen, Schmidt começava a colocar em marcha o plano de rotação, abdicando de Gonçalo Ramos e Rafa para dar espaço à dupla que costuma incarnar o 4x4x2 no final dos jogos do Benfica – Henrique Araújo e Yaremchuk. E o miúdo não demorou muito a deixar a sua marca no jogo. Na sequência de um canto curto, a bola chegou a João Mário, que fez um excelente cruzamento ao qual Henrique Araújo deu a melhor resposta, com um ligeiro desvio de cabeça nas costas de Dalsgaard. Era o 0-2 aos 56’ e a confirmação de que, além da eliminatória, também o jogo devia cair para o lado dos encarnados. Só que aí entrou o jogo o excessivo relaxamento da equipa portuguesa: o lance do golo do Midtjylland, marcado aos 63’, por Sisto, mostrou um Benfica em excesso de gestão, pelo espaço que foi dando sempre a todos os intervenientes de cor contrária. Paulinho cruzou à vontade da esquerda, Kaba cabeceou sem ser importunado no centro da área e Sisto não teve oposição para o momento da recarga, depois de o cabeceamento original ter acertado na barra.
Jensen procurou então mexer com o ataque, na busca de mais frescura e da capacidade para ir à procura de outro resultado, mas nem Isaksen, nem Brumado nem Chilufya trouxeram alguma coisa de novo ao jogo. Schmidt, por sua vez, continuava a dar espaço a jogadores que não têm tido tantos minutos. Já se esperava que entrasse Bah, mas houve ainda oportunidade para a estreia de Diogo Gonçalves, que esteve nos momentos que importa referir até final. Primeiro quando, segundos depois de entrar em campo e ainda sobre a direita, recebeu de calcanhar de Araújo e solicitou a entrada de Bah, que chutou sobre a barra. Finalmente, aos 88’, já depois de trocar de flanco com João Mário – claramente na intenção de colocar o médio-ala mais interior do lado de Bah, que vinha com mais pulmão – pegou numa bola sobre o lado esquerdo e lhe acertou um pontapé perfeito, indefensável, a raspar na parte inferior da barra antes de se anichar nas redes para o 3-1. Era o final perfeito para um jogo em que o Benfica nem precisou de mostrar se é mesmo uma máquina de pressão e vertigem e percebeu que há jogos em que o segredo também está no abrandamento.
Arbitragem – Bom trabalho do sérvio Srdjan Jovanovic, a evitar apitar por tudo e por nada. Foi salvo pelo VAR naquele que podia ter sido o seu único erro de monta: aos 90+3’, Chilufya fez o segundo golo do Midtjylland, depois de ser lançado nas costas da defesa do Benfica por Brumado. As imagens mostraram que estava fora-de-jogo e o golo foi anulado.
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