Quantos pontos vale este Sporting
O Sporting dormiu na liderança, à espera do Boavista-Benfica, sabendo que há vários fatores a contribuir para a diminuição da diferença que o separa dos favoritos. Resta saber até que ponto.
O Sporting passou a noite na liderança, ainda que saiba de antemão que só lá permanecerá sozinho se o Benfica hoje perder com o Boavista ou acompanhado se os encarnados não forem além de um empate no Bessa. Logo depois da confortável vitória sobre o CD Tondela, Rúben Amorim afirmou que tinha dito aos jogadores o mesmo que no seguimento da derrota copiosa contra o LASK que lhes custou o afastamento da Liga Europa: que não vissem jornais, porque “nem na altura eram os piores do Mundo, nem agora são os melhores”. Na verdade, tal como venho escrevendo e dizendo desde o início da época, esta é uma equipa sólida e competitiva, bem melhor do que a que Amorim teve ao seu dispor na ponta final da época passada, que mesmo assim já teria valido mais cinco pontos do que os que efetivamente fez. Esta equipa é ainda curta em argumentos face aos dois principais candidatos, mas tem a ser favor uma série de aspetos na maratona que vai ser a Liga. A dúvida é quantos pontos eles podem valer na classificação final.
Um dos aspetos a favor deste Sporting é, evidentemente, o crescimento da qualidade do grupo. Mesmo tendo ficado a faltar-lhes um defesa central – na minha perspetiva – ou Paulinho – na do treinador – os leões fizeram pela primeira vez na presidência de Frederico Varandas um bom mercado. Basta ver que dos nove jogadores contratados ou cedidos nas duas janelas de mercado de 2019/20 nenhum chegou a impor-se e sete já nem estão no grupo atualmente. Falo de Vietto, Rosier, Jesé, Camacho, Eduardo, Bolasie e Fernando. Restam Sporar e Neto, que mesmo assim, em muito mais tempo, ainda não causaram impressões tão positivas como as que já deixaram, em apenas oito jogos, Pedro Gonçalves, Porro, Nuno Santos ou João Mário. Mesmo Adán ou Feddal, sem a qualidade ou a influência dos já citados, também poderão ser bastante úteis a um treinador que teve a fortuna de o mercado não ter absorvido o fundamental Palhinha e soube juntar ao grupo alguns jovens no momento certo de maturação, como Nuno Mendes e Tiago Tomás ou até Matheus Nunes e Daniel Bragança (com Quaresma e Inácio em fila de espera). O facto de os dois primeiros serem ainda juniores e, ao mesmo tempo, os que têm maior influência no crescimento da equipa vem, ainda assim, ajudar a explicar a catastrófica política de empréstimos da época anterior, então justificada por Varandas com a necessidade de esperar que os miúdos crescessem.
Mas não é só o facto de Amorim ter agora um plantel bem superior ao que encontrou no final da época anterior a justificar o crescimento do Sporting. O treinador chegou em Março e tem sido importante o tempo de trabalho que leva com a equipa, que já assimilou as bases do modelo pretendido – e nisso terá sido importante a pré-época mas também o facto de os leões terem ficado fora da Europa. O próprio técnico já disse que a eliminação da Liga Europa teria os seus efeitos ao nível da recuperação – e nesta altura, para recuperar do atraso provocado pela pandemia, tem havido jogos todas as semanas – mas sobretudo seria uma vantagem na preparação dos jogos, porque permitiria que a equipa tivesse mais tempo para pensar e trabalhar o desafio seguinte. Basta recordarem como, igualmente sem argumentos de peso no grupo, foi forte o Sporting de Leonardo Jardim, que também não estava na Europa. A jogar de três em três ou de quatro em quatro dias, uma equipa pouco mais pode fazer do que recuperação. A jogar uma vez por semana, o trabalho tático é possível – e está a ser feito por uma equipa do Sporting que ainda precisa de melhorar muito no início da sua organização ofensiva mas já apresenta movimentações muito interessantes no último terço do campo e está a tornar-se muito forte nas ações defensivas protagonizadas no meio-campo ofensivo, que a levam a muitas recuperações de bola.
A tudo isso há ainda a somar o contexto pandémico, que tem mantido os adeptos longe dos jogos. E isso, por incrível que pareça, tem sido benéfico para o grupo, não apenas porque o mantém à margem do conflito entre o Conselho de Administração e as claques, que tantas vezes transformou os jogadores em sacos de pancada, mas também porque permite que os miúdos cresçam sem tanta pressão. Não sou defensor de redomas para o talento, acho que um craque será sempre um craque, com aplausos ou assobios, mas também sei que muitas vezes a pressão conduz a más decisões. O que está aqui em causa não é a sobreproteção dos jogadores, que têm mais é de ter estômago para ouvir uns assobios e uns cânticos mais duros – ainda que preferencialmente num grupo com referências que este não tem, devido à falta de vitórias recentes. O que está aqui em causa é a capacidade para uma equipa tão jovem ser fiel ao plano quando as coisas correm pior e de fora vêm incentivos ao desrespeito. Li por aí e sinto-me tentado a concordar que nunca o Sporting teria, por exemplo, virado o jogo com o Gil Vicente se houvesse adeptos nas bancadas, porque à enésima tentativa de fazer “campo grande”, jogando com o guarda-redes para chamar o adversário e surpreendê-lo depois com espaço na frente, chegariam os assobios e os tais cânticos e o que se seguiria era um chutão na frente sem critério e a perda de bola.
Rúben Amorim chegou a Alvalade em Março e fez onze jogos na Liga anterior. Nesses jogos, defrontou seis dos primeiros dez classificados – só lhe faltaram o FC Famalicão, o SC Braga e o Rio Ave, além do Sporting, naturalmente. Fez 21 pontos, a uma média de 1,90 que, se fosse transportada para as 34 jornadas, valeria, grosso modo, 65 pontos (64,90). São mais cinco do que fizeram, de facto, o Sporting e o SC Braga. Menos 12 que o Benfica e menos 17 que o FC Porto. A dúvida que persiste é quantos pontos valerão, no final desta época, os fatores que acima identifiquei. Creio que dificilmente anularão a diferença. Mas não tenho dúvidas de que este Sporting tem condições para ficar mais perto dos favoritos.