Os melhores da Liga e a seleção
Só um dos seis portugueses que são candidatos a melhor jogador da Liga está na lista de Fernando Santos para os próximos jogos da seleção. Aparecem as queixas, estala a suspeição.
Há seis portugueses entre os dez candidatos a melhor jogador da Liga portuguesa de 2019/20, prémio oficial que vai ser atribuído amanhã de acordo com a votação dos treinadores e dos capitães de equipa que participaram na prova. O curioso é que, dos seis, só um – Bruno Fernandes – está na lista de jogadores que Fernando Santos elaborou para enfrentar os jogos com a Croácia e a Suécia, no início de Setembro, a contar para a Liga das Nações. O que vem demonstrar duas realidades: que uma coisa é escolher os melhores e outra, bem diferente, é fazer uma equipa, e que o selecionador nacional não está refém de empresários interessados em promover gente no mercado.
Se, como muitos acusam – e acusarão sempre, seja qual for a seleção ou o selecionador – a ideia de juntar uma seleção nacional fosse primeiro que tudo promover gente no mercado, nesta lista estariam muitos nomes diferentes. De Braga, por exemplo, já vieram queixas não oficiais, sobretudo através de gente com capacidade para influenciar nas redes sociais, a chamar a atenção para a ausência de Paulinho (25 golos em todas as competições) e Ricardo Horta (que marcou 24), sobretudo se por comparação com a chamada de Trincão, que já saiu do clube e foi ontem apresentado no FC Barcelona. Horta tem uma internacionalização – no último jogo de Paulo Bento, em Setembro de 2014 – e, face à derrota com a Albânia, na altura não faltou quem acusasse o selecionador de só estar a chamá-lo para satisfazer os interesses do seu empresário. Paulinho nem isso: e à luz das teorias da conspiração muito jeito daria ao SC Braga exibi-lo agora de quinas ao peito, de forma a incrementar as hipóteses de fazer valer uma cláusula de rescisão de 30 milhões de euros que é surreal para um jogador que faz 28 anos em Novembro.
Será uma questão de empresários? Difícil, porque todos os esquecidos estão em agências diferentes. Ricardo Horta está na carteira da ProEleven, de Carlos Gonçalves, ainda que tenha chegado a Braga com intervenção da Gestifute de Jorge Mendes. Paulinho está na lista de ativos da MNM, de Fernando Meira, Nuno Assis e Pedro Mendes. Entre os “esquecidos” conta-se ainda Pizzi (18 golos e 14 assistências na Liga), que é Gestifute, e acerca de quem não faltam também rumores de que pode ser negociado pelo Benfica neste mercado – e nesse sentido mal não lhe faria estar nos jogos de Setembro, de forma a facilitar uma qualquer operação. E estão depois Pedro Gonçalves e Fábio Martins, que jogaram a Liga pelo FC Famalicão. O primeiro, agenciado por Jorge Pires (esse mesmo, o agente que tinha estado no imbróglio Labyad), já se transferiu, no caso para o Sporting, e marca presença na lista de selecionados por Rui Jorge para a equipa de sub21, que vai lutar pelo apuramento para o Europeu da categoria. O segundo, que é representado pela Footinvest e que nunca jogou na seleção principal, regressa a Braga, após empréstimo (e desde que foi contratado, em 2014, já foi cedido a três equipas diferentes), para se submeter à avaliação de Carlos Carvalhal – e escusado será dizer que uma chamada à seleção seria uma alínea de peso no currículo na altura de se lhe decidir o futuro.
Se a seleção fosse, apenas e só, uma lista dos melhores, vistos de uma perspetiva individual, estes jogadores fariam todo o sentido na lista. Acontece que não é. Uma seleção começa por ser a visão de um selecionador. E depois é um grupo, é uma equipa, onde uma convocatória de um jogador tem de ser ponderada com a concorrência para a posição e com aquilo que pode significar em termos de benefícios para o coletivo, onde a estabilidade do grupo é um fator importante, devendo sempre ser ponderada com o risco de ele cristalizar. Na minha perspetiva, Ricardo Horta, pelo menos, faria todo o sentido na equipa nacional que vai defrontar a Croácia e a Suécia. Se olhássemos apenas para o rendimento nos tempos mais recentes, a sua chamada fará até mais sentido do que a de Trincão – que não está na lista de candidatos a melhor da Liga. Mas jogaria? Possivelmente não, que a concorrência para a posição é enorme. E, assim sendo, é preciso olhar para a margem de progressão, para a possibilidade de uma chamada neste momento vir a funcionar como aprendizagem, como algo que venha a dar benefícios à equipa no futuro. Ora se em Horta a margem de crescimento já não será muita, no caso de Trincão – que esteve no Mundial de sub20 – ela é enorme, incrementada até pela mudança para Barcelona e pelo convívio que o jogador vai passar a ter com realidades mais exigentes.
As escolhas de Fernando Santos para estes jogos – ainda para mais sem competição a decorrer – não são consensuais. Nunca o serão as de nenhum selecionador. Não seriam, em pleno, as minhas. Mas são as dele e é ele quem vai ter de liderar a equipa e de assumir responsabilidade pelos resultados. E não me parece, francamente, que tenham sido ditadas por interesses clubísticos ou de mercado. O homem pode ser teimoso, mas por muito que isso custe ao panorama mediático do futebol nacional, tenho a certeza absoluta de que não é desonesto.