O Sporting e o que Einstein não disse
Os números de ontem dão razão a Amorim. Mas cada vez mais parece que o treinador espera tirar resultados diferentes das mesmas ideias. A este Sporting falta a complementaridade que já chegou a ter.
Apreciei o equilíbrio mais uma vez mostrado por Rúben Amorim na conferência de imprensa que se seguiu ao empate arrancado a ferros pelo Sporting no último suspiro do seu jogo com a B SAD (2-2), até porque o treinador leonino tem razão quando diz que a equipa esteve melhor do que em jogos recentes, nos quais desbaratou mais quatro dos seis pontos que já deitou fora neste mês de Abril. No entanto, quanto mais vejo o líder da Liga persistir nalgumas ideias e rejeitar liminarmente outras, a não ser quando tem as costas contra a parede e lhe falta campo de fuga, mais me lembro da definição de insanidade falsamente atribuída a Albert Einstein: “é fazer a mesma coisa e esperar resultados diferentes”. O físico alemão nunca disse isso, o que não quer dizer que a frase não tenha razão de ser.
É verdade que o Sporting melhorou no jogo com a B SAD, no qual foi fortemente penalizado por erros individuais. Os dados GoalPoint mostram-no sem margem para enganos: os leões acabaram com 27 remates contra três, com 39 ações na área adversária contra quatro, com 9-0 em cantos e com 69 por cento de posse de bola. Se olharmos para o xG (o índice de golos esperados), ele foi de 3,2, o que quer dizer que os leões criaram o suficiente para marcar mais de três golos. Já o índice xG da B SAD foi de apenas 1,1, mostrando que a produção atacante dos azuis não chegaria para os dois golos concretizados, não fossem os erros de Palhinha e Matheus Reis no primeiro e, sobretudo, de Adán no segundo. Dir-me-ão que são números normais quando se trata do líder da Liga, mas a verdade é que não são. O Sporting já não fazia mais de 20 remates num só jogo desde os 21 que tentou na vitória (2-1), também arrancada nos últimos segundos do jogo de Barcelos, contra o Gil Vicente, a 9 de Fevereiro. E não tinha um xG superior a 2,0 desde o jogo em casa com o Portimonense, a 20 de Fevereiro, quando acabou com 2,2 e ganhou por 2-0.
Ora todos estes dados, aos quais podemos acrescentar, ainda socorrendo-nos do GoalPoint, que o jogo de ontem foi atípico também em permissividade – em toda a Liga, só o FC Porto, em ambos os jogos, e a B SAD, no jogo da primeira volta, tinham conseguido um xG superior a 1,0 em jogos contra o Sporting, sendo a média global de 0,6 – mostram que Amorim teve razão na análise que fez logo ali, perante os jornalistas, no final de mais um empate. Como a teve quando se referiu ao jogo da primeira volta, dizendo que no Jamor a B SAD tinha sido melhor e o Sporting pior do que ontem. Para quem já não se lembra, esse jogo acabou com um saldo de remates (11-7) favorável aos azuis, que na altura até falharam um penalti e terminaram com vantagem no xG (1,3-1,2), mesmo perdendo por 2-1. Tal como as perceções, no entanto, as estatísticas também têm sempre mais do que uma explicação. Aos números de ontem não será de todo alheia a vantagem madrugadora que a B SAD construiu. Claro que é reconfortante para Rúben Amorim ver que a equipa conseguiu o primeiro xG superior a 3,0 na Liga desde a vitória (4-0) sobre o CD Tondela, a 1 de Novembro, que acabou com um índice de golos esperados de 4,3. Ou que bateu o seu máximo de remates num só jogo nesta Liga (eram os 26 desse jogo com o CD Tondela). Mas isso não anula as sensações de desconforto que a equipa tem provocado ultimamente.
Estatísticas à parte, o que o jogo de ontem mostrou foi que ao contrário do que fez durante o período em que consolidou a vantagem na Liga, a este Sporting começa a faltar aquilo de que se fazem as equipas – complementaridade. O problema não é Paulinho, ainda que o jogo ontem feito pelo avançado contratado ao SC Braga tenha sido, desta vez, bastante pobre. O problema é que o Sporting está todo ele muito igual. No início da época, a equipa tinha a largura e a aceleração de Nuno Santos ou o descaramento e o um-para-um de Jovane. Tinha a busca da profundidade de Sporar e Tiago Tomás. Agora, a não ser quando Bragança entra e tenta mexê-la com passes mais inesperados, tem toda a gente à procura do mesmo: jogo interior e entre linhas e bola curta. Pedro Gonçalves quer jogar por dentro e entre linhas. Paulinho quer jogar por dentro e entre linhas. João Mário quer jogar por dentro e entre linhas. Claro que muito da quebra do Sporting se explica pelos momentos individuais menos bem conseguidos de jogadores outrora influentes, como Porro ou os próprios Pedro Gonçalves e João Mário. Ou com o momento psicológico complicado de um coletivo jovem e que nunca foi habituado a lutar por títulos – e, já se sabe, não há campeões sem pressão. Mas, mesmo que Einstein nunca o tenha dito para definir insanidade, persistir nas mesmas fórmulas e esperar resultados muito diferentes não é propriamente uma grande prova de sagacidade.