O milagre da união de ferro
Uma equipa de tostões desafia um colosso de milhões na Bundesliga. Do Bayern-Union de amanhã dependerá muito se este será o ano do 11º título consecutivo dos bávaros ou se há um milagre em Berlim.
Se Gary Lineker uma vez definiu o futebol como um jogo de onze contra onze em que “no fim ganha a Alemanha”, bem poderíamos caraterizar a Bundesliga como um campeonato em que participam 18 equipas e no fim ganha o Bayern Munique. São já dez as Ligas consecutivas que os bávaros conquistam desde que se deixaram surpreender pelo Borussia Dortmund de Jürgen Klopp em 2013. E os elevados investimentos que fazem a cada ano, a capacidade para irem buscar os melhores jogadores aos rivais que os ameaçam mais de perto, levam a que, época a época, a Bundesliga seja sempre encarada da mesma forma: haverá alguém capaz de dificultar a tarefa ao Bayern? Este ano, essa equipa surgiu de onde poucos esperavam. O Union Berlim, a viver a terceira temporada no escalão principal, depois de um passado de subalternização até pelo regime comunista da ex-RDA, montou um plantel de tostões capaz de se bater com o Bayern e vai neste domingo à Allianz Arena (16h30, Eleven Sports 1) lutar com as suas armas por uma liderança que já ocupou, isolado, por algumas jornadas – e que até podia estar a defender neste momento, se tivesse ganho no último fim-de-semana ao Schalke, em casa. À espreita está o Borussia Dortmund, num comando tripartido muito pouso usual quando se fala da Bundesliga em finais de Fevereiro.
De que é feita esta união de ferro, acerca da qual cantava a punk rocker Nina Hagen em Eisern Union, o hino que criou em 1998 para o clube? A resposta está na génese da pergunta e na letra da canção. É feita de união e é feita de ferro. Só com um espírito coletivo fortíssimo, construído pelo treinador suíço Urs Fischer, no clube desde 2018, é que o Union pôde crescer como o fez a partir do momento em que chegou à 1. Bundesliga pela primeira vez em mais de um século de história, em 2019. E só com uma organização defensiva de ferro – menos de um golo sofrido por jogo em todas as competições desta época –, à qual dá o seu contributo o defesa-central português Diogo Leite, esquerdino emprestado pelo FC Porto depois de ter fracassado a consolidação no onze de Sérgio Conceição em três anos seguidos e de ter passado uma temporada em Braga, é que os cavaleiros vermelhos podem manter-se no topo de uma Liga em que registam apenas o oitavo ataque mais produtivo. Definido por uns como a “loucura”, por outros como um “milagre”, o percurso do Union é visto por muitos outros como a recuperação do espírito anti-sistema de um clube que durante décadas se julgou amaldiçoado mas que manteve sempre a lógica contestatária. Depois do combate ao III Reich e ao comunismo de estado da antiga RDA, resta-lhe lutar contra o poder financeiro do Bayern. É o que fará amanhã, sabendo por certo que tal como nas lutas anteriores só a persistência poderá conduzi-lo a uma vitória saborosa e nada previsível.