O investimento e o talento
O problema do FC Porto não é de falta de investimento. É de desarticulação entre quem investe e quem capitaliza o investimento em campo. O FC Porto tem ganho, mas vale menos do que há cinco anos.
Pinto da Costa aproveitou os microfones que lhe estenderam na abertura da gala anual de “O Gaiense” para, usando a habitual habilidade retórica, desmentir Sérgio Conceição ao mesmo tempo que concordava com ele. Claro que o treinador tem razão quando diz que no FC Porto “não se deita a toalha ao chão” enquanto houver possibilidades matemáticas de lutar por um título, é evidente que quem quer que falasse após o 0-0 com o Inter deixaria que a frustração de uma eliminação injusta lhe toldasse o raciocínio, e com essas duas afirmações desde logo ficava arrumada a questão de uma eventual diferença de ideias entre administração e técnico. Podiam tirar o cavalinho da chuva os que andavam à procura de confusão... Porque, nisso o presidente foi taxativo: não houve, nem pouco mais ou menos, escassez de investimento no plantel nestes últimos anos. Mas para se perceber que o FC Porto tem investido nem é preciso ter formação em economia ou gestão e paciência para ler os longos Relatórios e Contas das SAD. Basta abrir o portal Transfermarkt. Depois de terem sido forçados a alguma parcimónia no verão de 2017, no qual só gastaram um milhão de euros em Vaná – os 20 milhões de Oliver já tinham sido decididos meses antes da chegada das limitações do fair-play financeiro, pois estavam no acordo de empréstimo feito com o Atlético Madrid –, os dragões investiram 210 milhões no mercado nos cinco anos que se seguiram. Dá uma média de 42 milhões/ano. O Sporting, por exemplo, gastou 174 milhões. São menos 36 milhões em cinco anos. O Benfica, é verdade, gastou quase tanto como os dois rivais em conjunto – foram 345 milhões – mas nem a questão pode ser vista assim, só olhando para as saídas de dinheiro, porque também há que ter em conta o que se recebeu nas vendas de jogadores, nem o fundamental é avaliar o volume do investimento. Aliás, Conceição não falou diretamente em falta de investimento. E, se o treinador se queixou de não ser dado o devido valor ao trabalho que tem vindo a fazer sem que se percebesse exatamente quem eram os destinatários da mensagem – os adeptos, os jornalistas, os dirigentes, os comentadores de programas televisivos da treta? – também o presidente assumiu, quem sabe se induzido pelas perguntas que lhe iam sendo feitas, que a questão aqui era o volume do investimento. Não era. Também não era a falta de sucesso no campo: além de serem neste momento detentores dos quatro troféus nacionais – Liga, Taça de Portugal, Taça da Liga e Supertaça –, os dragões conquistaram nove dos 20 títulos em disputa neste período de cinco anos, contra seis troféus do Sporting, dois do Benfica e do SC Braga e um do CD Aves. Do que Conceição falava era da relação entre o investimento feito e o talento que ele conquista. Porque a perda de talento – muito dele a custo zero, em finais de contrato – e a inabilidade na sua substituição leva a que, mesmo tendo sido hegemónico desde então, o FC Porto tenha hoje um plantel menos valioso do que há cinco anos. Há cinco anos, o Transfermarkt avaliava os 25 jogadores mais importantes do plantel do FC Porto num total de 340 milhões de euros. Hoje, esse valor baixou para 277 milhões. É inevitável que isso suceda com clubes portugueses? Nem por isso, como se vê, por exemplo, fazendo o mesmo exercício no grupo do Sporting. A questão é que, apesar de publicamente estarem de acordo em tudo, no FC Porto parece haver duas linguagens diferentes entre quem decide onde se investe e quem rentabiliza esse investimento no campo. Só assim se explica que muitos dos jogadores em quem o FC Porto mais investiu nestes cinco anos tenham contado tão pouco no plano de jogo. Quanto muito, Conceição ter-se-á queixado de andarem a investir em jogadores que não lhe servem, o que depois o leva a fazer as equipas com gente vinda da equipa B ou contratada ao preço da uva mijona em clubes de média dimensão.
A estreia de Martínez. Concentrou-se ontem a seleção nacional para o arranque do período Roberto Martínez. Viram-se muitos sorrisos, houve bicicleta estática e ginásio ao ar livre, para aproveitar a colaboração da meteorologia, que assinalou a estreia do novo selecionador com uma bela segunda-feira de sol. Ronaldo estava feliz, apesar de lhe faltar pela primeira vez em muitos anos o amparo de Ricardo Regufe, o amigo tornado empresário, que pediu escusa não se sabe bem do quê, já que até hoje ninguém esclareceu o que ele lá fazia verdadeiramente. Mas o tom geral era de felicidade, de reencontro de amigos numa colónia de férias de Verão depois de um ano inteiro a amargar com a chuva e o frio nas escolas que frequentam. Cheirava a Verão Azul, com Martínez a fazer de Chanquete, o pescador barbudo que amparava os golpes aos miúdos vindos lá das cidades. É de aproveitar, que o clima não vai ficar sempre assim. Hão-de vir dias de chuva e algumas tempestades, assim a equipa perca o sorriso dentro do campo. Para o evitar, há um caminho. É ganhar, de preferência a jogar bem. E mesmo assim...
Quem nunca? A Autoridade de Prevenção e Combate à Violência no Desporto instaurou um processo a Paulo Sérgio, o treinador do Portimonense, que não gostou de ouvir um adepto chamar-lhe “cabrão” e, findo o jogo, em que a sua equipa perdeu com o FC Vizela, foi ter com ele para lhe dizer que se repetisse a brincadeira lhe “arrancava os olhos”. Nenhum dos dois esteve bem, como é evidente, o adepto porque deixou a frustração da derrota tomar conta dele, o treinador porque há-de estar cansado de levar desaforos para casa e se esqueceu das suas responsabilidades como representante do clube. Quem nunca ?! Entendo a ideia segundo a qual todos nos fartamos de aturar “atrasadices mentais” de quem não sabe comportar-se como adulto, mas acho que Paulo Sérgio deve ser castigado, sim. Não sou, no entanto, nada partidário dessa tese segundo a qual os profissionais do futebol, sejam eles jogadores, treinadores, árbitros ou jornalistas, têm de aguentar tudo, porque ganham bem – e isso nem é verdade na maior parte dos membros destas classes – e por isso acho que a APCVD precisa de harmonizar a sua forma de estar. Porque se as virtudes da prevenção face à punição que aplicam à relação das autoridades com os adeptos estão na economização de meios, a punição severa também tem de se aplicar a quem vai ao futebol para criar problemas. E disso não há pelo menos notícias.