Messi desempregado num futebol falido
O mercado não mexe e Messi ficará desempregado à meia-noite. Sinal dos tempos de um futebol que vive acima das possibilidades e que precisa dos grandes gastadores como fatores de equilíbrio.
Imagino que em Portugal ande por aí muita gente desesperada com a ausência de novidades, mas estes não são tempos fáceis. Folheiam-se os jornais, veem-se os programas televisivos especializados, consultam-se as contas de Twitter sobre transferências e… nada de excitante de lá sai. São sempre os mesmos nomes, reciclados vezes sem conta, com nuances, que ora aparece mais um milhão por objetivos, ora se aliena ou se compra mais uma parte do passe, mas coisas certas, que é bom, nem vê-las. A razão é simples: não há liquidez e os poucos que a têm se há coisa que ainda não os acometeu foi a pressa. Isto está tão estranho que hoje, à meia-noite, Messi fica desempregado. O Messi, imaginem vocês, a bater à porta do Ministério da Segurança Social espanhol, para reclamar o direito ao subsídio de desemprego. E ainda a gente se queixa de andar a levar com o Wass, o Ugarte, o Gil Dias, o Nuno Tavares, o Radonjic, o Vitinha ou o Peglow.
Ao que se diz, o FC Barcelona contava renovar contrato com Messi no dia em que o astro argentino fez 34 anos, que foi na semana passada. O jogador está na Copa América, ao serviço da sua seleção nacional, com ele até está Sérgio Agüero, que os catalães já contrataram depois de este ter sido dispensado pelo Manchester City e que alegadamente estará a ajudar a convencer o compadre, mas nada aconteceu a tempo de evitar a prescrição do contrato. Há quem diga que é Messi que hesita – o próprio presidente do clube, Joan Laporta, afirmou em entrevista recente que está à espera de uma resposta – mas parece evidente que os catalães precisam de garantir primeiro a dispensa de alguns dos muitos salários milionários que lhes enchem o balneário e que só depois poderão oferecer a Messi o contrato que está preparado. Um contrato revisto em baixa, como será seguramente revisto em baixa todo o futebol neste Verão. É a consequência mais direta da crise pandémica na indústria do futebol, da resultante quebra da procura saída da falta de liquidez presente e antecipada, de uma estabilização da oferta (porque não há menos jogadores) e da redução acrescida de um fator-extra, que é o tempo, comprimido entre um final de época normalizado e o início antecipado da temporada de 2021/22.
No fundo, não é só Messi que está no fio da navalha. Quando anunciou que queria deixar o Tottenham, Harry Kane disse que queria tudo resolvido antes do início do Campeonato da Europa, mas a verdade é que ainda está pendurado. Em Itália, continua a falar-se do futuro de Cristiano Ronaldo com grande incerteza, com a particularidade de o capitão da seleção de Portugal ter pelo menos mais um ano de contrato a cumprir com a Juventus. Os jornais e os sites especializados italianos bem agitam os nomes dos jogadores da “azurra” que pertencem a clubes menos ricos, como Locatelli ou Berardi, ambos da US Sassuolo, mas fazem-no na vã esperança de ver acontecer alguma coisa que não acontecerá enquanto do Abu Dhabi ou do Qatar não vierem as ordens para o Manchester City ou o Paris Saint-Germain começarem a fazer mexer o mercado. Porque a verdade é que enquanto os tubarões gigantes não derem início ao festim, os grandes que deles dependem não têm ordem para sequer se sentarem à mesa e pegarem nos talheres. E os nossos peixinhos, cá em Portugal, vão-se debatendo com problemas risíveis, sejam eles a decisão leonina de avançar ou não para Vinagre ou Ugarte, em função da incerteza em torno de Nuno Mendes; a necessidade portista de encontrar alternativas para ficar nos limites do “Fair-Play Financeiro” se o Wolverhampton afinal não se chegar a frente com a proposta irreal por Vitinha – no seguimento de outra, ainda mais irreal e concretizada no ano passado, por Fábio Silva – ou o acerto de contas promovido na Luz com Gil Dias como protagonista.
No fundo, passamos o ano a queixar-nos de que os grandes clubes europeus não cumprem as regras do Fair-Play Financeiro, que têm direito a um Mundo à parte, que desvirtuam todo o mercado, mas depois andamos aqui à rasca porque eles estão de férias ou têm mais em que pensar do que em colocar a máquina a andar. E se isso é sinal de alguma coisa é de um futebol a viver claramente acima das suas reais possibilidades. E se isso resulta nalguma coisa é nesta situação ridícula, de Messi poder ficar sem clube à meia-noite de hoje, se daqui até lá não puser a assinatura nalguma proposta.