Liedson, Derlei, Slimani
Amorim não disse que Paulinho e TT são melhores do que Liedson, Derlei ou Slimani. O que ele disse é que uma equipa não é melhor só por ter melhores avançados. Mas há-de ter aprendido com isso.

Rúben Amorim não é sportinguista e, além disso, nunca deve ter gasto muito tempo na sua vida a estudar a forma de pensar dos adeptos leoninos, que se há coisa em que não admitem que lhes toquem é nas suas equipas preferidas, que são aquelas que perdem. Se o tivesse feito, perceberia que a equipa desta época, em cujo fracasso ele também tem a sua dose de culpas, não fez o suficiente para se tornar tão mítica como a de 2005, que perdeu em casa na final da Taça UEFA, como a de 2007, que em Alvalade continua a achar-se que perdeu a Liga por causa de um golo do FC Paços de Ferreira, metido com a mão, à terceira jornada, ou como a de 2016, que perdeu o campeonato porque no dérbi com o Benfica Bryan Ruiz meteu em órbita terrestre uma bola cujo destino mais fácil era o fundo da baliza Norte de Alvalade. Se tivesse pensado nisso, Rúben Amorim não tinha falado, como falou ontem, de Liedson, Derlei e Slimani, lembrando que eles não ganharam um campeonato no Sporting, coisa que Paulinho e Tiago Tomás até já fizeram. “2021? Isso foi sorte. De que outra forma seria possível ganhar a Liga com Paulinho e Tiago Tomás?”, dir-lhe-ão. E não, Amorim não enlouqueceu a ponto de dizer, como entretanto já lhe foi atribuído em diversos fóruns de redes sociais, que Paulinho e Tiago Tomás são melhores jogadores do que Liedson e Derlei ou até Slimani. O que ele vos disse foi que há muito mais fatores numa equipa do que a qualidade dos seus avançados. Que apesar de haver Slimani, quem surgiu para finalizar aquele cruzamento da direita, sem guarda-redes nem nada, a metro e meio da linha de golo, foi Ruiz – precisamente porque Slimani tinha ido à faixa ganhar a profundidade e fazer o cruzamento, que as equipas de futebol não são de matrecos, precisam de movimento e envolvimento, razão pela qual não ganha sempre quem tem o avançado-centro mais certeiro. Há, no entanto, uma coisa que Amorim esquece e na qual radica o erro do seu pensamento. É que ganha quem faz golos, seja através do ponta-de-lança, do ala esquerdo, do avançado interior, do médio defensivo ou, como ele disse, “nem que seja o Adélio [Cândido, um dos seus adjuntos] a meter a bola na baliza”. E compete ao treinador escolher um grupo de jogadores capazes de terem uma boa relação com a baliza – coisa que o Sporting desta época não tem, acusando demasiado a perda de Sarabia. Quando Amorim recorda que Coates salvou a equipa diversas vezes no ano do título e que esta época as finalizações não lhe estão a sair tão bem, está a pôr o foco em dois aspetos distintos mas complementares. O primeiro é que uma equipa precavida não devia depender da subida do defesa-central para o ataque – e sim, nesse sentido, 2021 não foi sorte, porque nestas coisas não há sortes nem azares, mas foi um desenrascanço que não convinha repetir, porque podia correr mal, como está a correr. O segundo, que passa mais despercebido na argumentação, é que em 2022 a equipa não precisou disso. Porquê? Porque tinha gente com melhor relação com o golo. A má relação do Sporting com o golo custou-lhe a eliminação da Liga Europa e aquela que, face à distância de sete pontos para o SC Braga, já parecia ser a via mais acessível para chegar aos milhões da Liga dos Campeões. Mesmo tendo sentido mais dificuldades do que em Turim, porque a Juventus veio num 4x3x3 que diminuiu os espaços a Morita e Pedro Gonçalves, o Sporting suportou-se num excelente Ugarte e num bom Edwards para voltar a ser melhor do que o adversário. Só que não fez golos a consumar a superioridade. Na soma dos dois jogos, o índice de golos esperados (xG) dos remates leoninos foi de 4,04. O que isto quer dizer é que os leões deviam ter marcado quatro golos – e só fizeram um. Ora se a Juventus, que teve um xG de 2,13 nos 180 minutos, fez mesmo os dois golos – curiosamente, nenhum deles pelo seu avançado de 81 milhões de euros, Vlahovic – não admira que tenha saído por cima.
Contra o azar, marcar. Se havia quem podia queixar-se daquilo a que alguns chamam azar era a AS Roma, que repetiu ontem, na segunda mão da eliminatória contra o Feyenoord, o festival de bolas nos postes – foram mais duas – e esteve a um par de minutos da eliminação. José Mourinho sabe gerir estes jogos tensos como ninguém, nunca deixou que a persistência do 0-0 lhe tirasse o foco, marcou numa carambola e sofreu o que podia ser o golo fatal já perto do fim. Só que em campo já estavam Dybala, regressado de lesão, e Abraham, chamados pelo treinador no momento exato para terem o impacto que tiveram: o argentino fez um golo de autor aos 89’, assumiu a equipa num daqueles momentos em que a bola queima, forçando o prolongamento; o inglês assistiu El Sharawy e Pellegrini para os dois remates que deram aos romanos o 4-1 final sobre um Feyenoord que já tinham batido na final da Liga Conferência e que é uma belíssima equipa. Há Juventus, há Bayer Leverkusen e há Sevilha FC, mas a AS Roma tem uma coisa que os outros semi-finalistas não têm: um serial winner como treinador. Se já tem cinco competições europeias na vitrina, José Mourinho pode muito bem juntar-lhes uma sexta.
O sortilégio da Liga Europa. O que leva o Sevilha FC, 13º da Liga Espanhola, a ganhar por 3-0 ao Manchester United, que revivia debaixo das ordens de Erik Ten Hag? É o sortilégio da Liga Europa, que os andaluzes ganharam mais vezes do que o normal? Ontem foi mesmo mais uma soma de erros numa performance que o treinador holandês classificou como “inaceitável”. Se a primeira mão parecia encaminhar a eliminatória para o lado inglês até aos dois autogolos que, nos últimos 10 minutos, transformaram um tranquilo 2-0 num inquietante 2-2, a segunda nem teve conversa, que os erros começaram muito mais cedo. Maguire ofereceu a Lamela a bola que En-Nesyri transformou no 1-0. Casemiro deu a Acuña uma bola que só não deu o 2-0 a Ocampos porque o lateral argentino ainda se deixou apanhar num fora-de-jogo de VAR antes de cruzar. E depois entrou em ação De Gea, inexplicavelmente coberto por um golpe de cabeça de Bade no 2-0 e autor de um mau controlo de bola, a deixá-la à mercê de En-Nesyri para o 3-0. Um erro lamenta-se. Mas quatro já não têm explicação.
Gostava que a Roma vencesse a liga europa