João Mário, Díaz e... Corona
A confirmação de João Mário mostra o acerto de uma estratégia que passe por rentabilizar Corona no mercado. Até porque a verdadeira pérola já é Díaz.
A confirmação da conversão de João Mário em defesa-lateral de alto nível foi a principal notícia do início de Liga. É certo que faltará vê-lo em jogos de outra exigência competitiva, onde seja também obrigado a manter a concentração defensiva além de contribuir no ataque, mas o miúdo que já tinha agarrado o lugar à direita nas últimas três jornadas da época passada parece estar a fechar mais uma porta a Corona, o melhor jogador da Liga de 2019/20, cuja entrada no onze de Sérgio Conceição parece agora ainda mais difícil do que quando os dragões perceberam o crescimento de Luís Díaz e começaram a olhar para ele como gerador de mais-valias no mercado. Fosse este um Verão normal e Corona já teria seguido caminho. É a crise pandémica que deixa tudo mais difícil.
Conceição diz que não apostou em João Mário na ponta final da época passada para “queimar etapas”, até porque a equipa ainda tinha objetivos a atingir. E é normal que, com acesso aos treinos, os técnicos percebam as coisas antes dos espectadores, que só reparam nelas já em competição. Corona lesionou-se em finais de Abril, na receção ao FC Famalicão, jogo que iniciara como lateral-direito. O FC Porto já estava a ganhar e a resposta imediata do treinador passou pela entrada de Zaidu, mudando Manafá da esquerda para a direita. João Mário estava no banco e lá ficou até final da partida, que os dragões ganharam com dificuldade, por 3-2 – alinhou no dia seguinte contra o CD Cova da Piedade, pela equipa B, na II Liga. No jogo seguinte, a visita ao Benfica, João Mário saltou do banco quando foi preciso ir atrás do resultado: entrou para defesa-direito a 21 minutos do fim e assistiu Uribe para o golo do empate. Desde então foi sempre titular nos jogos oficiais: marcou ao Farense (5-1), assistiu frente ao Rio Ave (3-0) e nas duas partidas com a B SAD (4-0 a fechar a época passada e 2-0 a abrir esta).
O mercado ainda não trouxe a Sérgio Conceição o lateral de nível internacional de que se falava, mas a competição permitiu ao treinador completar o caminho de regresso de João Mário, que antes destas quatro jornadas tinha sido um dos desaparecidos em combate após a primeira parte desastrosa contra o Boavista, em meados de Fevereiro: com Diogo Leite, Fábio Vieira e João Mário no onze, os dragões viram-se a perder por 2-0 ao intervalo e a reação do técnico foi sacar os três de campo no descanso de um jogo que acabou empatado (2-2). No final, Conceição falou no sacrifício que é preciso fazer sempre para se ser jogador do FC Porto. “Não basta ser da formação ou bonito nas redes sociais”, disse, em crítica que foi distribuída por todos e parece ter representado o passo atrás antes de se darem dois em frente: no domingo, contra a B SAD, o FC Porto voltou a jogar com quatro jogadores da casa no onze (Diogo Costa, João Mário, Sérgio Oliveira e Bruno Costa) e fez entrar mais dois (Fábio Vieira e Francisco Conceição) na segunda parte. E diz “O Jogo” que desde 1996 o FC Porto não começava uma Liga com seis jogadores da sua formação em campo – na altura jogaram Jorge Costa, Rui Jorge, Bino, Rui Barros, Folha e Domingos.
João Mário foi, com Díaz, um dos melhores em campo – e é daí que se faz a ponte para Corona, que amanhã volta aos treinos, depois de ter estado envolvido na Gold Cup, ao serviço da seleção do México, e de por isso ter atrasado as férias. Extremo de origem, Corona foi o melhor jogador da Liga de 2019/20, a última que o FC Porto ganhou, e na qual atuou várias vezes como lateral direito. É certo que o mexicano não perdeu qualidades, mas está a entrar no último ano de contrato. As saídas a custo zero têm sido traumáticas para os dragões, pelo que o mais normal seria a estratégia de ataque ao mercado passar pela sua transferência – aliás, o nome de Corona (e o de Sérgio Oliveira) esteve envolvido no escândalo-Gattuso, na Fiorentina, um processo no qual o novo treinador viola insistiu na contratação inflacionada dos dois jogadores dos dragões até ao momento em que o proprietário do clube prescindiu dele, um par de semanas depois de o ter contratado.
O FC Porto conta neste momento com João Mário, Nanu, Zaidu e Manafá (além de Carraça e Tomás Esteves) para as duas laterais. Na frente, a Copa América já veio dizer que Díaz pode ser um dos principais desequilibradores desta Liga – e, além de poder jogar por aí com Fábio Vieira, Conceição tem ainda o filho Francisco e contratou o brasileiro Pepê a peso de ouro. É claro que a qualidade nunca é demais e Corona vem acrescentar, mas a realidade das equipas portuguesas tem sempre de ser contrabalançada com um equilíbrio das contas para o qual as vendas costumam ser fundamentais. É por isso que se este início de Liga serviu para alguma coisa foi para os responsáveis portistas ficarem mais à vontade relativamente à hipótese de perderem Corona. E ansiosos para que, lá fora, ninguém perceba a tempo que a maior pérola daquele ataque já é Díaz.