Complexidade, sobrecarga e erro
O FC Porto equilibrou o jogo com o Chelsea graças à complexidade organizativa e à sobrecarga de trabalhos imposta a alguns jogadores. Daí ao erro, a margem é curta.
O FC Porto mostrou em Sevilha que pode discutir uma eliminatória com o Chelsea, mas que na verdade há coisas que não se superam com organização e sobrecarga de trabalho. Aliás, muito pelo contrário. Há coisas que são prejudicadas pela organização e, sobretudo, por uma sobrecarga de trabalho como aquela a que foi submetido, por exemplo, no jogo de ontem, o mexicano Corona. Porque será mais ou menos consensual vir aqui agora dizer que, no plano tático e coletivo, os dragões foram capazes de mitigar a diferença de investimento entre as duas equipas, mas que depois foram traídos por “erros individuais”. É verdade. Mas de onde nasceram esses erros?
Sérgio Conceição preparou muito bem o jogo do ponto de vista estratégico, mas terá tido demasiada confiança nas capacidades sobre-humanas de alguns dos seus jogadores. Corona, cuja receção falhada, aos 90’, deu origem ao segundo golo do Chelsea, fez um jogo que podia ser um caso de estudo, porque se lhe pedia que fosse extremo direito em fase ofensiva, com capacidade para ir inclusive ao corredor contrário potenciar eventuais lances de dois para um, mas depois que fechasse o seu corredor defensivamente, bloqueando a ação de Chilwell, de forma a que Manafá, o lateral, pudesse funcionar como terceiro central e equilibrar a zona defensiva face aos três atacantes do Chelsea. Como a linha defensiva do FC Porto era flutuante, também Otávio tinha uma missão muito exigente, pois não raras vezes apareceu a dobrar Zaidu por fora à esquerda, permitindo que o nigeriano viesse dentro – aconteceu, por exemplo, no primeiro golo, quando Zaidu se precipitou numa tentativa de corte à queima do passe de Jorginho para Mount.
Se tudo funcionasse na perfeição, o FC Porto garantia que bloqueava as subidas dos laterais, que tinha capacidade de pressão para interromper as linhas de abastecimento aos médios e que equilibrava o confronto com os avançados. Acontece que o FC Porto não se limitava a este 4x3x3 desdobrável no tal 5x4x1 flutuante no momento defensivo. A equipa portuguesa quis levar o jogo para perto da área do Chelsea, de modo a impedir que as subidas dos centrais com bola (sobretudo Azpilicueta) lhe provocassem desequilíbrios. E, aí, este foi um FC Porto mais ambicioso do que tinha sido, por exemplo, com a Juventus. Sérgio Conceição quis mais, de forma mais continuada – e talvez tenha exagerado no que pediu aos seus jogadores. Estes cometeram erros? Seguramente. Mas nem foram os únicos, nem estes erros foram apenas defensivos, nem tiveram a ver só com falta de qualidade, mas também um pouco com excesso de exigência. É que os jogadores do Chelsea também cometeram erros nos lances em que o FC Porto podia ter marcado, dando espaço para finalizações à entrada da área a Uribe ou a Díaz, por exemplo. Só que, por outro lado, os erros na definição das jogadas atacantes já são um clássico neste FC Porto – toda a gente normalizou já a noção de que esta é uma equipa sempre muito mais preparada para arrombar o cofre do que para lhe descobrir a combinação certa.
A eliminatória não está resolvida, mas ficou muito mais complicada. Se ontem disse, no Futebol de Verdade, que as probabilidades de o FC Porto superar o Chelsea podiam andar em torno dos 35%, acho que neste momento estarão mais perto dos 5%, sobretudo se a inclusão de Sérgio Oliveira redundar numa equipa mais forte em termos de definição e de finalização e se, por outro lado, Sérgio Conceição deixar de acreditar que lidera uma equipa de super-heróis da Marvel. Se ontem se percebia um FC Porto complexo e até se pediria uma equipa mais cínica do que aquilo que foram os dragões, para a semana, no mesmo estádio, sabendo já que pode enfrentar o Chelsea olhos nos olhos, o FC Porto tem de ser menos complexo e mais direto ao assunto, dessa forma tentando impedir que a complexidade da organização ou a sobrecarga de trabalho possam conduzir ao erro.