Como o mercado deixa a Liga
O fim do mercado ainda trouxe uma surpresa, com a saída de Nuno Mendes para o PSG e a chegada de Sarabia ao Sporting. Bom ou mau negócio? E em que pé fica o equilíbrio de forças?
A saída de Nuno Mendes e a entrada de Sarabia, ambas por empréstimo, foram as novidades do último dia de mercado, que em Portugal também viu o FC Porto e o Benfica emprestarem Diogo Leite e Chiquinho ao SC Braga, levando tão à letra a ideia de lhes permitir a subida de patamar competitivo que o fizeram reforçar um concorrente direto. O fecho do mercado ainda trouxe uma surpresa, mas confirmou a tendência de quebra de que falei ontem, tanto no Último Passe como no Futebol de Verdade, com a redução dos valores vindos de fora do país para um terço dos do ano passado e para quase um sexto dos de há dois anos, no último Verão pré-pandemia. E, pelo menos até Janeiro, a Liga passará muito pelo tal confronto de filosofias, entre um campeão que aposta na escassez como maneira de focar toda a gente, e desafiantes que metem as fichas todas na diversidade de opções à disposição, em grupos bem mais vastos.
Os sete milhões – mais os 40 que certamente chegarão no final da época, tal como chegaram 16, no início desta, da mesma proveniência, para o FC Porto, por Danilo – que o Paris Saint Germain vai pagar por Nuno Mendes são o negócio possível num mercado que por diversas razões os clubes portugueses tiveram este ano de encarar com mais realismo. É verdade que no caminho de volta chega, sem encargos, Sarabia, um avançado internacional espanhol, que ainda na época passada fez 37 jogos – 17 a titular – no Paris Saint-Germain e que vai apertar a concorrência no ataque nos leões, mas o negócio também significa que Rúben Vinagre deve mesmo cumprir os objetivos fixados no contrato de cedência com o Wolverhampton WFC e que, dos 40 milhões por Nuno Mendes, dez servirão para adquirir metade do passe do seu substituto. Não será o negócio com que Frederico Varandas e Hugo Viana sonharam, mas vai ser a segunda maior venda da história do Sporting, atrás apenas da saída de Bruno Fernandes para o Manchester United.
Em termos de grupo de trabalho, e uma vez que também Plata foi cedido ao Real Valladolid, abrindo a vaga a Sarabia, isto deixa Rúben Amorim a trabalhar com um plantel de apenas 22 jogadores, aos quais podem juntar-se alguns que estão a meio caminho entre a equipa B e a principal – Gonçalo Esteves, Essugo e agora eventualmente Nazinho. A polivalência de Nuno Santos ou Matheus Reis pode ajudar a compor a lateral esquerda, que ficou limitada a Rúben Vinagre e à eventual adaptação de Esgaio, mas só o decorrer da época dirá se a aposta de Amorim é ou não demasiado arriscada para enfrentar Liga e Champions. O Sporting vai a jogo com apenas cinco centrais, sendo um deles Matheus Reis – e jogam três de cada vez –, três laterais, quatro médios e dois pontas-de-lança. Em contraste claro com o que se passa no FC Porto e no Benfica.
No Dragão, Sérgio Conceição não viu o último dia levar-lhe ninguém a não ser Romário Baró e Diogo Leite, emprestados ao Estoril e ao SC Braga. Sérgio Oliveira e Corona continuam de azul e branco, depois de terem estado preservados na montra em todo este início de época, e serão certamente acrescentos de qualidade a um grupo que tem 26 elementos, sem contar com Tomás Esteves, o sexto lateral da hierarquia. E, mesmo com tanta gente para jogar ali, o treinador até tem usado um dos seus quatro centrais (Marcano) como defesa-esquerdo. Este parece ser um grupo apetrechado, ainda que um pouco desequilibrado, uma vez que fica a ideia de que o treinador não desaprovaria a entrada de mais um ponta-de-lança: há só Toni Martínez, Taremi e Evanilson para duas vagas. A solução passará provavelmente por adaptar um dos muitos extremos/médios ala – que o sistema habitual do FC Porto usa um aberto de um lado e outro mais interior, a fazer terceiro médio, do outro – disponíveis. É que para essas duas vagas Conceição tem Corona, Francisco Conceição, Díaz, Pepê, Fábio Vieira e Otávio. Em termos de plantel até faria mais sentido mudar para um 4x3x3 mais clássico, pois Fábio Vieira e Otávio podiam mesmo ser o tal terceiro médio e, aí, a equipa ficaria com quatro extremos puros para duas vagas. Mas em termos de onze isso significaria que seria necessário optar entre Martínez e Taremi. E creio que isso não acontecerá e que ambos manterão a vaga na equipa potencialmente titular.
Mais extenso ainda é o plantel à disposição de Jorge Jesus no Benfica. São 28 jogadores, aos quais ainda acrescem Gedson e Gabriel – ambos à espera do mercado turco ou russo, que ainda não fecharam – bem como os miúdos Tomás Araújo, Paulo Bernardo e Henrique Araújo, estes colocados no universo da equipa B. Jesus queria mais um defesa-central, mas não teve direito a ele, acabando por ter de se contentar com os cinco que tem à disposição (Otamendi, Veríssimo, Vertonghen, Morato e Ferro) e de adaptar em caso de necessidade – está lá André Almeida. É que em contrapartida, no Benfica há seis laterais, já contando Lázaro, que chegou ontem por empréstimo do Inter Milão. E, para os três lugares da frente no 3x4x3, mesmo já sem contar com Jota e Vinicius, que saíram por empréstimo, ainda estão lá nove homens: Pizzi, Everton, Radonjic e Rafa para as posições mais exteriores, nas quais até podem acabar por jogar também Gonçalo Ramos e Darwin, bem como Seferovic, Yaremchuk e Rodrigo Pinho para o lugar do meio. Neste início de época com tantos compromissos, as lesões têm ajudado a que todos se sintam úteis – só Radonjic ainda não jogou. Será assim no futuro?