Como acelerar contra um muro
Na estreia de Martínez, a seleção cumpriu os mínimos, fez quatro golos, mas nem o jogo serviu para avaliar o que quer que fosse, dado o posicionamento do opositor, nem a equipa passou com distinção.
Não é fácil, nem será certamente inteligente, acelerar a fundo contra um muro. A seleção que o Liechtenstein trouxe ontem a Alvalade para apadrinhar a estreia de Roberto Martínez aos comandos de Portugal foi pouco mais do que um muro, construído em três camadas, todas elas colocadas nos últimos 35 metros do campo. As grandes preocupações do adversário de ontem eram bem evidentes: proteger a área de Büchel com cinco homens; reduzir o espaço nas costas dessa última linha, tornando-o tão curto que o guarda-redes pudesse controlar a profundidade sem grande sobressalto; e por fim reduzir igualmente o espaço entre essa linha e a que se seguia, formada de início por três e depois, na segunda parte, por quatro jogadores, de maneira a evitar que algum português pudesse receber a bola dentro do bloco para servir os avançados com maior certeza. O espaço, no entanto, estava lá. A questão era encontrá-lo. E o espaço, ontem, era na largura que podia ser achado, porque o adversário tinha conseguido reduzir o comprimento do campo, dos 105 metros para aqueles 35, tornando irrelevantes os 70 que sobravam entre a linha de três defesas que Portugal manteve sempre a meio do meio-campo ofensivo e as redes do entediado Rui Patrício, mas já não lhe seria possível encurtar os 68 metros de largura do relvado. Esses estiveram sempre lá e aproveitá-los era a forma mais aconselhável de chegar ao objetivo, de pôr bola na área e criar situações de finalização. A aceleração que Portugal tinha de meter no jogo era na largura e não na profundidade e só podia ser promovida pelos três de trás, convertidos numa espécie de placa giratória do jogo. Ao contrário do habitual, ontem não se lhes pedia que ganhassem duelos defensivos – só tinham que discutir a bola longa que vinha do guarda-redes para o avançado adversário, para que a sobra, a chamada “segunda bola”, ficasse ao dispor de um companheiro, como ficou sempre –, mas que imprimissem maior velocidade de circulação em posse. Fez sentido manter ali três jogadores? Creio que sim. Não faltaram mais médios ou avançados a densificar o muro nem sobraram defesas, porque os jogadores não entram com um rótulo setorial colado na testa. Faltaram, isso sim, mais passes de um lado ao outro do campo, a saltar canais, sem medo de interceções, porque o adversário não tentava sequer fazê-las. Faltou vontade de meter a bola no lado oposto antes que a segunda linha defensiva do Liechtenstein tivesse tempo de bascular e de lá chegar também, dessa forma deixando os nossos atacantes mais vezes em 2x1, o ala e o avançado daquele lado onde a bola acabara de chegar contra o defesa-lateral ainda desamparado. Aliás, quando substituiu Danilo por Rúben Neves e podia até ter regressado à linha tradicional de quatro, com apenas dois defesas-centrais, Martínez mandou Palhinha baixar para os três de trás, mantendo o 3x4x3. A ideia segundo a qual se os três defesas escalados passaram grande parte do jogo a meio do meio-campo ofensivo mais valia ter lá médios deve ser substituída por outra: o que vale, cada vez mais, é ter defesas que saibam jogar a bola em situação ofensiva. Foi a melhoria nesse aspeto da primeira para a segunda parte que valeu a Gonçalo Inácio os elogios feitos pelo treinador no final. Porque foi muitas vezes ali, na esquerda, que começou a agilidade que a direita encontrou no segundo tempo, graças à qual Portugal acabou de resolver o jogo em cinco minutos.
Ronaldo, Cancelo, Félix, Bruno. As particularidades deste jogo não permitiram, por isso, tirar dele ilações importantes acerca do que quer que seja. Ficaram sensações. Ronaldo assinalou a noite em que se tornou o recordista mundial de internacionalizações com mais dois golos, um de penalti e um de livre. Podia ter feito mais dois, pois teve um anulado por fora-de-jogo que era evitável e falhou uma finalização na cara do guarda-redes, mas as sensações que lhe sobraram da partida foram boas. O facto de o jogo ter decorrido num retângulo reduzidíssimo pode ter ajudado a que não se tenha dispersado tanto pelo campo como era habitual, mas a conclusão acerca da sua adaptabilidade às novas ideias, tanto em termos de comportamento no ataque como de pressão em momento defensivo, vai ter de ficar para outro dia. Cancelo foi o homem da noite: marcou o primeiro golo, assistiu para o segundo e sofreu o penalti que deu o terceiro. João Félix foi, na primeira parte, o único a conseguir ter bola dentro do bloco do Liechtenstein e isso, durante algum tempo, marcou a diferença na partida. E, além de uma maior velocidade de circulação atrás, a chave para o melhor arranque da equipa na segunda parte teve que ver com o atrevimento de Bruno Fernandes, que foi colocar-se na linha dos outros cinco atacantes, desempenhando papel relevante nos lances do 2-0 e do 3-0. O resto vai ter de esperar por dias de maior dificuldade para ser avaliado.
O carrossel que aí vem. O Bayern Munique despediu Julian Nagelsmann, o jovem treinador a quem, há ano e meio, tinha dado cinco anos de contrato, batendo a cláusula de rescisão para o tirar ao RB Leipzig. Desde essa altura, o colosso bávaro ganhou a Bundesliga de 2022 e duas Supertaças, estando neste momento em jogo na Liga dos Campeões e na Taça da Alemanha e a um ponto do Borussia Dortmund – que receberá no regresso da competição – no atual campeonato. Nagelsmann é um tipo estranho, daqueles treinadores excessivos, que parecem complicar sempre um pouco as coisas que até são simples, o que me levou, na altura da sua contratação, a manifestar o meu ceticismo em relação ao sucesso dele ali, mas francamente não consigo ver no trabalho que ele fez razões para este desfecho repentino. O que o explica, então? Guerra de bastidores na direção, com o renascimento da influência de Rummenigge e Höness face ao grito de afirmação da nova geração, personificado em Kahn e Salihamidzic? Há quem diga que sim, que o Bayern percebeu que é um senhor de proveta idade e não um miúdo que prima pela inovação. Mas a razão fundamental parece-me ser outra. É que Thomas Tuchel está livre – e não vai estar por muito tempo. A forma algo precipitada como o Bayern despediu Nagelsmann, na pausa das seleções antes do clássico que vai começar a lançar luz sobre a Bundesliga, e como, ao que tudo indica, vai nomear Tuchel para o substituir, não será mais do que uma manobra de antecipação ao carrossel que aí vem no Verão. E uma coisa é certa: se assinar pelo Bayern, Tuchel já não volta ao Chelsea nem ao Paris Saint-Germain e não entra no Tottenham.
Não estou muito de acordo.
Uma equipa que jogou sempre ao ataque, por incapacidade do adversário, apenas conseguiu dois golos de ressaltos e dois de bola parada.
Achei muito fraco o jogo.
Fiquei com a mesma sensação, que a contratação de Tuchel é uma jogada de antecipação a eventuais interesses de terceiros e que tal interesse se deve porque o atual treinador é excêntrico mas a qualidade não acompanha (a meu ver)