Benfica perdeu a bola e ganhou o jogo
A opção de dar a bola aos neerlandeses não é a que mais convém aos jogadores escalados pelo Benfica para começar o jogo com o PSV. Deu para ganhar, mas deixou dúvidas para a segunda mão.
O Benfica conseguiu uma importante vitória (2-1) sobre o PSV Eindhoven e assegurou que entra em vantagem na segunda mão da disputa pela presença na Liga dos Campeões, mas o jogo com os neerlandeses deixou à vista algumas lacunas da equipa de Jorge Jesus quando lhe tiram aquilo de que mais precisa para se sentir bem: a bola. No final da partida, o treinador encarnado fez de regulador, argumentando que a sua equipa “defendeu bem”, que foi “muito forte taticamente” e que o guarda-redes Vlachodimos “nem fez uma grande exibição”, mas o que se viu em campo foi o grego a evitar males maiores, causados em boa parte pela opção estratégica de dar a bola a um adversário que sabe bem o que fazer com ela. Sim, porque nisso Jesus foi certeiro: este PSV não é brincadeira.
No limite, o que é defender bem? Se o guarda-redes impede o golo, então a equipa defendeu bem? Nesse aspeto, o Benfica defendeu bem. Mas ainda que o jogo tenha sido condicionado pela vantagem madrugadora da equipa portuguesa, a opção por baixar linhas e entregar a bola aos neerlandeses seria sempre arriscada, e não só pela simples razão de que eles sabem bem o que fazer-lhe. Acabou por ser uma aposta vencedora, é verdade – o Benfica ganhou o jogo e, a este nível de equilíbrio, um golo de vantagem, seja em casa ou fora, pode ser ouro… –, mas não é a que mais convém a este grupo de jogadores, que funciona muito melhor com a bola do que sem ela. Se com bola lhe sobra critério, ontem até mais visível nas saídas desde trás de Morato e Lucas Veríssimo ou nas verticalizações de Weigl do que na condução de João Mário, quando passa mais tempo a correr atrás da bola do que com ela nos pés nota-se-lhe a falta de músculo e de rigor posicional.
O que se viu ontem na Luz não foi a superioridade do PSV a forçar o primeiro jogo da época em que o Benfica não beneficiou de mais bola do que o adversário – até aqui, tinha tido 58 e 67 por cento no duplo confronto com o Spartak, 60 por cento com o Moreirense e 63 por cento com o FC Arouca, mas ontem ficou-se pelos 41 por cento. O que se viu e até foi depois assumido por Jesus foi, condicionado por uma vantagem madrugadora, o Benfica dar a bola ao adversário e escolher esperar por ele. Não é possível garantir que com outra escolha as coisas teriam sido diferentes, mas deu para entender que esta opção estratégica convém mal a este grupo de jogadores. É evidente que correu bem e que até pode correr bem outra vez em Eindhoven, se Jesus voltar a escolher baixar o bloco, dar a bola ao adversário, aguentar o embate e tentar explorar o talento combinativo dos seus jogadores no último terço – algo que a equipa portuguesa também tem a sobrar. Nestas coisas, o efeito de jogar em casa está cada vez mais mitigado, mesmo com o regresso do público. Mas, pelo que se viu, sobretudo na segunda parte do jogo de ontem, a parte de aguentar o embate parece difícil de suportar por mais 90 minutos.
O recolhimento do Benfica não impediu o PSV Eindhoven de entrar várias vezes em igualdade numérica no meio-campo ofensivo, muito graças ao espaço concedido a van Ginkel e Sangaré, os dois médios-centro, para encararem o jogo de frente e ligarem com os dois extremos ou com Götze. Além disso, a falta de pressão benfiquista no início da organização neerlandesa facilitava as mudanças de lado da bola e dificultava a tarefa aos laterais encarnados, sempre fustigados pelas diagonais dos extremos Gakpo e Madueke. Só depois das substituições que fez a 20 minutos do fim – pouco antes tinham saído o central Boscagli e o médio van Ginkel, extremamente importantes no início da organização atacante do PSV – é que o Benfica teve capacidade para estancar a hemorragia que parecia tornar o golo do empate inevitável e pôde garantir que viaja para os Países Baixos com boas perspetivas de seguir em frente para a fase de grupos da Champions.
André Almeida fechou melhor a direita do que Diogo Gonçalves, Everton ajudou Grimaldo a fechar a esquerda como nem Pizzi nem Rafa alguma vez tinham feito, Gonçalo Ramos teve mais pulmão do que Yaremchuk para apertar na frente e Meité deu ao meio-campo o fulgor defensivo e o músculo que Weigl não podia aportar. Quer isto dizer que é neles que convém apostar para a segunda mão? Não necessariamente. Tudo depende de uma opção que Jesus ainda terá de fazer. Se quer ter a bola ou correr atrás dela.