As expectativas para o Mundial
Quase nada do que vai ser o Mundial depende do sorteio de hoje. 81 por cento dos oito primeiros do ranking passaram a fase de grupos nas últimas duas edições. O mais difícil chega depois.
Os portugueses vão ficar hoje a saber que equipas é que a seleção terá como adversárias na fase de grupos do Mundial de 2022, um Mundial que tem tudo para vir a ser uma grande fase final, do lote de apurados à altura da época em que se disputa. No meio de tantas projeções, há que lembrar uma coisa a toda a gente interessada: aquilo que acontecer hoje, no sorteio, não vai pesar rigorosamente nada nas expectativas relativamente à definição do campeão. A fase de grupos é para passar e ponto final. Depois, bom, depois é que as coisas começam a apertar – e aí convém travar as expectativas e entender que Portugal não está no primeiro nem no segundo lote de favoritos, mas sim numa terceira carruagem de outsiders que até podem fazer umas flores, dadas as caraterísticas muito especiais da competição, que se joga em eliminação direta a um jogo, a partir dos últimos 16 competidores. E isto não é controlo de danos futuros através da redução de expectativas. É a realidade.
Tenho grandes expectativas acerca deste Mundial. Sim, foram as cedências políticas e ao fator do negócio que levaram a FIFA a marcar a fase final para o Qatar, obrigando posteriormente ao adiamento para os meses de Novembro e Dezembro, em fuga ao calor que ali se faz sentir no tradicional mês de Junho. Mas esse facto pode contribuir para termos um Mundial mais solto, com jogadores menos sobrecarregados pela exigência atroz da temporada europeia – e a generalidade dos favoritos, mesmo os sul-americanos, tem os seus jogadores a atuar na Europa. Em vez de termos um Mundial jogado por homens com 60 partidas nas pernas desde as férias, ele vai surgir no calendário quando os atletas nem a meio da época chegaram e se apresentam mais disponíveis, física e mentalmente.
Claro que isto também vem com contraindicações, como o facto de não permitir tanto tempo de preparação antes da prova, reduzindo portanto a capacidade que os selecionadores terão de operacionalizar um modelo de jogo próprio das verdadeiras mantas de retalhos que são hoje as seleções de topo – isso das equipas feitas à base do bloco de um só clube acabou com a globalização. Os selecionadores só terão os futebolistas a 14 de Novembro, para preparar um Mundial que começa a 21, o que vem conferir às datas-FIFA destinadas à realização das seis partidas da Liga das Nações (quatro em Junho e duas em Setembro) uma importância extraordinária. Quem quiser fazer figura no Mundial tem de aproveitar aqueles quinze dias de Junho e os outros quinze de Setembro para trabalhar o Mundial – mais até do que para competir.
Porque, com jogadores mais disponíveis, este Mundial vai ser de topo. Basta olhar também para a lista de nações apuradas. Dos 32 primeiros do ranking-FIFA só foram eliminados a Itália (sexta), a Colômbia (17ª), a Suécia (19ª), o Chile (28º), a Nigéria (30ª) e o Egito (32º), estando Gales (18º), o Peru (22º), a Ucrânia (27ª) e a Costa Rica (31ª) ainda embrulhados nos play-off dos quais sairão provavelmente mais três destas equipas. Há ausências importantes? Sim, há sempre. Há quatro anos, faltaram na fase final o Chile (9º à data do Mundial), os Países Baixos (19º), a Itália (20ª), Gales (21º), os EUA (24º), a Áustria (26ª), a Irlanda do Norte (27ª), a Eslováquia (29ª), a Ucrânia (30ª), a República da Irlanda (31ª) e a Roménia (32ª). Passamos de onze ausentes – entre os 32 de topo – para um máximo de dez e muito provavelmente para apenas sete. Ora tudo o que sorteio de mais logo vai definir é o caminho para vermos quantos dos 16 primeiros do ranking chegam aos oitavos-de-final e, já agora, quantos dos oito primeiros ficam pelo caminho. Há quatro anos, nas 16 seleções que entraram no mata-mata, estavam 11 das 16 primeiras do ranking, surgindo cinco outsiders: o Uruguai (17º), a Croácia (18ª), a Suécia (23ª), o Japão (60º) e a Rússia (66ª, mas a jogar em casa, o que lhe deu para ser cabeça-de-série e ter um grupo mais acessível).
O sorteio da fase de grupos é, então, importante? Pode ser, mas sobretudo para quem quer exceder as expectativas. Basta ver que dos oito primeiros do ranking de 2018 só uma equipa não saiu viva do seu grupo – a Alemanha, que até era primeira e campeã do Mundo, e caiu num grupo que apurou a Suécia (23ª) e o México (15º). Há oito anos, no Brasil, entre os oito primeiros do ranking, só duas equipas não passaram a fase de grupos – a Espanha, que era primeira e campeã do Mundo, caiu aos pés de Chile (14º) e Países Baixos (15º), e Portugal, quarto, foi eliminado por Alemanha (2ª) e EUA (13º). Há aqui uma constante perigosa para o campeão do Mundo, sempre eliminado na primeira fase há três Mundiais seguidos – também a Itália caiu na fase de grupos de 2010, depois de ter sido campeã em 2006 –, mas tirando isso não se vê assim grande perigo no sorteio da fase de grupos. Talvez seja conveniente fugir a um dos cinco grupos com duas seleções europeias, porque todos os casos de eliminação de um dos oito de topo aconteceram em grupos com dois europeus. E convirá igualmente fugir aos grupos com as nações que hão-de sair dos play-off, porque elas valem em termos de ranking mais do que aquilo que vale em média o Pote 4, onde foram colocadas por ainda não ser conhecido o seu nome.
Apesar de tudo, já vimos que nos últimos dois Mundiais, 81 por cento das seleções que lá entram nas oito primeiras posições do ranking – e Portugal, para já, é o oitavo – seguem em frente. Diferente é quando se fala em ser campeão do Mundo. Em 2018, o título sorriu à França, que era sétima do ranking no início da competição. Em 2014 calhou à Alemanha, que era segunda. Em 2010 tocou à Espanha, que também era segunda. Mais surpreendente foi a vitória da Itália em 2006, pois os transalpinos eram 13º antes do Mundial. Em 2002 venceu o Brasil, que era segundo. E em 1998 impôs-se a França, que era 18ª, mas tinha a seu favor o fator casa e contra ela o facto de não competir há dois anos – estava apurada –, o que lhe prejudicou o ranking. Em 1994, o primeiro Mundial desde a instituição do ranking, impôs-se o Brasil, que também comandava a tabela da FIFA e foi mesmo o único dos seus líderes a vencer o Mundial. O que isto quer dizer é que se para antever os apurados para os oitavos-de-final o ranking até pode ser uma boa ferramenta, já para definir o campeão do Mundo ele fracassa: só um de sete Mundiais foi ganho pelo líder do ranking (14 por cento de acerto).
O Brasil, atual líder do ranking, é favorito? É, certamente. Colocaria os brasileiros, que apenas cederam três empates em 17 jogos na difícil qualificação sul-americana, lá em cima, a par da França, cujo plantel apresenta soluções em profundidade para todas as posições – ainda que depois tudo dependa do contexto “social”, que foi o que falhou no último Europeu, e da paz que Didier Deschamps for capaz de impor no seio do grupo e dos seus acompanhantes próximos. Numa segunda linha, parecem-me surgir a Espanha, a quem falta contundência para poder ascender ao primeiro patamar, a Argentina e a Alemanha. Portugal surge num terceiro grupo, com a envelhecida Bélgica ou a sempre escassa Inglaterra. Pode dar para lá chegar? Pode. Porque temos talento. Mas quem se centra nisso esquece-se de uma coisa importante. É que os outros também o possuem.
Ora aqui estão os meus favoritos: França, Brasil, Espanha, Alemanha. Estes são para mim os 4 grandes favoritos, depois ponho mais 4 atrás que são Argentina, Bélgica, Portugal e Inglaterra. Não vejo nenhuma outra seleção fora deste lote de 8 que possa ganhar o Mundial.
Tadeia, estamos a preparar o caminho para uma excelente campanha ou tamanha decepção? Lembro aos mais distraídos que Portugal teve uma oportunidade de ouro para chegar, pelo menos, à Final do Mundial 2018. Porquê? Passada a fase de grupos - mesmo não conhecendo ainda os grupos é o que se exige no mínimo à selecção de FS (afinal, o homem também sonha como José Torres) -, em 2018, tínhamos um caminho até à final facilitado porque não iríamos apanhar nenhum tubarão. O que aconteceu? Logo nos oitavos fomos afastados por esse colosso mundial que dá pelo nome de Uruguai. Fala-se, e bem, do Euro 2016, esconde-se, e mal, esta parte do curriculum de FS. É assunto tabu, até dos comentadores. Agora, lá vamos criando a história de que isto é difícil. Sim, é difícil e torna-se ainda mais quando já todos sabemos, praticamente, quem são os 25 escolhidos de FS. Pode ser que tenhamos a sorte de França.