A prova de força do FC Porto
Fala-se muito da ultrapassagem ao Benfica em total de vitórias na Taça/Liga dos Campeões, mas a verdadeira prova de força dada pelos dragões não foi essa.
Em Portugal faria muito mais furor se viesse aqui proclamar que o FC Porto ultrapassou ontem o Benfica em total de vitórias no conjunto de jogos que incluem a Taça e a Liga dos Campeões (114 contra 113), contando eliminatórias preliminares. É a rivalidade local a funcionar. Mas Sérgio Conceição não perdeu o foco para a que foi a verdadeira proeza atingida pelo FC Porto em Atenas – os dragões são a única equipa vinda de fora dos cinco principais campeonatos europeus a marcar presença nos oitavos-de-final da maior e mais prestigiada prova de clubes do futebol europeu. E fazem-no com excelente registo: quatro vitórias, um empate, só uma derrota e cinco balizas virgens, a confirmar o estatuto de classe média alta que a gestão do onze feita pelo treinador ontem já tinha avançado.
Em Fevereiro teremos a visita de um grande tubarão europeu ao Dragão e aí, já se sabe, as expectativas serão sempre diferentes. Mas até a forma como Conceição se apresentou ontem sem oito titulares e mesmo assim a equipa respondeu e foi capaz de manter o Olympiakos a zeros – a gestão foi feita como no Barreiro, contra o Fabril, com algumas primeiras opções a surgirem para os minutos finais, demonstrando que o importante não é tanto o adversário mas a forma como o plantel encara a competição – mostra três coisas: que as camisolas do FC Porto já têm um peso específico na competição, que há profundidade no plantel e que o treinador tinha razão quando dizia que boa parte da permeabilidade defensiva da equipa em território nacional tinha mais a ver com comportamentos do que com qualidade. Os menos utilizados vestiram o manto do rigor e, perante um adversário que podia precisar do resultado para seguir para a Liga Europa, deixaram a ideia de que esta fase de grupos já é, para o FC Porto, uma espécie de formalidade.
Dir-me-ão que isso é tudo certo mas que o FC Porto nem à fase de grupos chegou no ano passado – e é verdade, fruto de um mau jogo, em casa, contra o FK Krasnodar. Nessa noite de Agosto de 2019, aos 12’ já tinham entrado dois golos na baliza de Marchesín e à meia-hora chegou o terceiro. Foi uma espécie de “preview” dolorosa da “chapa 3” que tantas vezes tem afetado o tal FC Porto de consumo interno em 2020/21 a impedir logo ali a tentativa de chegar ao que podiam ser cinco presenças em outras tantas épocas. Nos últimos cinco anos, esta é a quarta vez que o FC Porto chega aos oitavos-de-final da Liga dos Campeões – e numa delas, em 2018/19, até atingiu os quartos, eliminando a AS Roma no primeiro “mata-mata”. Só seis equipas fizeram o pleno de presenças nestes cinco anos: Real Madrid, FC Barcelona, Bayern, Manchester City, Juventus e Paris Saint Germain. E, além disso, a frequência portista nesta fase – quatro vezes em cinco anos, são tantas como as de Liverpool FC, Atlético Madrid ou Borussia Dortmund – ganha ainda mais relevância se verificarmos quantas equipas nela surgiram pelo menos uma vez sem virem dos cinco maiores campeonatos da Europa. Foram, além do FC Porto, mais cinco: Benfica em 2016/17, Shakthar Donetsk, Besiktas e FC Basileia em 2017/18 e Ajax em 2018/19. E é tudo.
Ontem, os outros resultados da noite concorreram para a normalidade. A emoção mostrada pelos jogadores do Borussia M’Gladbach, no relvado de Madrid, depois de perderem com o Real, à espera que acabasse o Inter-Shakthar (onde um golo, de quem quer que fosse, seria para eles o equivalente à eliminação), veio apenas dar um tom mais excitante ao corriqueiro que começa a ser a fase de grupos da Liga dos Campeões. É um passeio para uma mão cheia de equipas – reparem como um Real Madrid e um FC Barcelona em crise passearam nestes seis primeiros jogos –, mais um dia no escritório para outra meia-dúzia – grupo onde já está o FC Porto – e um Evereste absolutamente inconquistável para a generalidade das outras. Ver que equipas poderosas nos seus países, como o Olympiakos, ou das melhores de nações que têm força nas competições, como o Olympique Marselha, não conseguiram sequer fazer um golo em 360 minutos de futebol ao FC Porto é a prova de que os dragões subiram de patamar, como representantes de Portugal nesta montra do futebol que é a Champions. Ver que isso foi conseguido com Diogo Costa, Diogo Leite, João Mário ou Romário Baró no onze que jogou em Atenas é mais ainda: é a constatação de que, mesmo tendo perdido cedo demais o talento de Vitinha ou Fábio Silva, a geração que conquistou a UEFA Youth League de 2019 ainda vem a tempo de marcar uma era no FC Porto.