Futebol sadomasoquista
A propensão dos clubes portugueses para o chicote indica uma inclinação cada vez menos natural para o fetichismo sadomasoquista. Tornámo-nos este ano uma exceção no futebol europeu de elite.
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Estamos a chegar ao fim de Setembro e, mesmo já tendo havido uma pausa FIFA para os jogos de seleções, que alguns clubes costumam aproveitar para fazer mudanças mais estruturais, houve apenas uma chicotada psicológica nos 96 clubes das cinco grandes Ligas, que foi a saída de Daniele de Rossi da AS Roma – surpreendente e polémica, de resto. Pois em Portugal já vamos em cinco mudanças de treinador nos 18 clubes da Liga, duas delas ocorridas na semana que agora acaba, que foram as demissões de Filipe Martins do Estrela da Amadora e de José Mota do Farense. O recurso ao chicote parecia domado em anos mais recentes, como se viu, por exemplo, em 2022/23, época em que 11 dos 18 clubes chegaram ao fim da Liga com o mesmo treinador que a iniciara ou em que o total de mudanças de comando foi quase metade das duas dezenas registadas em 2019/20. Mas este ano não. A tentação de que se pode resolver tudo cortando a cabeça ao treinador parece outra vez em crescendo, transformando-se numa espécie de ritual sadomasoquista de um futebol que não aprende. E depois dizemos que as diferenças entre grandes e pequenos crescem, que a competitividade da Liga baixa. “Há clubes que estão sempre a receber jogadores, que fazem o plantel já na pré-época. Olhamos para o Santa Clara, que quase não teve mudanças, e está muito à frente”, opinou ontem Rúben Amorim, que se reconheceu felizardo, por lhe darem estabilidade no plantel, treino e jogadores que, assim, “já jogam de olhos frechados”. “Depois são os treinadores que são despedidos, mas temos de olhar para a forma de trabalhar dos clubes”, disse o técnico cujo Sporting lidera a Liga, com sete vitórias em sete jogos, e que, ocupando o cargo desde Março de 2020, é o mais antigo nos 18 clubes participantes.